terça-feira, 26 de dezembro de 2006

Muito a correr

Muito a correr, e sem comentários, os dois últimos jogos do Sporting. Sporting – 1 (Liedson), Académica – 0 e depois o jogo da Taça de Portugal, União da Madeira – 1, Sporting – 3 (João Moutinho, Farnerud e Rodrigo Tello).

sexta-feira, 15 de dezembro de 2006

Houve tempos em que as coisas eram piores – parte 2

Pois é isso mesmo; como escrevi há uns dias ali abaixo, houve tempos em que as coisas estiveram piores no Sporting. Passados três meses sobre o texto do Leandro, de ele ser «um bom miúdo» (Fevereiro de 1998), publiquei outro, que coloco a seguir. Estávamos em Maio e o campeonato aproximava-se do final.

Carlos, o chacalzinho
Está a chegar ao fim mais um campeonato nacional de futebol e o Sporting conseguiu mesmo à justa apurar-se para as competições europeias. Custa-me escrever isto, com esta frieza, mas foi exactamente o que aconteceu. E quem assistiu aos últimos jogos sabe bem que só por sorte é que tão estranho objectivo foi alcançado. Porque a verdade é que o Sporting poderia não ter ganho nenhum desses jogos, poderia mesmo ter perdido a maior parte deles. E teria ficado pelo meio da classificação. Até há uns meses, os sportinguistas fartavam-se de dizer piadas relacionadas com o facto de Artur Jorge ter sido o coveiro do Benfica. Agora o melhor é ficarem calados, porque o Sporting também já arranjou o seu Artur Jorge. Quando se esperava, ou melhor, quando alguns dirigentes esperavam um leão, saiu-lhes um pobre chacal, um chacalzinho, Carlos como o terrorista, mas futebolisticamente mais inofensivo do que um gato recém-nascido.
Carlos, o chacalzinho, acabou por viver no Sporting a mesma luta que viveu há um ano no Salgueiros, a luta por um lugar na cada vez menos prestigiada Taça UEFA. O ano passado não o conseguiu, porque o seu melhor jogador, Abílio, falhou um
penalty em Faro. Este ano conseguiu-o, e logo à custa de um jogador de pescoço pequeno, Vidigal, que mesmo assim chegou de cabeça mais alto do que os gigantes da defesa do Belenenses. O destino tem coisas destas, e contrariá-lo é sempre uma carga de trabalhos. As duas situações vividas pelo inofensivo Carlos, no entanto, não deviam ter nada a ver com o Sporting. Porque o Sporting, por mais que os seus dirigentes definam estratégias que a nenhum elemento dos pequenos cantores de Viena ficariam mal, o Sporting, dizia, não é um clube para andar envolvido nessas guerrazinhas. Carlos, o chacalzinho, é que parece ter vocação para tais empreendimentos. Só que, infelizmente, cruzou-se com o caminho do Sporting, ou melhor, saiu-lhe ao encontro, para o envolver na sua auréola bem peculiar.
Há dois anos, o Sporting contratou, segundo se falava, o melhor treinador da Bélgica, o senhor Robert Waseige, e logo houve quem o comparasse, vá-se lá saber por quê, a um assador de castanhas. E, de facto, fosse ou não o melhor treinador da Bélgica, o senhor Waseige não conseguiu grande coisa por cá. Só que não serviu de emenda aos responsáveis do Sporting, porque depois dos cantatores e dos «chicos vitais» de que nem o Diabo mais inventivo se haveria de lembrar, foram buscar para dirigir a equipa, parece que a troco de cinco mil contos por mês e, se calhar, de um saco de chupa-chupas, um perfeito continuador da saga. Carlos, o chacal de pistola de água, não perdeu tempo e começou a fazer das suas. Primeiro que tudo, com medo sabe-se lá de que sombras, rodeou-se dos amigos, que bem diz o ditado que são mesmo para as ocasiões. E num ápice o Sporting viu-se com um secretário-técnico que antes era roupeiro do Salgueiros, e com os jogadores Renato e Leão, que vinham de ser titularíssimos da equipa do Salgueiros. E com um tal Madureira a treinador de guarda-redes, ele que antes treinava os guarda-redes do Salgueiros e enquanto jogador fora uma grande referência das balizas, precisamente, do Salgueiros. E também com um tal Agatão a preparador-físico, o mesmo que antes era preparador-físico de um clube da cidade dita invicta (o Salgueiros, como não podia deixar de ser) e que nos seus tempos de jogador tinha feito carreira no Boavista e no Estrela da Amadora, depois de tempos de glória num outro chamado O Elvas.
Claro que com um pequeno chacal e com tais ajudantes de aprendiz de felino ao comando, o Sporting passou a fazer no campeonato o papel do Salgueiros, do Boavista e do Estrela da Amadora, umas vezes alternadamente, outras ao mesmo tempo. E, quem sabe, se as coisas não mudarem, não fará algum dia o papel do outro o que se chama O Elvas. Tudo isto com a agravante de o tal Madureira, por exemplo, dizer aos jornalistas para perguntarem aos jogadores por que é que a equipa passou a jogar mal. E de Carlos, o chacalzinho, dizer que «o Leandro é um bom miúdo» e que «o Beto é um puto giro» e que «estão a fazer coisas bonitas», mas que no jogo tal «não foram tão sérios» como no jogo tal e coiso. E também que acerca do próximo jogo não revela pormenores da táctica, porque assim «os gajos iam ficar a saber». Os «gajos», enfim, «quer dizer, os adversários, os outros, os malandros, aqueles malandros». De Agatão e do secretário-técnico roupeiro é que, ao menos isso, quase não se ouve uma palavra.
Assim, os sócios e os adeptos tiveram de passar a gramar, ou melhor, «a suportar», como diria José Roquette numa linguagem mais de acordo com os meios empresariais, a suportar uma tropa que em três tempos pôs uma equipa relativamente competitiva a arrastar-se pelas ruas da amargura. Sempre com Carlos, o chacalzinho, a assumir o papel de general. Os sócios começaram a ver nas conferências de imprensa um técnico a dizer que não sabia «as razões do mau rendimento da equipa» e que via «boas exibições» em jogos de uma pobreza sub-sahariana. E começaram a notar os atrasos aos treinos e as noitadas das vedetas mais bem parecidas. E também que Carlos, o Chacalzinho, controlava o nervoso com chupa-chupas e dava pulos no banco como um macaco telecomandado sabe-se lá por que criança traquina. E que dizia tencionar «fazer revoluções no plantel», decerto para afastar os nomes marcantes do Sporting, aqueles ainda capazes de confrontá-lo com a realidade do seu pequeno mundo futebolístico. «Revoluções» para colocar bem colocados na vida, e no Sporting, é claro, os nandinhos e os marcos severos da sua devoção. Tudo isto, pensado ao quilómetro na cabeça do chacalzinho, para «mudar o clube de alto a baixo» e «transformá-lo num Ajax». Exactamente, «num Ajax», foi o que ele disse. Provavelmente estava a referir-se ao Ajax Limpa Vidros.

