segunda-feira, 23 de julho de 2012

Agora

Com um pastel de nata desenha-se uma estratégia de internacionalização. Com uma mentira foge-se a todas as promessas. Com uma golpada fica-se doutor.

quinta-feira, 19 de julho de 2012

sexta-feira, 6 de julho de 2012

Edição de Julho da «human»


Em 1969, uma jovem de 22 anos, recém-licenciada em «Finanças», teve a oportunidade de ajudar a trazer a cadeia de supermercados Pão de Açúcar para Portugal, a partir dos contactos feitos na viagem de finalistas ao Brasil. A história inspiradora de Isabel Megre, uma mulher que sempre tem sido apresentada como um referencial de ética, pode ser conhecida na «human» de Julho. Ver aqui.

Com ênfase

Começo mais um romance. A ler, não a escrever. Li os livros todos do autor, excepto uns que publicou há muitos anos numa série em que assinava com um pseudónimo e tentava aproximar-se de Raymond Chandler. Gosto das histórias dele, mas estou sempre de pé atrás com a escrita, sobretudo com uma coisa irritante que é meter a itálico as palavras que as personagens dizem com ênfase. Escrita visual, ou lá o que é. Já vou com sorte por ele não se ter lembrado de usar maiúsculas nesses casos. Ou bold. Dá sempre confusão. As palavras estrangeiras aparecem também a itálico. Tenho de pensar se é só estrangeiro ou se é estrangeiro com ênfase. A certa altura fico baralhado: aparece um sim que me parece ser dito com ênfase por uma personagem, mas não vem a itálico, vem com tracinhos a separar as letras, uma delas repetida (s-i-i-i-m). Imagino que é uma ênfase diferente ou coisa assim. O autor não sei o que imaginou ao escrever. Mas gosto das histórias dele, por isso tenho de dar o desconto. Até ao facto de o livro vir com a parvoíce do acordo ortográfico, embora isso deva ser opção de cá, da editora, ao fazer a tradução. Nem ligo. Gosto da história. Quando tropeço, levanto-me e continuo. Nas ênfases, com o hábito, já nem tropeço. Ganhei uma certa habituação. A última em que tropecei e caí desamparado, lembro-me, foi uma numa palavra do narrador. Estive um bocado a olhar para aquilo, no chão, e não consegui perceber por que é que o próprio narrador andava com as ênfases nessa parte. Levantei-me e prossegui. Apesar de ter sido uma grande queda. Tão grande como a primeira que dei no romance, logo na primeira linha: «O último esforço de equipa do grupo da festa de despedida...» Ainda no chão, pensei se valeria a pena meter-me naquilo, sujeito a mais quedas. Resolvi que sim, que valia. Porque gosto das histórias do autor. E naquela primeira queda, quem sabe, a corda para me fazer tropeçar foi colocada pela tradutora. «Esforço de equipa do grupo», pensava eu, já mais à frente, tentando perceber se poderia ou não haver alguma situação em que o esforço de um grupo não fosse de equipa, ou de grupo, ou conjunto, ou grupal ou sei lá o que mais. Ainda por cima a abrir o romance. Uma ênfase das complicadas fez-me nessa altura abandonar o esforço para perceber. «Que é que te parece?», perguntou uma personagem a outra, com a ênfase itálica no «te». A outra personagem não respondeu. Reparei que estava confusa. Como eu. Levantei-me e prossegui, com atenção redobrada.

segunda-feira, 2 de julho de 2012

Trabalhava na Secretaria de Estado, imagine-se, do Tesouro


Lê-se no «Sol»:
«Durante dois anos Ana Moura, vogal da comissão política do PSD de Setúbal, fingiu que pagava as rendas da antiga sede social-democrata, em Almada. Os 600 euros mensais foram sempre saindo da conta do partido, mas nunca chegaram às mãos da senhoria. Os cheques eram passados pela dirigente que depois os depositava na sua conta pessoal./ O partido não desconfiou de nada. Fontes ligadas ao PSD de Almada, que está a fazer uma averiguação interna, revelaram ao SOL que há também suspeitas de que as facturas da electricidade e da água nessa sede do partido tenham tido o mesmo destino. No total, o PSD terá sido lesado em mais de 30 mil euros./ Ana Moura, de 49 anos, que até às eleições legislativas de 2011 foi vice-presidente do PSD Almada, estava a trabalhar no gabinete da secretária de Estado do Tesouro. Esta terça-feira, Maria Luís Albuquerque aceitou o pedido de demissão da sua secretária pessoal, que conheceu durante a campanha eleitoral e contratou, logo após a vitória, por 1.882,76 euros mensais.» Etc, etc, etc.

