quinta-feira, 28 de fevereiro de 2008

Os ricochetes

Depois do Sporting 1 (Purovic, sem saber bem como), Estrela da Amadora 0, para a Taça de Portugal, talvez eu devesse retirar algo que já aqui escrevi sobre o jogador (?) montenegrino. Não aquilo de ele representar a indigência futebolística, digamos assim, em toda a sua plenitude, mas outra coisa: aquilo de a equipa do Sporting com ele jogar apenas com dez jogadores. Talvez não seja assim, e a comprová-lo está o golo que marcou sem saber bem como ao Estrela da Amadora, com um defesa adversário a cabecear a bola contra a cabeça dele para ela ir depois entrar na baliza. Ou seja, depois de Purovic ter entrado para o lugar do lesionado Liedson (e convenhamos que foram imagens muito estranhas, aquelas de Liedson a sair e de Purovic a entrar), não foi jogar com dez jogadores apenas; foi jogar com dez jogadores e mais uma pessoa em quem a bola pode sempre, assim de repente, por um capricho do destino, fazer ricochete e dar golo. Que venham então os ricochetes, de cada vez que Paulo Bento perder a cabeça e o fizer entrar em campo!

Escritores no meu romance (38)

Elly Welt, Estados Unidos
… dia em que o assistente hospitalar de cirurgia o anunciou como o alemão que acabava de chegar do McGill, que o mágico velhinho se apercebeu de que tinha vivido num permanente estado de depressão desde que a guerra acabara.
(excerto de «O que Entra nos Livros», página 148)

quarta-feira, 27 de fevereiro de 2008

Mais de uma hora por dia

Num tempo em que os gestores (?) do Sporting revelam tanta incompetência para o trabalho que se espera de verdadeiros dirigentes de um clube desportivo (para uma sade a verdade é que não sei), nunca é de mais recordar uma decisão feliz tomada há muitos anos por pessoas que seguramente dedicavam mais de uma hora por dia ao clube.

terça-feira, 26 de fevereiro de 2008

Sobre Zapatero

Ontem teve lugar o debate entre os dois principais candidatos à liderança do governo de Espanha. Curiosamente, hoje de manhã estive a traduzir o artigo do meu amigo Manuel González Oubel da próxima edição da revista «Pessoal». Eis algumas das coisas que desta vez ele escreve sobre Zapatero:

(…)
A falta desse «algo» – desse guarda-chuva em forma de projecto nacional com o qual se podem identificar todos os espanhóis – pode apenas gerar a «gestão por ocorrências e minudências» a que nos tem habituado nos últimos anos o presidente do actual governo de Espanha, José Luis Zapatero. Entre as suas ocorrências está a ruptura do consenso básico que surgiu com a Constituição de 1978, a provocação contínua a 50% de cidadãos que pensam de forma diferente (ressuscitando continuamente o fantasma das duas Espanhas irreconciliáveis), o balão de oxigénio dado aos terroristas da ETA e a negociação com os mesmos de contrapartidas políticas, o facto de governar aliado com nacionalistas radicais e ainda o saque fiscal a trabalhadores e reformados (com impostos directos e indirectos que são completamente abusivos).
Também está entre as ocorrências e minudências do governo de Zapatero gerir e legislar em benefício dos amigos – a OPA da Endesa, o assalto ao BBVA, o Estatuto da Catalunha (a cujo referendo afluiu menos de 50% da população catalã), a mentira sistemática ao povo e no parlamento (negando que continuou a negociar com os terroristas depois do atentado no aeroporto de Barajas) ou a última, a do cheque de 400 euros para cada espanhol se ganhar as eleições (dinheiro, já se vê, arranjado previamente através da espoliação de reformados e trabalhadores). Além, é claro, de um longo etcétera de outras minudências.
(…)
As pessoas parecem «idiotizadas» sob o signo da imposição e da manipulação em que dão cartas todos esses «anões» da política ou um grupo significativo deles que existe no mundo dos negócios. A manipulação, a mentira e a falta de comunicação autêntica em duplo sentido e em todas as direcções é muito rentável para os políticos que nunca fizeram nada na vida, como é o caso de Zapatero e de muitos dos seus colaboradores, e também o de empresários e directores de empresas que, incapazes de competir no mercado livre, procuram obter resultados debaixo da asa de governantes de turno. Sem esquecer os muitos actores, jornalistas, artistas e professores, incensários do governo ao qual se agarram como lapas, acostumados que estão a viver à custa do dinheiro sacado nos impostos a trabalhadores e a reformados; a quem inclusive se dão ao luxo de insultar.

Nota: o meu amigo, é claro, não conhece José Sócrates, senão talvez até estivesse agradecido pelo que em Espanha lhe calhou em sorte.

Quando ele era pequenino - 2

O Monge, um pouco hesitante, enquanto os pais o chamam para nadar (princípios de 2005).
Início da série aqui.

segunda-feira, 25 de fevereiro de 2008

Sempre mais além

O jornalista Rui Santos foi agredido esta madrugada à saída da SIC, depois do seu habitual comentário dos domingos à noite. O futebol português continua a ir sempre mais além do que se espera a cada momento. Depois das agressões ao jornalista Marinho Neves (já há muitos anos), de Sá Pinto a Artur Jorge, de desconhecidos a Ricardo Bexiga, de pessoas filmadas pelas câmaras das televisões a um empresário do guarda-redes Moretto, depois até da agressão de Scolari a um jogador de uma selecção adversária de Portugal, entre tantas outras, desta vez foram três encapuzados que tentaram repetir a graça com Rui Santos; três encapuzados munidos, imagine-se, de barrotes.

