sexta-feira, 31 de dezembro de 2010

quinta-feira, 30 de dezembro de 2010

A surpresa

A julgar pelo que tenho lido e ouvido hoje, terá sido a grande surpresa do debate entre Cavaco Silva e Manuel Alegre. A postura mais atacante do presidente, quando se esperava que fosse Alegre a tê-la. A mim não me surpreendeu, não porque estivesse à espera dela mas sim porque o assunto nada me interessava. Que atacasse Alegre, que atacasse Cavaco, que atacassem os dois, que pelo contrário aparecessem tipo o Inter de Mourinho em Barcelona… Fosse lá o que fosse.
Mas houve uma coisa que verdadeiramente acabou por me surpreender: os comentários de Cavaco à actuação da actual administração do Banco Português de Negócios (BPN). Alegre, não sei por quê, nem se interessou muito pelo assunto. Quem conduzia o debate a mesma coisa. Mas deviam ter-se interessado, assim como a Polícia Judiciária devia rapidamente também interessar-se e tentar perceber na investigação que presumo está a fazer o que é que Cavaco poderá estar a tentar branquear para ser tão crítico de quem gere o banco agora. Ainda por cima quando está longe de ter a mesma postura em relação aos seus antigos «ajudantes» (termo seu) que toda a gente sabe o que é que arranjaram naquele estranho universo empresarial. E «ajudantes» que ao contrário do que ele, Cavaco, diz não são apenas de há vinte ou vinte e cinco anos – basta ver o caso do «ajudante» que até às últimas se manteve no Conselho de Estado.
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sexta-feira, 24 de dezembro de 2010

E um Feliz Natal!

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António Souto – Crónica (31)

… as chancas gastas e as botas encardidas a secar ao borralho para umas horas mais tarde acolherem os pés ligeiros e as poucas prendas que o menino Jesus acabaria por deixar na sua azáfama de estafeta noctívolo. Camisolinhas de aconchego, dois ou três pares de meias, uns lencinhos às riscas, tudo da loja próxima ou da feira dos vinte e seis. Quase não há lembrança de brinquedos, talvez uma camioneta de chapa muito colorida ou um pífaro de pistões a fingir.
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Um natal que já não é
Este é o último mês do ano. E porque mantemos inalterada a regularidade, esta é a última folha do calendário. De Janeiro a Dezembro, um saltinho de anão, que o tempo não dá tréguas e o que agora é… já foi!
Seria caso para, uma vez mais cumprindo a rotina, fazer balanços, mas não nos apetece, até porque de pouco ou nada servem quando os objectivos são precários ou inexistentes. E depois, sendo os natais o que sempre são, o melhor é pôr de lado os aborrecimentos da computação e cuidar de guardar uns trocos para um bolo-rei, para um qualquer, do mais tradicionalzinho ao gurmê, ao tropical, ao salgado, ao de chocolate ou ao escangalhado, mas um bolo-rei que se traga para a mesa, se possível redondo, para tragar com a natividade dentro.
Bem sei que o natal não é já o que dantes era, quando era mesmo natal, com uma aldeia a sério, e no ventre dela muitas casas escuras e desalinhadas e todas com fumo nas chaminés entupidas de fuligem.
Aquilo é que era lindo, as rachas a arder ao declinar da tarde, com a casca a estoirar quando os toros ainda verdes, e a lenha ali toda à mão para a noite inteira, e o calor que o brasido dava à casa e aos corpos.
A gente ali à espera contando os serões de Dezembro, e quando chegava a véspera do grande dia era uma festa de gestos e de desejos, um remoinho de comeres distintos, mesmo quando iguais, mas provados com o vagar que faltara antes e que faltaria depois, que a lida não se compadecia com delongas e o gado tinha que se alimentar. (E como doía ir para o campo à frente das vacas pelos caminhos de água ou cortar a erva diária nas manhãs de geada, as mãos e os dedos entorpecidos…) E como o jantar se alinhava então com as iguarias de memória… eles eram os bilharacos e as filhoses e as rabanadas e a aletria e às vezes o arroz-doce e também os biscoitos sortidos da Triunfo trazidos por um primo da cidade e as broinhas de mel e os bombons trazidos por parentes da capital!
A gente toda sentada à mesa, naquele dia mais comprida que o habitual, a luz do tecto tremeluzente (com um candeeiro de petróleo de prevenção), um desforrar de estômagos e de conversas vagas. Uma noitada que nos esquecia sempre a missa do galo, que era sempre muito cedo para quem se amesendava sempre tarde, e as castanhas (assadas sob a caruma afogueada) e o bolo-rei faziam pesar demasiado os físicos já cansados e a pedir deita.
Aquilo é que era lindo, as chancas gastas e as botas encardidas a secar ao borralho para umas horas mais tarde acolherem os pés ligeiros e as poucas prendas que o menino Jesus acabaria por deixar na sua azáfama de estafeta noctívolo. Camisolinhas de aconchego, dois ou três pares de meias, uns lencinhos às riscas, tudo da loja próxima ou da feira dos vinte e seis. Quase não há lembrança de brinquedos, talvez uma camioneta de chapa muito colorida ou um pífaro de pistões a fingir. Mas havia também um chocolatinho cobiçado com uma prata muito bonita que a gente esticava cautelosamente e metia no meio de um livro para se alisar com o tempo. Ah, falta ainda acrescentar que naquele dia em que o menino vinha ao mundo, a gente se vestia com roupa nova, que ficava durante muito tempo nova e muito tempo limpa.
Bem sei que o natal não é já o que dantes era, muito mais natal. Mas esta nossa idade, agora de abastança e crise, continua a acreditar num menino que cresceu e se transformou em pai, sobretudo num pai natal aleivoso e mortinho por que acreditem nele. Afinal, em que pode a gente mais acreditar? Voltemos a página!
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Crónica de Dezembro de 2010 de António Souto para o blog «Floresta do Sul»; crónicas anteriores: 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9, 10, 11, 12, 13, 14, 15, 16, 17, 18, 19, 20, 21, 22, 23, 24, 25, 26, 27, 28; 29; 30.
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terça-feira, 21 de dezembro de 2010