Em perigo


António Souto – Crónica (49)



Só que na vida do cidadão comum, que não tem o privilégio da convocação, os golos rendem muito pouco. Quer assista ao jogo, quer vibre com o jogo, quer se marimbe para o jogo, o campeonato ganha-se ou perde-se no final de cada mês, consoante o salário chega ou não para as despesas.

Que continue o europeu
Ah! que país este, tão bom de mar e de sol, tão cheio de heróis e de santos, de poetas e de fadistas, de camões e de pessoas, de monizes e de saramagos, de carreiras e de ronaldos, ah!, que país este de tanta gente grande e de tanta história!
Este é o país que se não deixa abater com terramotos, enxurradas ou troikas de qualquer espécie, este é o país que revigora com mundiais e europeus, com futebol a sério, com selecções de afoguear o peito e de saciar a danação de quem enxuga sem pagas o suor do rosto.
Este é o país que vai à luta, que ergue bem alto a bandeira e que mesmo em perigo causa perigo, o adversário que se cuide, que estes eleitos da bola, diz Bento, que não é papa, estes homens «já mostraram de que massa são feitos». E não sendo padre-santo, não lhe falta fé, nem lhe faltam indígetes. Assim é o jogo, hoje um desconhecido, amanhã um herói; hoje um herói, amanhã um vilão; hoje um vilão, amanhã um herói. E assim sucessivamente... como na vida! O importante mesmo é marcar golos!
Só que na vida do cidadão comum, que não tem o privilégio da convocação, os golos rendem muito pouco. Quer assista ao jogo, quer vibre com o jogo, quer se marimbe para o jogo, o campeonato ganha-se ou perde-se no final de cada mês, consoante o salário chega ou não para as despesas. Na comum vida do cidadão comum, a realidade não se restringe a quatro linhas nem a sua subsistência depende da macieza e da boa orientação do esférico. Mas se os golos rendem muito pouco ou nada, fazem contudo um bem enorme ao ego, dão às mais sisudas das criaturas a felicidade e a euforia que o demorado inverno reprime.
Foi assim com a passagem aos quartos-de-final, foi assim com a passagem às meias-finais, a convicção incha, as palavras volvem-se vivazes e conciliadoras, o convívio franqueado e amistoso, o país num crescendo mais e mais unido
Porém, com menos ruído – por certo por falta de fôlego para as vuvuzelas – e com menos bandeirinhas – por certo por alguma retracção nas importações chinesas.
E por isso se assiste a toda a gente desenfadando-se com os resultados, alvoroçando-se com os pontos suficientes para que se passe e se prossiga até à vitória final, e os tais que se marimbam para o jogo, que não assistem ao jogo ou que não vibram com ele, esses vão disfarçando o pudor da segregação e, em piano, alinham aos poucos nos festejos.
É vital, portanto, que continue o europeu, e nós nele, ou então será preciso dar largas à imaginação e descobrir outro placebo para as nossas mínguas nacionais e europeias, ou rezar, mas rezar muito, para que se confirme o milagre do ouro em solo alentejano, que o que havia em casa de cada um já foi todo desapossado e as lojas que o mercandavam se vão finando de mansinho.
Quanto ao mais, mantenha-se o fervor, e presentes na alma os versos do poeta: «Mas a chama, que a vida em nós criou,/ Se ainda há vida ainda não é finda./ O frio morto em cinzas a ocultou:/ A mão do vento pode erguê-la ainda.» («Mensagem», Fernando Pessoa)

Crónica de Junho de 2012 de António Souto para o blog «Floresta do Sul»; crónicas anteriores: 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9, 10, 11, 12, 13, 14, 15, 16, 17, 18, 19, 20, 21, 22, 23, 24, 25, 26, 27, 28; 29; 30; 31; 32; 33; 34; 35; 36; 35; 37; 38; 39; 40; 41; 42; 43; 44; 45; 46; 4748.

sábado, 23 de junho de 2012

Tudo


Agora


Corta-cabeças


Geraldo Geraldes, o Sem Pavor, na Aldeia de Valverde (Évora), junto ao lar de idosos e virado para o jardim infantil. Tipo perigoso.

segunda-feira, 4 de junho de 2012

«human» de Junho



A edição de Junho da «human» já está nas bancas. Mais informações aqui.