Um incompreensível desejo de perder

O jogo do Sporting ontem em Setúbal (Setúbal 1, Sporting 0) teve uma coisa curiosa. Ou melhor, nem foi bem o jogo. Foi uma coisa que aconteceu comigo quando me preparava para ver o jogo... Às sete e um quarto, estava eu ainda a ver um noticiário noutro canal que não aquele em que ia dar o jogo, de repente dei pelas horas e mudei para a TVI; foi um choque, um verdadeiro choque, já estavam em directo de Setúbal e no ecrã a primeira coisa que vi foi um grande plano de um rosto assim nem muito conhecido, mas que eu acabei por identificar imediatamente: era o rosto de Purovic. Não sei por quê, mas senti que ele ia jogar, que não estavam a filmar um suplente que andasse a correr de um lado para ao outro. Não, pelos movimentos que fazia ele ia estar na equipa escolhida para o jogo. Depois do choque, tentei pensar no que poderia estar a acontecer, mas o máximo que consegui foi ficar extremamente confuso. Nos últimos jogos, depois da integração de Tiuí, Paulo Bento parecia ter posto Purovic de lado, quem sabe – pensava eu – por ter num qualquer momento de lucidez, digamos assim, plena percebido que Purovic representa a indigência futebolística na sua versão mais completa. Mas não, o homem afinal não tinha percebido nada disso e zás, toca a meter o infeliz jogador (?) no onze titular. E eu, para não estar com coisas, para não me pôr a perguntar mentalmente «mas o que é que é isto?», pouco depois levei com mais um choque, ao perceber que além de Purovic também Farnerud (ciclismo, badminton, canoagem…) estava escolhido para entrar de início. Se com a primeira imagem, a do rosto de Purovic, eu senti que poderíamos perder o jogo, então com a informação sobre a titularidade de Farnerud tive mesmo a certeza.
O que terá levado Paulo Bento a entrar assim de peito aberto, apenas com nove verdadeiros jogadores, contra o Vitória de Setúbal? Foi isso que me perguntei, lembrando-me do que em tempos escrevi sobre a questão do QI. Eu sempre tenho vindo a defender a continuidade de Paulo Bento, mas depois acontecem coisas como estas e dou comigo a pensar se deverá ser mesmo assim. Nota-se, desde há muito, que não é propriamente o mais inteligente dos treinadores do nosso futebol, mas por outro lado teve alturas em que mostrou uma grande capacidade de liderança e um tremendo espírito de conquista. Agora – enfim, já nem é de agora –, parece que tudo isso se perdeu. A ambição foi-se (embora isso me pareça que tem mais a ver com a birra de Filipe Soares Franco em colocar o clube – a sade? – apenas a lutar por segundos lugares) e as decisões completamente irracionais acontecem cada vez mais vezes. Eu pensei… Qual a razão para não colocar Tiuí ao lado de Liedson? Ou, se Tiuí estivesse cansado por causa do último jogo, na Suiça, colocar um qualquer dos avançados dos juniores? Ou pedir a outro jogador do plantel (dos que sabem jogar futebol, obviamente) que fizesse o sacrifício de alinhar a avançado? Ou então jogar com dez, uma opção que me parece que as leis do futebol não proíbem. Isto no caso de Purovic. Aliás, jogando com dez o golo anulado a Tonel teria contado, porque só foi anulado (mesmo assim mal) porque Purovic, alheio a tudo o resto, estava em fora-de-jogo (uma situação que creio também aconteceu em Manchester, sendo nessa altura Liedson o prejudicado). E quanto a Farnerud, a mesma coisa, embora o problema do sueco pareça ser mais a falta de aplicação.
Depois, no decorrer do jogo, quando se foi comprovando que a derrota era algo provável, de repente Paulo Bento parece que percebeu os problemas que tinha arranjado; lentamente, mas percebeu. Tirou Purovic para meter Tiuí (tarde de mais), tirou Pedro Silva (um desastre a defesa direito), fazendo recuar para aí o jovem Pereirinha, e tirou Farnerud (tardíssimo). Na parte final a equipa até deu mostras de começar a aproximar-se de algum acerto, mas acabou por cair completamente nos últimos minutos, aceitando uma derrota que tinha sido construída em grande parte pelas opções incompreensíveis do treinador. Como se durante a tomada de decisões em relação à equipa a apresentar a ideia principal tivesse sido perder.
Quanto ao golo, resultado de um enorme falhanço do guarda-redes em que o Sporting e Scolari apostam, não sei bem o que dizer. O guarda-redes é jovem e tem alguma qualidade, daí a aposta ser em certa medida compreensível. De qualquer maneira, não sei até que ponto a opção não deverá ser repensada, pelas falhas que Rui Patrício tem tido, intercaladas com bons desempenhos (exactamente o problema de Ricardo, que tanto salvava o Sporting como logo a seguir enterrava o Sporting). No final do jogo o guarda-redes apareceu a prestar declarações, dando a ideia de que o tinham mandado ir falar. Disse com um ar superior que assumia as responsabilidades, como se tivesse sido a coisa mais natural do mundo o que tinha acontecido. Fez-me lembrar alguns políticos e por isso não gostei. Teria preferido vê-lo a dizer que lamentava o erro, que já aconteceu com muitos guarda-redes, inclusive grandes guarda-redes. De qualquer maneira a situação é difícil, por tudo o que envolveria, por exemplo, colocar agora o jovem Rui Patrício a suplente. O pior é se falhas como esta se repetirem muitas vezes.

domingo, 24 de fevereiro de 2008

Quando ele era pequenino - 1

O Monge, a dormir à sombra das flores, em finais de 2004.
(primeiro post da série)

Polga, Paul Auster

Estive a escrever a minha crónica mensal para uma revista, uma crónica em que costumo misturar futebol e literatura (talvez devesse dizer literatura e futebol). Desta vez tive muitas dificuldades, mas lá acabei por conseguir. Com a vantagem inesperada de pelo meio me lembrar da próxima crónica, da qual já fiz até um rascunho. Há-de chamar-se «Polga, Paul Auster».

sábado, 23 de fevereiro de 2008

O Sporting

Isto interessa.

sexta-feira, 22 de fevereiro de 2008

Simplesmente

Um dia aconteceu, simplesmente, e nem foi por causa de nenhuma questão fracturante, como agora se diz muito por aí.

quinta-feira, 21 de fevereiro de 2008

Afinal, entre a Amadora e a Suiça não deve haver grande diferença

Pelo menos a diferença entre a Amadora e a cidade de Basileia. É a ideia com que fico depois da vitória nas calmas do Sporting esta noite (Basileia 0, Sporting 3 – Pereirinha e Liedson 2), que facilmente me faz lembrar o jogo do fim-de-semana passado com o Estrela a Amadora. Havia quem estivesse preocupado com a falta de jogadores por causa das lesões (Rui Oliveira e Costa, por exemplo, confessou isso na televisão), mas eu não me parecia que fosse caso para tanto; por vezes, o que me preocupa é a abundância de jogadores (?), por exemplo aqueles tipo Purovic, Farnerud e só não digo Polga para não ser insistente. Esta noite a equipa jogou com o onze, digamos assim, certinho (imagine-se o que teria sido colocar Purovic ao lado de Liedson…). Pereirinha sabe jogar futebol, Tiuí a mesma coisa ainda que não sendo um craque, e por aí adiante; Polga lá andou como sempre tem andado e até foi substituído, Ronny mesmo tapado por Grimi (bom jogador) pôde jogar um bocado, o guarda-redes vai resolvendo as confusões e Liedson parece que está novamente a acertar com a baliza. Mais duas notas: primeira, ainda sobre as semelhanças entre a Suiça e a Amadora, o humor de Paulo Bento ao fazer mais uma vez entrar Farnerud na parte final; segunda nota, se no Sporting Purovic continua felizmente no banco de suplentes, sem entrar nem que seja para jogar (?) um minuto, os suíços a meio da segunda parte fizeram entrar um Perovic (não reparei se sabe jogar ou se a diferença para Purovic é só o «e» em vez do «u», e não reparei porque nessa altura andava a espreitar de vez em quando o jogo do Benfica, que parecia divertido).

quarta-feira, 20 de fevereiro de 2008

Um pouco antes de voar...

... nem dez segundos antes, como se tivesse mesmo acabado de decidir o destino.



Os meus diálogos - 10

(do livro «O Amor por entre os Dedos», 2005; conto «Gagueline, o gagueloso)
(…)
- Esperem aí! Quanto é que mede esse tal francês gagueloso?
Não houve resposta. Até que uma criança disse:
- Oito metros!
Zifardo estrebuchou, quase largando o machado.
- Que exagero!... - apressou-se o presidente da junta de freguesia a dizer. - Oito metros nem nas histórias esquisitas daquele rapazito escritor ali de Santo Estêvão
- Qual escritor? - perguntou Zifardo.
Um velho, que estava mesmo atrás do presidente da junta de freguesia, gritou:
- É um escritor de histórias esquisitas mas que também escreve histórias de amor a falar de uma bela rapariga que se chama Kate! E já deu origem a não sei quantos bustos ali em Santo Estêvão, de tudo o que é personalidade e não só! A partir do dele a coisa não há meio de parar, de maneira que!..
- Bom, adiante que isto não é hora para literaturas nem para homenagens! - interrompeu o presidente da junta de freguesia. - Oito metros de tamanho para aquela criatura é um exagero! Estas crianças vêem mas é tudo a dobrar!...
- A dobrar!! - protestou Zifardo. - Se o gagueloso medir quatro metros, acha que é pouco?!
O presidente da junta de freguesia calou-se. E a mulher que tinha sorrido para Zifardo disse:
- Senhor Zifardo, independentemente do tamanho, rache-o ao meio.
(…)

Mudança

O blog «Corta-fitas» mudou de endereço, para aqui. Começa com um texto notável de Fernando Sobral sobre o «sr. Sócrates».