Um bocadinho de publicidade

Recebido há pouco da editora.
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domingo, 19 de dezembro de 2010

O meu voto

O meu voto, a 23 de Janeiro, vai para Fernando Nobre. Era bom que conseguisse ir a uma segunda volta das eleições presidenciais e acabasse por ganhar.
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Foto: Vítor Gordo – Syncview
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Revista «human» de Dezembro

(clicar na imagem para aumentar)
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Nas bancas desde o início deste mês. É o número 24, de Dezembro de 2010. Mais informações sobre a edição aqui. Deixo a seguir o meu editorial…
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Dois anos de «human»
À semelhança do que aconteceu em Dezembro de 2009, a equipa da «human» preparou para este mês uma edição especial. Saindo do formato habitual, apresentamos agora aos leitores a nossa edição «Premium» de 2010, que tem a particularidade de ser a maior da história de dois anos da «human».
Temos por isso razões para estarmos felizes, pelo sucesso do projecto da «human», que como se sabe ultrapassa o próprio âmbito da revista. Sucesso que fica a dever-se a uma imensidade de pessoas, desde os colaboradores mais directos aos leitores, passando pelos parceiros, pelos anunciantes, por todos os fornecedores.
Esta edição «Premium» de 2010 apresenta mais de meia centena de perspectivas sobre a gestão das pessoas nas organizações. São as opiniões de muitos dos protagonistas da gestão de recursos humanos em Portugal, que podem ser lidas nas páginas seguintes, opiniões que resolvemos organizar por áreas, que surgem por ordem alfabética (tal como acontece com as instituições que os autores dos textos representam): Benefícios Extra-salariais; Coaching; Consultoria; Formação; Recrutamento e Selecção; Saúde e Segurança no Trabalho (SST); Tecnologias de Informação (TI); e Trabalho Temporário.
É uma edição que conta com o apoio da Mercer, como aliás já aconteceu com a edição «Premium» de 2009. Daí, logo a abrir, apresentarmos uma reflexão de Diogo Alarcão, partner da consultora em Portugal, sobre liderança e gestão de talentos, duas áreas que, segundo refere, começam a ser tidas como prioritárias para um crescente número de empresas nos Estados Unidos e em alguns países da Europa, pensando nos cenários pós-crise.
No final, apresentamos ainda uma retrospectiva do que foi a «human» durante este ano de 2010. Já em Janeiro, teremos de novo a revista no seu formato habitual.