António Souto – Crónica (48)


Tem dentro dele uma história, uma história triste, de abandono em lugar de amparo e de chuva em lugar de lágrimas, mas tem sobretudo no seu âmago a tessitura aprimorada do texto, o rigor extremo do verbo, a delicadeza da palavra, a harmonia do som, a consciência dos limites do silêncio, a liberdade dos sentidos.

Conto exemplar
Já lá vão muitos anos desde que, por feliz acaso, me chegou às mãos uma então muito recente antologia de contos de Portugal e do Brasil, dezasseis ao todo, contidos e agradáveis de ler, e por isso interessantes para um público estrangeiro, especialmente para jovens estudantes franceses. Uma colectânea com a chancela Le Livre de Poche, na colecção «Lire en…», no presente caso «en Portugais».
Foi há vinte e três anos, leccionava eu a nossa língua e uma (a)mostra da nossa literatura em Estrasburgo, e desse conjunto de contos houve um em particular que me seduziu. Um conto breve, mas muito rico, muito burilado, muito realista, muito poético, muito exemplar. Li-o várias vezes e o prazer de o ler crescia numa permanente descoberta de pintura fascinante.
Ainda hoje o leio para alunos portugueses quando lhes quero mostrar a arte de contar e quero que sintam (sentirão?) a grandeza e a força das palavras. E a par, quase sempre, uma crónica de Lobo Antunes, mestre também em condensar um mundo inteiro em meia dúzia de linhas.
Mas voltemos ao conto, àquele que, de forma peculiar, me cativou. Leva por título «Uma vela para Dario» e narra-nos o episódio de um cidadão comum que se sente mal em plena cidade, dá-lhe um fanico, cai na calçada, alguns «passantes», com o pretexto de o ajudar, vão-lhe roubando os poucos haveres que transporta, a população assiste comprazida ao longo espectáculo da morte, um menino negro acende-lhe uma vela, a chuva cai, a vela apaga-se.
Uma circunstância corriqueira para quem se acostumou com o arrastar da vida a desacreditar na bondade do ser humano e na sua reclamada solidariedade, um acontecimento que daria para um vulgar apontamento de pasquim a somar a muitos outros que se esquecem antes de terminada a leitura.
Porém, este caso é um conto. Este caso tornou-se um conto. Este caso saiu da rua, saiu da cidade, fez-se texto e, por magia, converteu-se em matéria poética. Pouco importa a tonalidade com que se pinta a indiferença, a crueldade, a dor, ou, pensando bem, talvez assim importe mais, e pela coloração da arte o sofrimento entre mais fundo, para lá dos olhos, e o coração do leitor se revigore e a pessoa que é, também por magia, passe a ser mais pessoa.
Regressemos ao nosso conto, chamemos-lhe assim, agora nosso, porque partilhado. Tem dentro dele uma história, uma história triste, de abandono em lugar de amparo e de chuva em lugar de lágrimas, mas tem sobretudo no seu âmago a tessitura aprimorada do texto, o rigor extremo do verbo, a delicadeza da palavra, a harmonia do som, a consciência dos limites do silêncio, a liberdade dos sentidos. Exemplar, portanto, como se disse já, e tudo condensado em seiscentas e vinte e seis palavras.
Nunca li o livro de onde este conto foi extraído («Vinte Contos Menores», Editora Record, 1979), por nunca me ter cruzado com ele, sequer tive curiosidade em saber pormenores do seu autor; poucos portugueses, de resto, terão tido notícias dele e da sua obra. E o Brasil, contudo, aqui tão perto e em português também.
Não fora o «Prémio Camões» deste ano e não o descobriríamos, avesso que é como poucos à notoriedade e ao mercantilismo livresco que transfigura lugares-comuns em best sellers. Em Curitiba continua, e continua escrevendo e esquivo nos seus sossegados 87 anos. Consta-se que não virá a Portugal receber o prémio, para fazer jus à sua caturrice, mas dele não se livrará, porque é justo e devido. Um conto lhe bastaria. Parabéns, Dalton Trevisan!

Crónica de Maio de 2012 de António Souto para o blog «Floresta do Sul»; crónicas anteriores: 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9, 10, 11, 12, 13, 14, 15, 16, 17, 18, 19, 20, 21, 22, 23, 24, 25, 26, 27, 28; 29; 30; 31; 32; 33; 34; 35; 3635; 3738;   39; 40; 41; 42; 43; 44; 45; 46; 47.