Já nas livrarias

Esse homem que ali tem sacode a cabeça diante duma taça de vinho, estrebucha e fala dos seus sonhos frustrados.
– Viciámo-nos. Agora temos a Censura a escrever por nós. E amanhã? Quem sabe escrever amanhã, quando a Censura acabar?
Cala-se. Depois espalma a mão diante dos olhos, mirando-a com raiva, quase com espanto:
– A minha mão medrosa – anuncia. Volta­-a e torna a voltá-la, como se a não reconhecesse, como se a denunciasse em público. – Está viciada, amigos, escreve com medo… Não há dinheiro no mundo que pague uma desgraça destas. Dinheiro nenhum. Nenhum, nenhum, nenhum, nenhum, nenhum…
– Acredito – diz o dono do bar. E virando­‑se para mim: – E tu? Não falas, não contas nada?

terça-feira, 19 de fevereiro de 2008

Saudades do Verão


A entrevista

Não faço a mínima ideia do que disse ontem o primeiro-ministro na televisão. Não vi a entrevista. E também não vou fazer grandes esforços para procurar informar-me.

Há dois anos

O montado, há cerca de dois anos, depois de um dia a nevar.

As calmas

Nesta fase isto já não interessa muito. Se calhar por isso é que vamos ganhando nas calmas. É a sensação com que se fica do Sporting 2 (João Moutinho, Liedson) – Estrela da Amadora 0. Ganhámos nas calmas, mesmo que o árbitro tivesse facilitado (dos dois amarelos que levaram à primeira expulsão no Amadora, só o segundo era justificado, e o penalty que o desastrado Polga falhou deu-me a ideia de que não existiu, e se não acabou em golo o que é certo é que levou à expulsão de um guarda-redes que já foi campeão pelo Sporting). No meio disto tudo, desta calmaria, mesmo com chuva a potes, não podiam faltar as asneiras: Paulo Bento já na parte final do jogo mandou entrar o ciclista (ou jogador de badminton, nem sei) Farnerud, e antes, no penalty, mandou o Polga ir marcar. A asneira no caso do penalty é a mais grave – um jogador disparatado como Polga tem sempre grandes hipóteses de não acertar a marcação de um pontapé-de-baliza (não acertar com o campo, já se vê), por isso no caso de um penalty nem vale a pena dizer o que ele tem mais probabilidades de fazer. Mas vamos interpretar a decisão de Paulo Bento como apenas um momento de humor... Por falar em momentos, não de humor mas de classe, obviamente que é de assinalar o do golo de João Moutinho, que se calhar foi o que fez com que a vitória acabasse por ser conseguida nas calmas; de assinalar também o reencontro de Liedson com os golos, mesmo oferecidos, o regresso de Pedro Silva e o facto de Purovic (o tal jogador – ? – que em termos futebolísticos toca a indigência) parecer estar definitivamente fora das contas para a equipa.

domingo, 17 de fevereiro de 2008

Uma esperança

Continua no «Corta-fitas» a série «Por qué no te callas?», de Pedro Correia, protagonizada por José Sócrates. Talvez um dia Sócrates se cale, nem que seja por ter ganho alguma vergonha. Eu não acredito muito, mas há sempre uma esperança.

sábado, 16 de fevereiro de 2008

sexta-feira, 15 de fevereiro de 2008

Uma certa falta de vergonha

Ver aqui, no «Zero de Conduta».

O montado já com flores (5 de 5)

Última imagem da série; início aqui.

Entrevista – Carvalho Rodrigues

Uma entrevista que fiz em 2005, ao pai do primeiro satélite português, o cientista Fernando Carvalho Rodrigues. Publico-a agora aqui.

Canoa, por onde vais

«Canoa, por onde vais, parece-me que não vais muito bem», talvez diga baixinho algum segurança numa doca da cidade «convertida ao plástico» ao ver aproximar-se o professor Carvalho Rodrigues a comandar a sua canoa de 1937. Mas isso é uma coisa que tem mais a ver com o final da entrevista. Talvez aqui nesta abertura estejamos a viajar no tempo, distraídos, e ainda por cima sem pensar nas portagens que as regras do jornalismo impõem.

Deixando as viagens no tempo, comecemos então – como dizia, enfim, como dizia o outro – pelo princípio. As viagens no tempo, de qualquer maneira, não vão demorar.

Já o ouvi falar sobre a moeda de hoje ser o tempo. Pode explicar essa sua ideia?
Sim, o tempo é a moeda. Paga-se horas de trabalho, horas, minutos e segundos de comunicações… O tempo até determinada altura era utilizado para a as pessoas darem destino a umas coisas ou a outras, mas nós inventámos que agora é para dar a felicidade a toda a gente. É a busca incessante da felicidade, que não leva a lado nenhum. Depois de inventarmos isto, passamos a vida a correr de felicidade em felicidade. Mas esta maneira de fazer passar pensamentos via telefone, via rádio – que são as duas grandes invenções deste último século, invenções da tecnologia… Como não há pensadores, há só pensamentos. Os pensamentos são expressos em linguagem, a gente paga e a moeda é o tempo. O que acontece é que somos todos muito pobres de tempo. A evolução da humanidade é um bocado como no início da agricultura, quando a maior parte das pessoas morriam de fome. Na agricultura é o espaço a moeda. Na caça também. Quanto mais espaço, mais caça. Era assim o território. Hoje é quanto mais tempo se tem. Nós ainda somos miseráveis e pedintes do tempo. Milionários do tempo existem muito poucos. Aqueles que são capazes de viver, de dar destino a coisas, sem se importarem com o correr do tempo.
Falou de antes se morrer de fome, que é algo ainda acontece no mundo. Mas agora também se pode morrer de tempo, com o stress
Bom, nós estamos a dar os primeiros passos nesta aprendizagem de nos alimentarmos de tempo. A tecnologia fez com que pudéssemos partilhar ideias uns com os outros. E quem tem relógio no pulso não tem tempo. O que mais dizemos uns aos outros é «não tenho tempo». Ora uma pessoa que não tem tempo é um pedinte do tempo. Quanto maior for a conta bancária menos tempo tem. É curioso.
Pois…
Estamos adaptados ainda a ser seres que dominam o espaço, mas não que dominam o tempo, uma coisa relativamente recente. Os relógios são relativamente recentes, esta coisa de ter que andar com uma algema do tempo no braço esquerdo. Tal como a capacidade de passar os pensamentos uns para os outros via rádio, tem para aí 170 anos. Na área do tempo somos uns pobretanas. Se a edição da «Forbes 500» fosse de milionários do tempo se calhar bastava uma página.
Também se ouve falar muito, especialmente no mundo das empresas, de gestão do tempo. Há inclusive cursos sobre o tema. Acha que se justifica chegar a tanto, ou a gestão do tempo poderá, afinal, ser algo bem mais simples?
Isso acontece porque o tempo é um bem muito escasso. Quando eu digo que nos alimentamos do tempo, significa sermos capazes de antecipar. Como na caça, ou na agricultura, precisamos de antecipar o espaço. Qual vai ser a cultura do Outono para o Verão. Atirar a seta ou o dardo para a frente da presa, para onde ela vai passar. Quando se atira é preciso prever no espaço onde está a presa. A gestão do tempo também é antever no tempo o que é que se vai estar a fazer num determinado momento.
Há aqueles teóricos do pontapé na bola que falam de fazer o passe para o espaço vazio, para onde algum jogador vai correr…
Pois, é preciso prever o que vai acontecer. A gestão do tempo é isto, não é muito diferente do que fazíamos no espaço. É antecipar para prever e para algumas vezes tomar contra-medidas, para impedir que algum mal aconteça. É o que nós fazemos. Estamos a aprender a gestão do tempo. Aliás, já começamos a ter uma coisa que não havia há uns tempos, a agenda. Se perguntar a uma pessoa de uma pequena aldeia, «quando é que nos encontramos?», ela pode responder «amanhã», se perguntar «quando?», ela pode responder «à tarde». Por quê? Numa sociedade que ainda se alimenta do espaço, esta antecipação que pode significar à uma hora ou às oito da noite, à tarde é quanto basta. Para nós, que somos pobres do tempo, isso é impossível. Temos que antecipar o tempo para ganhar, para ter tempo no banco. Uma pessoa que tenha duas horas durante as quais possa estar sem fazer nada, é tempo. O problema é que as pessoas não têm tempo, de modo que só há um processo de fazer as coisas, é antecipar, como se antecipava quando só nos alimentávamos de espaço.