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quinta-feira, 9 de dezembro de 2010

Uma serpente de luzes na planície

Um dia, se o meu filho se tornar jogador de futebol, poderei oferecer-lhe a fotografia de um dos segundos iniciais da sua carreira. Tirei-a num estádio do Alentejo com relvado sintético e dividido em pequenos campos para que pudesse haver vários jogos ao mesmo tempo. Foi num torneio para miúdos, pequeninos, daqueles que estão mesmo a começar, miúdos de equipas de fama bem diferente – basta pensar nas participações do Benfica e do Alandroal.
Quatro elementos em cada equipa, o guarda-redes, um jogador mais recuado e dois laterais capazes de chegar à baliza adversária; ou outra táctica que se quisesse arranjar. Quando o jogo da equipa do meu filho estava prestes a iniciar-se, subi ao ponto mais alto da bancada e com a objectiva fixei o campo que lhe tinha calhado em sorte. Por isso é que depois fiquei com a fotografia daquele segundo. Nessa fotografia, o guarda-redes, pequenino mas com um jeito enorme para a baliza, mesmo sem o jogo ter começado tenta perceber se algum remate poderá surgir de repente. E à frente dele estão o meu filho e os dois restantes colegas, parecendo que trocam ideias sobre o que hão-de fazer mal comece o jogo. Talvez defender, pois a outra equipa, por ser de uma cidade grande, pode muito bem tê-los colocado em respeito. Talvez falem disso no seguimento de indicações do treinador. A verdade é que não sei, porque nunca fiz a pergunta. No centro, vê-se os jogadores de campo da outra equipa, os três junto à bola, prontos para começar; o guarda-redes é que não aparece na fotografia.
O jogo acabou por ficar em zero a zero, com a equipa do meu filho a jogar mais à defesa e ajudada pelo pequeno guarda-redes, que a cada bola que aparecia por perto se atirava sobre ela para logo a seguir se enrolar como um gato. Lembrei-me dos meus tempos não de miúdo como eles mas de adolescente, quando tinha na baliza alguns dos poucos ídolos que fui arranjando no futebol. A selecção portuguesa alinhava praticamente em todos os jogos com um guarda-redes de baixa estatura chamado Bento, que morreu há uns três anos, mas para mim o melhor era um outro ainda mais baixo que eu ia ver nos jogos do Portimonense. Eu fazia sempre a minha selecção com os jogadores que considerava os melhores, e sem preocupações de posição. Era no princípio dos anos oitenta do século passado. Na defesa João Pinto (o que fazia previsões apenas no fim dos jogos e que chegou a dizer a seguir a marcar um golo com o pé esquerdo, que raramente usava, que tinha chutado com o pé que estava mais à mão), Venâncio, Humberto coelho e Inácio (que em 2000, como treinador, haveria de levar o meu velho clube verde a um inesquecível título de campeão); no meio campo Carlos Manuel, Oliveira e Chalana; e à frente Nené (o que nunca sujava os calções), Gomes e Jordão (que uma vez numa entrevista aproveitou para avisar os adversários de que quando lhe tocavam estando ele dentro da área se atirava logo ao chão). Ou seja, a minha selecção só tinha jogadores do Benfica, do Sporting e do Porto, com excepção da baliza onde eu não punha o Bento, nem sequer o Damas (que não era dos baixos), mas antes o Mendes do Portimonense. Esse mesmo, o guarda-redes que eu via fazer as defesas mais incríveis do campeonato e a quem tomava uma especial atenção na altura do aquecimento para cada jogo, quando era o próprio treinador Manuel José, então ainda bastante novo, a ir-lhe fazer remates durante uns dez minutos.
Foi o guarda-redes pequenino que ajudou a equipa do meu filho, e também o meu filho e mais os dois colegas laterais avançados, foram eles todos que se ajudaram. Mesmo com alguma dificuldade em atacar, lutaram de forma a que os adversários da equipa da cidade grande não conseguissem marcar golos. A chuva também terá ajudado, porque a certa altura do jogo ganhou tais proporções que todo o torneio teve de ser interrompido. Era tão forte que nem os jogadores da cidade grande, com os seus equipamentos impermeáveis, conseguiam jogar, quanto mais a equipa do meu filho, de equipamentos normais.