Textos sobre livros – 10

Já agora, outro texto sobre um livro, que também mete – e muito – o criminoso chileno que morreu no domingo.

Livro: «Salvador Allende – O Crime da Casa Branca», de Patricia Verdugo (Campo das Letras, 197 pp.)

A casa suspeita do costume

Uma investigação sobre os acontecimentos que levaram à morte de Salvador Allende no dia 11 de Setembro de 1973. Às mãos sujas de Pinochet & friends, chilenos e de mais a norte.
No dia 11 de Setembro de 1973, em Santiago, capital do Chile, o general Augusto Pinochet conversava com um colega de golpe. Dizia assim, referindo-se a Salvador Allende, que viria a morrer nesse dia: «Tenho a impressão de que o senhor civil arrancou nos blindados. E Mendoza não tem contacto com ele?» Respondeu o colega, almirante, de nome Patricio Carvajal: «Não, mas nos blindados não fugiu. Os carros de assalto partiram antes e eu posteriormente falei com ele pelo telefone.» Pinochet disse então: «De acordo. Nesse caso, é preciso impedir a saída e, se ele sair, é preciso prendê-lo.» Pinochet, mais adiante, dizia que era preciso uma rendição incondicional para quem fosse preso, e que era preciso prometer respeitar a vida dessas pessoas. «A vida e a sua integridade física e de seguida despacha-se para qualquer lado.» Carvajal acabou por perguntar se mantinham então a oferta de fazer Allende sair do país, depois de preso. E Pinochet respondeu que sim… «Mantém-se a oferta de o fazer sair do país... E o avião pode cair, por ser velho, quando estiver no mar.»
Este e outros diálogos, com o passar do tempo, acabaram por ser revelados ao mundo. Para vergonha de um mundo que permitiu, e insiste em permitir, que tantos tiranos levem a sua avante, ajudados pela mão nem sempre invisível da casa branca de Washington. Vejamos então outro diálogo, também de 11 de Setembro de 1973, e que Patricia Verdugo reproduz em «Salvador Allende – O Crime da Casa Branca». O almirante é o mesmo, mas o general muda; desta vez é Javier Palacios, também da tropa manhosa de Pinochet. Palacios, frente ao cadáver de Allende, fala de forma lacónica em «missão cumprida», em «La Moneda tomada» e em «presidente morto». Fala em castelhano. Já Carvajal prefere o inglês para comunicar as revelações a outros cabecilhas: «They say that Allende commited suicide and is dead now.»
Patricia Verdugo escreve: «Talvez não fosse casual e o almirante soubesse que o estavam a escutar na estação da CIA, facilitando assim a comunicação de tão importante notícia. Talvez… Podemos dar por assente que Nixon e Kissinger [Prémio Nobel da Paz???] o souberam antes do resto dos chilenos.» A autora, jornalista chilena premiada internacionalmente, e activista dos direitos humanos, apresenta uma investigação que só não é absolutamente surpreendente porque nos dias que correm já se sabe o que a casa gasta; a branca, já se vê.