(…)

Versão completa aqui.
Foto de João Andrés

Muito tarde

Tarde, muito tarde, quase vencido pelo sono, continuo a escrever. O livro avança. E eu, por uma estrada da serra, de noite... «Eu a pensar nas diferenças de tamanho sendo o mundo o mesmo, até que de repente a aldeia surge diante de mim, no fundo de um vale por onde corre uma ribeira nos meses em que a água é suficiente. A ribeira onde eu brincava quando ainda havia enguias, bordalos e algumas lontras. As chamas ajudam-me a distinguir as casas.»

quinta-feira, 14 de fevereiro de 2008

O português da net

Uma frase de Manuel António Pina, tão surpreendente quanto certeira, divulgada por Pedro Correia no «Corta-fitas».

Algumas loucuras

Do Sporting 2 (Vukcevic), Basileia 0 pode-se dizer que foi um jogo de algumas loucuras. Principais, as de Vukcevic, nas jogadas que fez e também naqueles saltos esquisitos que de vez em quando não consegue evitar (e pronto, lesionou-se e parece que tem para umas três semanas). Mas tirando estes imprevistos (que Vukcevic se tivesse mais calma até poderia prever), trata-se de uma loucura saudável, que importa até explorar. Paulo Bento demora sempre muito tempo a entender as coisas (relembre-se o que aconteceu com a insistência no inexplicável Custódio antes de apostar em Miguel Veloso, ou veja-se as dúvidas que parece ter em relação a Adrien), mas depois acaba por entender. Com falta de avançados, desistiu mesmo do indigente Purovic e apostou em Vukcevic, que sabe chutar, passar, fintar, correr e tudo o mais que se possa imaginar para um jogo, com a vantagem de ter a tal saudável loucura que faz com que quando menos se espera invente um golo. Quanto a outras loucuras, a «loucura», obviamente entre aspas, de parecer que a equipa começa a tomar algum jeito depois das confusões dos últimos tempos (com Grimi a mostrar muito valor e Tiuí a não envergonhar nem dez por cento do que Purovic já nos envergonhou), e ainda uma loucura que começa a fazer parte da história do Sporting dos últimos anos, uma loucura pouco saudável neste caso, desastrada, completamente desastrada, por vezes inacreditável: a de Polga, que parece mesmo talhado para o desastre (veja-se o golo que falhou de forma incrível no início da segunda parte e as tropelias que arranjou na defesa).

quarta-feira, 13 de fevereiro de 2008

terça-feira, 12 de fevereiro de 2008

Perto da minha terra

Bom, perto da minha terra (Monchique) acontece isto.

A rapariga da caixa

«Tens de estudar ou acabarás como esta mulher», diz uma mãe à filha enquanto aponta o dedo a Anna Sam, uma jovem francesa de 28 anos, formada em Linguística e caixa de um supermercado na periferia de Rennes. A história é contada por Anna no blog em que relata a sua experiência profissional de caixa de supermercado. Mandou-me o link para o blog o meu amigo Carlos Antunes; o blog chama-se «Les tribulations d’une cassière» e os seus textos saem este Verão em livro, em França.

A fruta e o major

Ver aqui, no «Leão da Estrela», a fruta e o major Valentim Loureiro. Com o processo «Apito Dourado» a entrar na fase de julgamento, o assunto não podia ter maior actualidade.

Resistência

«Resistência» é o título de um extraordinário romance de uma jovem escritora galega chamada Rosa Aneiros. Escrevi sobre ele, e entrevistei a autora; os textos podem ser lidos aqui. Peço agora emprestado para esta foto o título do romance. Passo todos os dias pela árvore, e ela teima em resistir.

segunda-feira, 11 de fevereiro de 2008

Pergunta discreta

O avançado angolano Manucho integra a equipa ideal da Taça das Nações Africanas (Drogba, por exemplo, foi escolhido para suplente). É o mesmo Manucho que o Manchester United acaba de emprestar ao clube grego que é treinado por José Peseiro. Mas o Sporting não tinha um protocolo qualquer assinado com o Manchester United, algo que poderia ter sido utilizado para conseguir o empréstimo do jogador? – pelo menos os gestores (?) do Sporting, em tempos, gabaram-se do protocolo que tinham conseguido e das vantagens que dele o clube poderia retirar.

Arder mal

Via «A Origem das Espécies», um blog muito interessante.

O Professor Carvalho Rodrigues e a sua canoa

O pai do primeiro satélite português anda de canoa. Vou colocar on line a entrevista daqui a uns dias.
Foto de João Andrés

Jihad cultural

A «jihad cultural», por Fernando Sobral, no «Corta-fitas», aqui... «O que o Governo está a fuzilar é o pensamento crítico, a possibilidade de questionar. No fundo a alma crítica de uma nação. Algo que não interessa à sociedade deslavada, tecnológica e de "design" puro que o sr. Sócrates está a tentar impor.»

O montado já com flores (3 de 5)


domingo, 10 de fevereiro de 2008

Uma surpresa

Nasceu quase agarrada ao tronco de uma oliveira, mesmo aqui ao pé de casa. Fui deixando que crescesse, porque não me pareceu que fosse mais uma erva daninha. Surpreendeu-me por estes dias, apresentando-se assim.

Serviços mínimos

A vitória em casa sobre o Marítimo Sporting 2 (Tonel, Liedson) - Marítimo 1, para a Taça de Portugal, pode ser caracterizada por uma expressão que li aqui, «os serviços mínimos leoninos». Ou seja, a equipa até nem se apresentou mal, embora nunca tenha deslumbrado. Algumas notas: primeira, o estreante Grimi não parece ser mau jogador (dá a ideia de que é parecido com Ronny, sabe jogar, atacar, cruzar, rematar, não deu foi para ver se é forte a defender); segunda, o regresso de Liedson aos golos, e a jogar bem (como é habitual, mesmo quando não marca); terceira, Polga voltou desastrado, coisa que não espanta (acertou um ou outro corte, mas de resto desdobrou-se em passes à maluca, ficou a olhar para o jogador que recarregou para o golo do Marítimo e antes do golo de Liedson perdeu uma bola que poderia ter dado para o Marítimo se colocar em vantagem); Celsinho sabe jogar mas dá a ideia de que nunca fará grandes coisas (parece que joga contrariado); Adrien é um excelente jogador e Paulo Bento já poderia ter apostado mais vezes nele; finalmente, a boa entrada de Tiuí no onze inicial (não é nenhum Drogba, mas sabe jogar, daí a equipa ter dado a sensação de estar completa, coisa que não acontece, como se sabe, com a presença assustadora do inimaginável Purovic).

A ética pública

Notável a intervenção inicial de Daniel Oliveira na edição deste fim-de-semana do programa «O Eixo do Mal». Uma explicação muito clara sobre a «ética pública» de José Sócrates, que considerou estar abaixo do mínimo que se exige para um cargo como o de primeiro-ministro.