Mas e que a equipa do meu filho tivesse perdido… Ou que tivesse ganho, ou que o tempo estivesse de sol, ou que do céu em vez de água tivesse caído neve ou granizo… Tanto fazia, porque eu fiquei com a fotografia de um dos segundos iniciais da carreira de futebolista do meu filho, se ele algum dia fizer uma carreira no futebol. Talvez o primeiro segundo. Além de outras fotografias que fui tirando do alto da bancada, e de um pequeno filme que também fiz. Essa fotografia acabou por passar para a minha mente, porque eu já a vi várias vezes. Posso mesmo dizer que a decorei dentro da cabeça. A imagem de um momento em que o primeiro jogo do meu filho está mesmo, mesmo a começar.
Mas há outra imagem que tenho dentro da cabeça, só que não vem de uma fotografia. Não sei como, mas a verdade é que a decorei também, apesar de a ter visto apenas de forma fugaz. Apareceu-me no espelho retrovisor do carro, talvez uma hora antes do jogo. Chuva, muita chuva nessa imagem ainda do começo da tarde, a caminho do torneio. Os miúdos seguiam no autocarro da câmara, e eu logo atrás, de carro, sem ter pensado se outras famílias além da minha iriam ver os seus miúdos no torneio. A certa altura, com a força da chuva a dificultar-me a visibilidade, dei comigo a pensar no autocarro que seguia vinte ou trinta metros à frente. Não dava para ver bem, foi o que pensei, mas se fosse Verão haveria de perceber-se facilmente as cores fortes do Alentejo, azul, amarelo e vermelho, a pintura do autocarro com o céu limpo, o pasto dos campos e as papoilas, e também uma frase tirada com adaptações do final de um romance de José Saramago, a frase logo a seguir ao nome da terra, «cidade levantada e principal».
Lembro-me de ter pensado nisso. E de ter dito para mim próprio: «os miúdos vão para o torneio, agora que estão a começar no futebol, e vão num autocarro com uma frase enorme de um enorme escritor, não vão patrocinados pela Coca-Cola nem pela Nike (muito menos pela cerveja Sagres), nem sequer vão num autocarro que fala de apoio ao desporto e à juventude e mais uma data de coisas; os miúdos vão no autocarro da frase do Saramago». Foi o que eu disse só para mim, creio que com as minhas filhas pequeninas adormecidas, a julgar pelo silêncio dentro do carro. E então veio o momento do qual decorei a imagem, como depois haveria de decorar a do segundo antes de começar o primeiro jogo do meu filho. No meio daqueles pensamentos, de repente questionei-me se devia levar as luzes ligadas ou não, se deveria apagá-las por a chuva estar a diminuir um pouco, e aí espreitei pelo espelho retrovisor para ver se atrás de mim algum carro também tinha as luzes ligadas, se é que vinha algum carro atrás de mim na estrada da planície alentejana, e logo percebi que havia muitos carros, e todos com luzes. As famílias dos outros miúdos… Só então é que reparei, depois de ter feito já algumas dezenas de quilómetros. Em que é que pensariam as pessoas desses carros? Como olhariam para o autocarro dos miúdos que avançava com eles para o torneio?
Comecei a contar os carros. Um, dois, três… Mas logo desisti, porque eram muitos, e eu tinha de concentrar-me na condução. Muitos carros, mesmo muitos. Formava-se uma fila na planície, na estrada que naquela altura fazia uma curva longa, uma fila de luzes passada para o meu espelho retrovisor, e foi essa imagem que eu decorei, como depois fiz com a da fotografia. A imagem de uma serpente de luzes na planície, pela estrada fora, atrás do autocarro da cidade levantada e principal.
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