Fiquei preocupado

Ainda uma coisa dos tempos conturbados do Sporting, na outra semana, depois das derrotas com o Benfica e com os russos. Paulo Bento pedia a sócios e adeptos para não assobiarem, dizerem mal e coisas do género. Dizia que não o afectava (presumo que se considera um ser superior), que só afectava os jogadores (presumo que os considera uns atrasados mentais, ou pelo menos uns rapazes psicologicamente instáveis). Fiquei preocupado e a achar que o homem se calhar até não tem tanto nível como tenho vindo a pensar que poderia ter.

E o Scolari?

Deixei de ouvir falar do Scolari. Ainda é o seleccionador nacional? Está em Portugal? Vai ao escritório (presumo que lhe arranjaram um na federação)? Alguém sabe alguma coisa do homem?

Servir ou não servir

Caneira queixa-se do relvado do estádio do Sporting. Toda a gente viu que a equipa jogou nesse relvado com o Benfica e com os russos e que o Benfica e os russos ganharam porque para eles o estádio – por um fenómeno inexplicável – foi outro, sei lá, tipo o do Estrela da Amadora, que levou uma relva nova aí há uns tempos, relva que até ficou famosa.
Caneira pode queixar-se de a relva não servir para a equipa do Sporting. Quem sou eu para não aceitar isso? Logo eu, que não me canso de dizer que ele, Caneira, não serve para a equipa do Sporting.

quarta-feira, 13 de dezembro de 2006

O regresso de Liedson

Regresso, já se vê, no Setúbal – 0, Sporting – 3 (Liedson, Nani, Liedson), de Sábado à noite. Mesmo assim, com três a zero, continuo a achar que a época acabou. Claro que gostei de ver a equipa sem Polga e sem Custódio (que ainda acabou por dar as caras na parte final, mas faz de conta que ninguém deu por isso). Caneira lá andou (mas também não havia mais nenhum disponível para o lugar) e Ricardo, enfim, esse já se sabe que vai jogar sempre enquanto não for vendido a algum clube mais distraído.