O montado já com flores (2 de 5)


sábado, 9 de fevereiro de 2008

O espelho

«Não conheço o bastonário Marinho [e] Pinto, mas a sua campanha contra a corrupção revela muita coragem e deve ser apoiada, porque tem razão.» Pois tem, mas uma das últimas pessoas de que eu me lembraria para aparecer a colar-se ao bastonário da Ordem dos Advogados neste assunto seria o autor da frase, Luís Campos e Cunha, que agora, de vez em quando, no «Público», reaparece depois da vergonha que protagonizou como ministro, nomeadamente com o caso da sua escandalosa reforma e da maneira como esperneou para manter a acumulação de privilégios; quando ele próprio apresentava à generalidade dos portugueses grandes restrições a esse nível. Campos e Cunha teve a lata de dizer numa entrevista na televisão que aquelas medidas também o iriam prejudicar a ele quando se reformasse. Ainda não se sabia nessa altura, nem ele disse, que afinal já tinha uma reforma, de milhares de contos, e por meia-dúzia de anos de trabalho, ainda por cima numa instituição pública (Banco de Portugal) que curiosamente nos últimos tempos tem vindo a mostrar uma debilidade confrangedora em relação ao cumprimento da sua missão. Só depois da entrevista em que falou em «quando se reformasse» é que se descobriu a reforma, que estava a acumular com o ordenado de ministro. Uma vergonha, sobre a qual António Marinho e Pinto deve ter uma «linda» opinião. Há pessoas que por mais que por elas passem os anos parece que não se sabem ver a um espelho.

«O general no nosso labirinto»

Artigo do general Garcia Leandro publicado no «Expresso» da semana passada disponível aqui, no blog de José Adelino Maltez. «O general no nosso labirinto», como escreve no mesmo jornal, hoje, Miguel Sousa Tavares.

O montado já com flores (1 de 5)


Pergunta discreta

Os gestores (?) do Sporting conseguiram de um clube russo o empréstimo do futebolista brasileiro Celsinho, que não tem feito grande carreira por cá. Conseguiram o empréstimo, imagine-se, por quatro ou cinco anos, nem sei bem. Será que chegaram ao cúmulo de negociar para o clube o direito de opção?

Começos prometedores - 11

«A época de 2003/ 2004 foi histórica para o futebol português. O FC Porto conquistou o seu segundo título de campeão europeu e José Mourinho afirmou-se como um dos melhores treinadores do mundo. Não foi tudo. Nessa mesma época nasceu o processo popularizado com o nome de Apito Dourado. O nascimento, como o de Jesus, aconteceu, porém, num meio humilde e não na Arena de Gelsenkirchen, onde os dragões se sagraram reis da Europa. O processo Apito Dourado foi concebido nos relvados da Segunda Divisão B nacional. Ou melhor, nos relvados, nos restaurantes e até em gabinetes de autarcas.»
Início do livro «Apito Dourado – Toda a História», de Eugénio Queirós (Ed. Jornal «Record», 2008)

sexta-feira, 8 de fevereiro de 2008

Com atraso

Já vem com atraso este link. Mas aqui está um texto bem interessante do José Carlos Barros sobre as traduções do Quixote, nomeadamente a abertura.

Projecto na hora

O «Simplex» chega à construção civil. Ver aqui.

Pelo fim da tarde

Hoje, pelo fim da tarde, de regresso a casa.

Os jogadores ganham importância

Filipe Soares Franco gastou hoje a falar com os jogadores do plantel do Sporting metade do tempo que diariamente dedica ao clube (ou antes, à sade). No dia cinco de Dezembro, tinha gasto apenas um terço (vinte minutos).

Textos sobre livros - 45

Foi em 2001 que escrevi sobre o romance «O Memorando de Aachen», que já tinha sido publicado por cá três anos antes. Lembrei-me dele agora por causa do Tratado de Lisboa e das promessas sobre o referendo. Quando o livro saiu José Sócrates ainda não «existia». Mas agora, pensando bem, dá-me para perguntar… O que poderá ele andar a fazer em 2015? A acção do livro decorre em 2045, mas trinta anos antes, terá acontecido uma gigantesca falcatrua «nas regiões grega, dinamarquesa, sueca e portuguesa dos EUE».

«O Memorando de Aachen», de Andrew Roberts (Edições ASA, 269 pp.)

Na Europa, em 2045
A história passa-se no futuro, mais concretamente no ano de 2045, mas ao contrário do que possam estar a pensar não tem a ver com ficção científica. Trata-se de um romance sobre aquilo em que pode vir a tornar-se a União Europeia, satirizando de forma brilhante todo o processo de integração até aos Estados Unidos da Europa. «O Memorando de Aachen» foi escrito em mil novecentos e noventa e cinco pelo historiador inglês Andrew Roberts (foi aliás o seu primeiro romance), chegando a Portugal três anos depois.
A Inglaterra é apenas uma região marginal dos poderosos Estados Unidos da Europa. Em Londres, a antiga Estação de Waterloo chama-se agora Estação de Maastricht. A estátua de Nelson foi banida da praça Delors Square. O alemão é a língua oficial.
A trama começa num domingo, dia dois de Maio. Horatio Lestoq, investigador da Universidade de Oxford e jornalista, descobre o cadáver de um velho almirante… «A primeira coisa que Horatio viu ao entrar na sala de estar foi o cadáver do almirante estendido no sofá. Ainda ousou alimentar a esperança de que a morte tivesse sido natural, mas algo de indefinível na atmosfera daquela sala sugeria crime.»
É desta maneira que entramos na narrativa de Andrew Roberts, com a descoberta do corpo do nonagenário almirante. Lestoq vê-se de repente envolvido não apenas num crime, mas num escândalo de tais proporções que irá abalar as estruturas do estado europeu, burocrático, corrupto e xenófobo. A sua vida passa a não valer absolutamente nada.
Por que é que terá sido assassinado o velho almirante? E o que é que fará com que corra perigo a vida de Horatio Lestoq? O que é que terá acontecido trinta anos antes, em 2015, aquando da realização do Referendo de Aachen, que quase apagou a identidade nacional britânica?
No dia dez do mesmo mês de Maio de 2045, uma semana depois da descoberta do cadáver do almirante, o jornal «The Times» publica uma notícia onde a certa altura se pode ler… «Sabe-se que estão a ser levadas a cabo investigações sobre a validade dos resultados de Aachen nas regiões grega, dinamarquesa, sueca e portuguesa dos EUE. Se se descobrir fraude também, acredita-se que a mesma expressão de ‘Poder Popular’ que trouxe para as ruas de Londres meio milhão de pessoas, no sábado e no domingo, possa fazer cair os governos da Comissão em Atenas, Copenhaga, Estocolmo e Lisboa, tal como aconteceu em Londres.»
Guilherme I da Nova Zelândia acabar de regressar a Londres. Estava fora desde que toda a sua família tinha sido obrigada a exilar-se. Passa a ser também Guilherme V da Grã-Bretanha. A sua mãe, a princesa Diana, tinha morrido quarenta e oito anos antes, num túnel de Paris, em consequência de um brutal acidente de automóvel.

De qualquer forma...

De qualquer forma, e ainda sobre o jogo, de relevar o facto de Scolari não ter agredido nenhum emigrante.

quinta-feira, 7 de fevereiro de 2008

Bartleby

Era para colocar aqui um comentário sobre o jogo de ontem com a Itália, mas prefiro não o fazer.

«Pessoal», edição de Fevereiro

Capa da revista «Pessoal» de Fevereiro, com os três autores do livro «Humanator». O meu editorial está disponível no blog «Mundo RH».

quarta-feira, 6 de fevereiro de 2008

Wally

Onde está a abelha?

Frases mal ditas - 11

Está aqui. A frase é de uma rapariga que já teve dois cães e gostaria de ter mais um.

Os meus diálogos - 9

(do romance «Os Sonhos e Outra Perigosas Embirrações», 2000)
(…)
- Pode ter sido um cão a comer o olho esquerdo do Zé da Silva, ou um corvo, ou até uma osga, ou um cabrão de um rato.
- Sim, por aí há bichos bem capazes de comerem um olho. Mas olhe, já agora, senhor presidente, o senhor tem alguma coisa contra os ratos?
- O quê?!
- Se tem alguma coisa contra os ratos, queria eu saber! Como para o cão, para o corvo e para a osga não disse nada, como só adjectivou o rato!...
- Bem, foi uma maneira de falar, uma forma genuína de apimentar a conversa cá à moda da serra.
- ...
- E já ganhei muitas eleições assim!

