domingo, 1 de novembro de 2009

António Souto – Crónica (17)

Décima sétima crónica de António Souto, depois desta, desta, desta, desta, desta, desta, desta, desta, desta, desta, desta, desta, desta, desta, desta e desta. O António mantém uma crónica («Ex-abrupto») no jornal da sua terra («Jornal D’Angeja»). Esta é a da edição de Outubro de 2009.
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Centelhas
1) Este ano houve mais fogos, arderam seis vezes mais hectares de mata e floresta do que no ano passado, e ninguém deu por isso. Só os homens que os combateram souberam das chamas, dos suores e dos ventos fortes e hostis. Estamos em crer que «outros» fogos abafaram estes, antes mesmo de assentarem as cinzas e de se extinguirem as indeléveis aflições. Este ano ninguém deu pelo fumo, nem por nada.
2) Há palavras bonitas, há palavras que são só palavras, há palavras que nem isso. São estas últimas que, de vez em quando, em surdina, fazem avanços indecorosos: mobilidade, vulnerabilidade, governabilidade, noticiabilidade e muitas outras habilidades…
3) Volvi pela segunda vez ao Freeport de Alcochete. A seguir à neblina matinal veio a chuva, e o espaço comercial tornou-se rapidamente inóspito, com as pessoas correndo de loja para loja, salpicando-se, que ninguém vinha preparado para as bátegas. Quem projectou o complexo imaginou-o seguramente longe, num deserto, passe a ironia, árido e mirrado, e por isso não cuidou de cobrir as labirínticas ruelas a céu aberto. E quando a água cai, porque do lado sul do Tejo também cai água, os potenciais consumidores consomem-se para se manterem enxutos. Eu, por mim, avesso que sou a temporais e infortúnios ensopados, juro que ali não voltarei enquanto não voltar o novo sol de estio.
4) Dizem as estatísticas recentes que no ano passado nasceram em média 13 bebés por dia de mães adolescentes, quase todas menores. Não apurámos da proveniência social das progenitoras nem das suas habilitações, mas o facto de serem maioritariamente de menor idade dá que reflectir. Não sei se uma verdadeira Educação para a Sexualidade poderia inverter ou atenuar este fenómeno, mas que a Educação, enquanto instituição, tem o dever de promover uma política activa neste âmbito, lá isso tem – ou então, onde o sentido pleno de uma escolaridade obrigatória de doze anos?
5) Estalou a polémica em torno do último livro de Saramago, «Caim». Não vejo razão substancial para que haja polémica por causa de um livro não polémico. Trata-se, essencialmente, de um romance, e enquanto romance pode e deve ser lido. E enquanto romance pode e deve ser classificado. Será de qualidade igual aos anteriores, será melhor ou será pior? O leitor o dirá e julgará, seja um leitor comum, seja um leitor especialista. A matéria que a narrativa enforma, em jeito de crítica ou de paródia, não é de resto novidade (bastará reler «Memorial do Convento», «O Evangelho Segundo Jesus Cristo« ou «In Nomine Dei») e é consentânea com a ideologia do autor. A não ser que seja este que se quer classificar e julgar, e isso será outra história e outra inquisição.
6) 22 de Outubro de 2009. Temos nova equipa ministerial, finalmente! Como sempre, uns que ficam, outros que partem e outros que chegam. Será uma nova fase e uma nova aposta. Esperemos que um novo fôlego! 31 de Outubro de 2009. Temos o novo corpo de secretários de Estado, empossado de mansinho e sem discursos. Temos, finalmente, o governo completo! Sem feitiçarias, mas em dia de bruxas, por coincidência. Agora, à governança, assim ajudem os santos, que é dia deles amanhã.
(foto: Rui André)
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2 comentários:

OF disse...

Parabéns pelo blog. Agradecia que me informasse se o seu amigo António Souto é jornalista (ou então qual é o seu percurso profissional)

Obrigado

OF

amv disse...

Obrigado. O António Souto é professor.