(…)

terça-feira, 5 de fevereiro de 2008

15 olhares sobre o montado (XV)

Nota: último da série, iniciada aqui.

Textos sobre livros - 44

«Balada da Praia dos Cães», de José Cardoso Pires (Publicações Dom Quixote, 256 pp. na minha edição de bolso)

Recordar José Cardoso Pires

Com escrevi aqui, vai sair este mês um romance inédito de José Cardoso Pires, na nova editora de Nelson de Matos. Pretexto para recordar o que escrevi em finais de 2000 sobre um romance do autor, que tinha falecido dois anos antes, o notável «Balada da Praia dos Cães»; o texto serviu de suporte a uma das emissões de um programa de rádio, sobre livros.

Vamos recuar até ao ano já distante de 1982. É a forma de chegar a um livro emblemático de um escritor desaparecido não há muito tempo. Refiro-me a «Balada da Praia dos Cães», de José Cardoso Pires, editado pelas Publicações Dom Quixote.
José Augusto Neves Cardoso Pires nasceu no dia dois de Outubro de 1925, na Beira Baixa, em São João do Peso, e veio a falecer no dia 26 de Outubro de 1998, em Lisboa. Faz agora dois anos, mas a mim ainda me parece que foi ontem.
Apesar das suas origens, Cardoso Pires não gostava nada do campo, e da Beira Baixa então nem se fala. À primeira vista, será difícil compreender essa aversão, mas se atentarmos na explicação do próprio escritor para o que denominava de «mal português», as coisas mudam de tom. O «mal português» vinha dos ares da Beira, da pequena burguesia (que se calhar já se mudou para as grandes cidades e passou a chamar-se classe média), e vinha sobretudo de Salazar. Como compreendo Cardoso Pires... Também eu não haveria de gostar de que Salazar fosse algarvio, e então se por azar (ou até por sal e azar ao mesmo tempo, como diria Pessoa), se por azar tivesse visto a luz do dia pela primeira vez na minha terra, em Monchique, bem, aí é que seria a vergonha completa para mim.
José Cardoso Pires era um Lisboeta convicto. Os pais fixaram-se em Lisboa quando ele era ainda criança, de forma que cresceu em Arroios, fugindo da escola a sete pés para ver de perto os mais conceituados figurões da Almirante Reis (por exemplo, carteiristas, chulos ou pequenos aldrabões). Habituou-se desde miúdo a frequentar com o mesmo desembaraço as capelas da cultura e os bares mal recomendados (não esquecendo aqui que também acerca das capelas da cultura nem sempre se pode escrever boa prosa). Tudo isto apurou em José Cardoso Pires algo que poderemos identificar como um certo sentido de que na vida tudo é relativo. Daí até à explosão do seu génio literário terá sido apenas um pequeno passo, mas tão seguro que o haveria de colocar na história como o grande escritor de Lisboa.
Mas esta não é a altura para falarmos dos livros de José Cardoso Pires sobre a sua cidade. Nem da marcante obra de 1997 («De Profundis, Valsa Lenta»), onde o escritor conta a sua primeira aventura na morte, depois do um acidente vascular-cerebral que em 1995 o deixou, segundo palavras suas, uma «pessoa de coisíssima nenhuma». A altura é de «Balada da Praia dos Cães» (apesar de tudo tendo como pano de fundo a capital), o romance galardoado com o «Grande Prémio do Romance e da Novela da Associação Portuguesa de Escritores» em 1982.
«Balada da Praia dos Cães» é um romance que foi traduzido em numerosos países, tendo mesmo sido seleccionado pelo conceituado «The Sunday Times» como um dos melhores livros estrangeiros publicados em Inglaterra no ano de 1986. Também em Portugal, além dos aplausos da crítica e do reconhecimento da Associação Portuguesa de Escritores, teve a adesão dos leitores, ultrapassando em muito a centena de milhar de exemplares vendidos. O realizador José Fonseca e Costa passou-o mesmo ao cinema, num filme que teve um carreira bem meritória, com Raul Solnado no papel de um chefe de brigada da Polícia Judiciária, Elias Santana de seu nome, à primeira vista um pobre diabo mas, se observado com mais atenção, uma figura carregada de peculiaridades.
O romance, que apresenta como subtítulo «Dissertação Sobre um Crime», baseia-se em factos reais, passados em 1960, em plena ditadura do criminoso de Santa Comba. O cadáver de um desconhecido é encontrado na Praia do Mastro, cinquenta quilómetros a norte de Lisboa. É o dia três de Março. Foram alguns cães que o encontraram. Um deles chamou a atenção de um pescador, que acaba por dar com o macabro achado. Cardoso Pires escreve… «Viu no fundo de uma cova uma conspiração de cães à volta de um cadáver de um homem; alguns saltaram para o lado assim que ele apareceu mas logo retomaram a presa; outros nem isso, estavam tão apostados na sua tarefa que se abocanharam entre eles por cima do corpo do morto./ Há aqui uma certa ironia, diz o inspector Otero da Polícia Judiciária. Segundo consta, a vítima gostava desvairadamente de cães.»
Elias Santana, o chefe de brigada, começa então a investigação e as surpresas não hão-de parar. O corpo crivado de bolas e com um par de botas calçadas ao contrário, como se diz ser de uso fazer aos traidores, tinha uma longa história atrás de si.

Jornal do Incrível

José Sá Fernandes disse esta noite na SIC Notícias que o luxuoso restaurante Eleven, no cimo do Parque Eduardo VII, em Lisboa, paga à câmara apenas 500 euros mensais pela concessão do espaço. O jornalista que o entrevistava, Mário Crespo, ficou incrédulo.

Mais uma confusão

Mais uma confusão para os gestores (?) do Sporting resolverem, não se sabe como. Iordanov, tão desconsiderado no clube por que tanto lutou – é inacreditável e revoltante como os responsáveis do Sporting têm tratado tão mal grandes figuras do futebol do clube – acaba de ganhar no Tribunal do Trabalho o caso do jogo de homenagem, um caso bem estranho, por sinal. Ver aqui.

segunda-feira, 4 de fevereiro de 2008

15 olhares sobre o montado (XIV)


Três casos

Três casos, não sei se diga de polícia se de ladrões. Analisados aqui, aqui e aqui.

Pergunta discreta

Será que o Benfica pensa resolver os problemas da sua equipa de futebol fazendo os jogadores alinharem de gravata?

Vai uma picanha?

O restaurante Chimarrão do Campo Pequeno, em Lisboa, por José Rodrigues dos Santos… «O estabelecimento escolhido foi uma casa brasileira no Campo Pequeno, uma daquelas churrascarias especializadas em enfardar clientes até os deixar com os sentidos embrutecidos.» («O Sétimo Selo», pág. 119)

Fazer trafulha

Ver aqui e aqui, duas boas análises sobre as últimas de José Sócrates.

Por causa das águias

Há uns dias, por aqui. Diospiros na árvore, e alguns pássaros. As folhas foram-se quase todas embora. As que ainda resistem confundem-se com os pássaros, ou se calhar ao contrário, por causa das águias; os pássaros tentam confundir-se com as folhas.

Uma equipa sem grande valor

Não falo da equipa que entra em campo para jogar, embora essa não esteja a apresentar grandes resultados. Falo, isso sim, da equipa de gestores (?) do Sporting. É mesmo uma equipa sem grande valor. No remanso da sade (acho que nem fica mal escrever assim), estão a dar cabo do clube. Os jogadores, os da equipa que entra em campo, parte deles dão poucas garantias de sucesso, e o treinador vê-se que não é o paradigma da inteligência. Mas, como tenho vindo a escrever, não é substituindo o treinador, Paulo Bento, que se poderá conseguir inverter a situação; e mexer no plantel, construído em cima do joelho e revelando sobretudo um enorme desmazelo, agora é tarde demais. São os gestores (?), a incompetente equipa de gestores (?) capitaneada por Filipe Soares Franco mesmo sem braçadeira, a razão de ser da tragédia que cada vez mais ameaça abater-se sobre o Sporting. O Belenenses 1, Sporting 0, que nos deixa a catorze pontos do primeiro lugar, a quatro do segundo e a um do terceiro, só vem confirmar esta ideia. A situação actual do Sporting no campeonato lembra-me a segunda metade da década de 90 do século passado. Por exemplo, os tempos infelizes de Carlos Manuel, como foram infelizes os tempos de outros treinadores – Cantatores, Waseiges, «Chicos» (como dizia o impreparado futebolístico José Roquette) Vitais e por aí adiante. Uma vez, com Carlos Manuel a treinador, escrevi uma crónica chamada «O Leandro é um bom miúdo». Começava assim… «Nos últimos três jogos do campeonato nacional de futebol, em nove pontos possíveis o Sporting conquistou um. A equipa caiu na classificação até ao quinto lugar, escapando do sexto porque o Salgueiros escorregou. Está a dezassete pontos do Porto, a sete do Benfica, a seis do Guimarães e a um do Rio Ave.» Poucos meses depois, no fim da época (1997/ 98), confirmou-se a desgraça. Numa crónica chamada «Carlos, o chacalzinho», a certa altura escrevi… «Carlos, o chacalzinho, acabou por viver no Sporting a mesma luta que viveu há um ano no Salgueiros, a luta por um lugar na cada vez menos prestigiada Taça UEFA. O ano passado não o conseguiu porque o seu melhor jogador, o pequeno Abílio, falhou um penalty em Faro. Este ano conseguiu-o, e logo à custa de um jogador de pescoço pequeno, Vidigal, que mesmo assim chegou de cabeça mais alto do que os gigantes da defesa do Belenenses.» Será que não estamos agora a caminhar para algo parecido?

domingo, 3 de fevereiro de 2008

15 olhares sobre o montado (XIII)


O rap do Paulo Bento

O rap do Paulo Bento, pelo rapper Valete. Letra aqui e música aqui. Não concordo com muitas coisas, percebo outras. Por incrível que pareça, o Polga e o Purovic não entram, nem os gestores (?), e o inclassificável Carlos Freitas dá a ideia de que é elogiado (dizem que é um «bode», só que «expiatório»). Eu, por mim, apesar de muitas críticas que aqui venho a fazer, acho que o Paulo Bento deve continuar; já os gestores (?), bem, esses tinham ido há muito tempo...

sábado, 2 de fevereiro de 2008

Gente para tudo

Daniel Bessa, hoje, na sua mini-coluna do «Expresso», agradece ao ex-ministro da Saúde (que trata por «meu caro António Correia de Campos») todo o trabalho que ele fez; agradece com um «muito obrigado» que parece extremamente sentido. Há gente para tudo.

Há séculos por aqui

Pode pensar-se num monstro, mas não, é apenas uma oliveira ali da rua. Conhece tudo por aqui há vários séculos.

Rui Marques

Rui Marques deixou o cargo de Alto-Comissário para a Imigração e o Diálogo Intercultural. Coloco a seguir três excertos do que disse numa entrevista que publiquei há uns meses na revista «Pessoal».

«Muitos jovens que tentam aceder a um emprego, pelo facto de morarem onde moram, pela cor da sua pele, são afastados de oportunidades, o que é uma tremenda injustiça. Temos todos que fazer um esforço e combater o preconceito, o estereótipo, formas invisíveis e não ditas de discriminação que são muito injustas. Não se trata de discriminação positiva, não se está a dar aos imigrantes ou a quem vem de bairros pobres mais do que se dá a outro cidadão.»

«A diversidade que hoje temos é uma enorme riqueza para o nosso país. A diversidade cultural é o que faz a força das sociedades actuais, porque é num clima de diversidade cultural que a inovação pode ser gerada. Também apresenta desafios; é preciso que se saiba fazer viver juntos, fazer conviver pessoas com diferentes religiões, diferentes culturas, diferentes histórias pessoais… Mas sou francamente optimista quanto ao sucesso de sociedades multiculturais. »

«Da mesma forma que para uma sociedade a diversidade é um factor competitivo à escala global, os países que sabem usar melhor a diversidade são mais competitivos em termos internacionais. No quadro das empresas isso é fundamental, porque só em ambiente de grande diversidade é que a criatividade e a inovação atingem o seu expoente máximo. Uma empresa constituída por recursos humanos muito homogéneos tem pouca margem de criatividade e de inovação, factores que sabemos serem críticos para o sucesso.»

Boa pergunta

Paulo Pinto de Mascarenhas, no «Atlântico»… «Os projectos de José Sócrates. Vale a pena ver as obras assinadas pelo primeiro-ministro. É caso para se perguntar o que é pior: ser mesmo o autor daquelas 'remodelações' ou ter assinado por outros?»

15 olhares sobre o montado (XII)


Uma mudança

Francisco José Viegas deixa a Casa Fernando Pessoa para ir dirigir a revista «Ler», no que se espera que possa ser um projecto muito interessante. Os dois anos do Francisco à frente da Casa Fernando Pessoa tocaram a excelência. Com recursos mais do que escassos, a casa tornou-se num lugar de referência da nossa vida cultural. Um verdadeiro exemplo do que é gerir na área da cultura, um exemplo para onde até (ou principalmente) ministros deviam olhar.

sexta-feira, 1 de fevereiro de 2008

Uma crónica

A minha crónica de Fevereiro da revista «Magazine Artes». O título genérico da crónica é «Letra Redonda».

A escolha de Valdano
Não que os grandes escritores não saibam escrever histórias de futebol. Nada disso. O que acontece é que as histórias de futebol escritas por grandes escritores poucas vezes me interessaram. Na volta, o problema é meu. Por exemplo, Camilo José Cela, que tem um livrinho («Onze Contos de Futebol», ed. ASA), escrito nos anos 60… Em páginas ao calhas, encontra-se coisas como «se corre o notório risco de terminar enforcado, o árbitro deve abster-se de assinalar penáltis, castigo que pode ser substituído pelo livre ou até pelo deixar jogar»; mas o que mais há é coisas como «no céu voou um abutre sem penas a que chamam xofrango-quebranta-osso, enquanto as viúvas de mau agoiro (roídas de inveja) ficavam com a voz embargada na garganta». Comprei o livrinho por atenção ao notável escritor galego, mas lê-lo com o fascínio com que li outros livros dele, nem pensar nisso...
Antes do Verão de 2002, com um mundial de futebol quase a começar, foi editado pela Relógio d’Água um livro chamado «Contos de Futebol», com nomes como Alfredo Bryce Echenique, Javier Marías ou Osvaldo Soriano. Sem caírem na prosa cifrada do Cela dos «Onze Contos…», as histórias acabaram por também não me interessar muito. Do livro, a que retive, a que nunca mais esqueci, foi a do coordenador da edição, Jorge Valdano, o famoso futebolista companheiro de Maradona na selecção argentina campeã mundial em 1986 (e talvez uma de Julio Llamazares, sobre o penalty falhado por um jogador do Deportivo de Coruña, no último minuto da última jornada do campeonato espanhol e que custou o primeiro título ao clube galego).
Valdano conta uma história de um guarda-redes que nos sonhos defende um penalty no último minuto de um jogo que está empatado a zero. Um dia acontece na realidade, a quatro minutos do fim. Ele atira o boné para dentro da baliza antes de se colocar na posição para tentar agarrar a bola. E acaba por defender o penalty, tornando-se o herói da multidão, por uns segundos, até ao momento em que, com a bola bem segura, entra na baliza para ir buscar o boné.
Uma vez, em Madrid, perguntei a Valdano durante uma entrevista se a história era verdadeira, e ele disse-me que a ouvia contar desde pequeno, mas que não se tratava de uma situação real. Seria contudo possível no futebol, por isso a tinha escrito; para ele, era uma das muitas histórias de perdedores, uma história que mostrava as duas faces do futebol em poucos segundos, o herói e o proscrito.
Aproveitei para lhe perguntar também como se tinha sentido no meio de tantas estrelas da literatura, se tinha sido mais difícil do que jogar ao lado de Diego Maradona ou de Jorge Burruchaga, e ele disse-me que o mundo do futebol é que era o seu mundo. Eu acrescentei, sem que fosse uma pergunta, que todos os escritores do livro gostavam muito de futebol e Valdano acabou por dizer-me que se sentia muito bem com eles, que tinha muitos amigos na literatura, de todas as gerações, Mario Benedetti, Francisco Umbral, Manuel Vásquez-Montalban... Acrescentei Javier Marías, um grande adepto do Real Madrid, clube onde Valdano tinha jogado e onde então era director-geral. E ele acabou por dizer-me que gostava muito de escrever, mas que aquilo de que gostava mesmo era de ler. E quando eu já não ia dizer mais nada, nem perguntar, acrescentou que se tivesse de escolher entre ser Borges ou ser Maradona, haveria sempre de optar por ser Maradona.

O «Record» de quarta-feira

Vale a pena comprar o «Record» na próxima quarta-feira, dia seis, por causa disto.

15 olhares sobre o montado (XI)


A falha

A cada dia que passa mais convencido fico de que escolhi bem a frase do ano de 2007.

As obras do engenheiro

Ver aqui, 23 obras sempre com projecto assinado por José Sócrates. Desconheço se algumas foram premiadas, mas desconfio de que não.

Dois livros

Os dois pequenos textos que referi no post anterior, sobre dois livros. São incluídos na edição de Fevereiro da revista «Pessoal». O novo volume de poesia de Francisco José Viegas e um livro polémico de Christopher Hitchens.

A poesia de Francisco José Viegas
Um dos mais notáveis autores portugueses, tanto na ficção como na poesia. É o seu título mais recente, «Se me Comovesse o Amor», poesia trazida a público como habitualmente pela Quasi Edições. Na apresentação do livro, o crítico literário Pedro Mexia realçou uma característica do autor, a de fazer muitas coisas diferentes e ser capaz de fazê-las todas bem feitas. Sobre poesia não será muito de ir por aí, mal feita, bem feita; por isso, desta recolha de poemas, o melhor talvez seja confessar como se lê, ou melhor, a sensação que fica quando se lê: a sensação de que somos nós que estamos em muitos dos versos, como se Viegas nos confrontasse com a nossa própria vida, como se a sua poesia fosse um retrato nosso, dos nossos sonhos, dos nossos medos, a redacção quase fiel das nossas interrogações. «Envelheces tanto de cada vez que o dia termina/ e olhas para trás. Tens medo do começo do fim,/ das tardes de domingo…»
Francisco José Viegas, «Se me Comovesse o Amor», Quasi Edições, 56 pp.

Para uma visão laica da vida
Um livro que redefine o debate sobre a religião na vida pública. O autor, o norte-americano Christopher Hitchens, considerado pelo «London Observer» como «um dos jornalistas mais brilhantes do nosso tempo», explica que a religião é «uma distorção das nossas origens, da nossa natureza e do cosmos», descrevendo a sua viagem intelectual para uma visão laica da vida. «Persistem quatro abjecções irredutíveis à fé religiosa: falseia completamente a origem do homem e do cosmos; devido a este erro original consegue combinar o máximo de subserviência com o máximo de solipsismo; é, simultaneamente, o resultado e uma causa de uma perigosa repressão sexual; e, em última análise, fundamenta-se em pensamento ilusório.»
Christopher Hitchens, «deus não é Grande», Publicações Dom Quixote, 358 pp.

Uma nova editora

Não costumo colocar aqui os textos que escrevo na página de livros da revista «Pessoal». Desta vez, abro uma excepção, com o que escrevi para a edição de Fevereiro. Neste post, os primeiros três livros da nova editora de Nelson de Matos (na foto, da autoria de João Andrés); no post seguinte, colocarei dois pequenos textos sobre outros livros.

O regresso de Nelson de Matos
É o regresso à actividade do mais carismático editor português, Nelson de Matos, que durante mais de duas décadas esteve à frente das Publicações Dom Quixote, de que foi proprietário. Com passagens ainda por outras casas de referência do meio editorial português, Nelson de Matos arranca agora com um projecto muito pessoal, as Edições Nelson de Matos, uma chancela que assenta no seu próprio nome, segundo diz para «dar um rosto e uma assinatura ao trabalho» que vai fazer. Os três títulos de lançamento da nova editora, previstos para finais de Fevereiro, revelam um editor atento e com enorme sentido de oportunidade; trata-se de um inédito de José Cardoso Pires, um trabalho sobre as relações entre a Igreja Católica e o Estado Novo e uma colectânea de textos sobre a infância, de personalidades bem conhecidas da vida portuguesa.
«infância – quando eles eram pequeninos», o primeiro título, são relatos de infâncias portuguesas do século XX, infâncias tocadas por acontecimentos como a guerra civil de Espanha, a segunda guerra mundial, a guerra fria, o aparecimento da televisão, a guerra colonial, a chegada do ser humano à Lua, o fim da ditadura em Portugal ou o advento das novas tecnologias. Os textos são de nomes tão diversos como António Mega Ferreira, António Vitorino d’Almeida, Armando Baptista Bastos, Carlos do Carmo, Carlos Vaz Marques, Inês de Medeiros, Jorge Silva Melo, Marcelo Rebelo de Sousa, Mário de Carvalho, Raul Solnado, Rui Reininho, Vicente Jorge Silva ou Zé Pedro. É um trabalho da jornalista Sarah Adamopoulos. António Barreto escreve o prefácio, um texto onde considera o resultado final do livro como «atraente e estranho».Segundo título, «A Oposição Católica ao Estado Novo – 1958/ 1974». O período que se seguiu à campanha para as eleições presidenciais de 1958, em que Humberto Delgado se candidatou pela oposição, com as relações entre o Estado Novo e os católicos portugueses a mudarem na aparência e no ser. Desde essa altura e até ao 25 de Abril de 1974 o Estado Novo enfrentou a contestação às suas instituições e às suas políticas por parte de alguns católicos portugueses. O autor, João Miguel Almeida, investigador do Instituto de História Contemporânea da Universidade Nova de Lisboa e do Centro de Estudos de História Religiosa da Universidade Católica Portuguesa, apresenta homens e mulheres que protagonizaram essa contestação. O prefácio é de Fernando Rosas.
Finalmente, o título que promete causar maior sensação no mercado editorial português… «Lavagante – encontro desabitado», um texto de José Cardoso Pires nunca publicado em livro e que teve aquela que terá sido a sua primeira versão, muito reduzida, em Dezembro de 1963, no número 11 da revista «O Tempo e o Modo», na altura com o título «Um Lavagante e Outros Exemplares»; a acompanhar essa versão, havia uma «nota de redacção» a avisar de que se tratava de «um capítulo do seu próximo romance, ainda provisoriamente sem título». Deste texto, segundo as Edições Nelson de Matos, existem outras versões, manuscritas, sem data, uma delas com o título «O Lavagante e a Mulher do Próximo». Existem também algumas versões dactilografadas, igualmente sem datas. Ainda segundo a nova editora, todas indiciam, pelas emendas, que são posteriores ao texto publicado em 1963, sendo também possível perceber que se trata de um texto anterior ao romance «O Delfim», publicado pela primeira vez em 1968, pela Moraes Editores. A fixação do texto que agora é publicado, e a revisão, esteve a cargo de Ana Cardoso Pires, uma das filhas do escritor.
Sarah Adamopoulos, «infância – quando eles eram pequeninos», 232 pp.
João Miguel Almeida, «A Oposição Católica ao Estado Novo», 340 pp.
José Cardoso Pires, «Lavagante – encontro desabitado», 92 pp.
Mais informações e capas dos três livros no site da editora.