Textos sobre livros – 9

Este «textos sobre livros», o número nove, aparece depois do número seis; mas não é um salto, porque ali abaixo estão dois textos, um sobre «A fórmula de Deus», de José Rodrigues dos Santos, e outro sobre um belíssimo romance de uma jovem escritora galega chamada Rosa Aneiros (são eles o número sete e o número oito). Quanto ao número nove, aqui fica, por causa da morte de Pinochet, no domingo.
O livro chama-se «Pinochet, Epitáfio para um Tirano», foi escrito durante o ano de 1999 pelo jornalista e escritor chileno Pablo Azócar e publicado em 2000 (li-o nesse ano) pela editora Campo das Letras. Primeiro comentário: o título, bem explícito, com o nome do ditador e a palavra tirano, e também a palavra epitáfio. Creio que está tudo na medida certa.
Pablo Azócar, a partir da detenção de Augusto Pinochet em Londres, depois da feliz acção do juiz espanhol Baltazar Garzón, mostra quem foi verdadeiramente o todo-poderoso senhor do Chile durante 17 anos (de 1973 a 1990). Mostra-o desde a infância, como passou de burro – na escola – a tenente (esse é aliás o título de um dos capítulos, «De burro a tenente»), como foram importantes na sua vida duas mulheres – a mãe e a esposa –, como progrediu na carreira militar. E como dois dias antes do golpe de 11 de Setembro de 1973 ainda se mantinha fiel ao governo de Salvador Allende. E também como, à última hora, integrou o grupo de generais revoltosos e acabou por imergir como principal figura da junta militar. Para depois ser a figura única.
Este livro mostra também os podres dos governos da transição chilena, após 1990. Denuncia o branqueamento do papel miserável dos figurões da ditadura, com Pinochet à cabeça. Mostra como tentaram – e como conseguiram – transformá-lo num avozinho incapaz de ter algum dia feito mal a uma mosca.
Só para deixar as coisas bem claras, não resisto a trazer aqui alguns diálogos gravados no dia do golpe, desde o posto de comando das operações:
Pinochet – Tenho a impressão de que o senhor civil (refere-se a Allende) arrancou nos blindados. E Mendoza não tem contacto com ele?
Carvajal – Não, mas nos blindados não fugiu. Os carros de assalto partiram antes e eu posteriormente falei com ele pelo telefone.
Pinochet - De acordo. Nesse caso, é preciso impedir a saída e, se ele sair, é preciso prendê-lo.
Carvajal - Também falei depois com o ajudante de campo naval, que me confirmou que Allende está em La Moneda.
Pinochet - Então, devemos estar prontos para actuar em relação a ele. É melhor matar a cadela e assim acaba-se a cria!
Mais adiante:
Pinochet - Rendição incondicional! Nada de parlamentar, rendição incondicional.
Carvajal - Muito bem, de acordo. Rendição incondicional para quem for preso e prometendo respeitar a sua vida, digamos assim.
Pinochet - A vida e a sua integridade física e de seguida despacha-se para qualquer lado.
Carvajal - De acordo. Ou seja, mantém-se a oferta de o fazer sair do país.
Pinochet - Mantém-se a oferta de o fazer sair do país... E o avião pode cair, por ser velho, quando estiver no mar.
Seguiram-se alguns risos.

sexta-feira, 8 de dezembro de 2006

Houve tempos em que as coisas eram piores

Sim, é verdade, as coisas não estão nada boas no Sporting, e era fácil de ver no que iam dar certas apostas, nomeadamente aquela de meter à mistura com os jovens craques alguns jogadores ou maus ou medíocres. Mas já houve tempos em que as coisas estiveram piores. Veja-se, por exemplo, este texto que escrevi em Fevereiro de 1998…


»»» O Leandro é um bom miúdo
Nos últimos três jogos do campeonato nacional de futebol, em nove pontos possíveis o Sporting conquistou um. A equipa caiu na classificação até ao quinto lugar, escapando do sexto porque o Salgueiros escorregou. Está a dezassete pontos do Porto, a sete do Benfica, a seis do Guimarães e a um do Rio Ave. Para além de tudo isto, como se o cenário não fosse já suficientemente mau, foi eliminado da Taça de Portugal pelo Sporting de Braga, equipa a que também não conseguiu ganhar em casa, há menos de um mês, jogando contra nove adversários. Carlos Manuel, o popular (?) Carlão, tem-se desdobrado em explicações; quer dizer, desdobrado mesmo no verdadeiro sentido da palavra, porque as explicações são as mais variadas. No início da deplorável saga, perdendo, ganhando ou empatando, Carlão dizia sempre que a equipa tinha trabalhado bem, que estava com uma boa atitude, que tinha sido séria, além de outras banalidades que não se deviam admitir nem a um entregador de
pizzas, quanto mais a um treinador de um clube de futebol que dirige a equipa que dirige e parece que ganha cinco mil contos por mês. Mas Carlão dizia outras coisas nessa altura, como o futuro ser já amanhã, o Leandro ser um bom miúdo, um campeão, e que era preciso trabalhar bem, de novo ter atitude, ser sério e trabalhar sempre de uma forma séria. Carlão estava na fase da seriedade.
Um dia o Leandro não gostou de uma decisão de Carlão e mandou-o dar uma volta, abandonando o treino em seguida. Da mesma maneira que antes tinha mandado dar uma volta o «Chico Vital» (como chamava José Roquette a Francisco Vital). Carlão não convocou o Leandro para o jogo seguinte, contra o Rio Ave, mas mesmo assim conseguiu arrancar um empate a ferros em Vila do Conde. Dias depois vieram as pazes, Carlão perdoou o Leandro e voltou a convocá-lo, e o Leandro marcou três golos a uma fragilizada equipa do Belenenses. O «miúdo sério e campeão» finalmente deu um ar da sua graça. Um dos raríssimos ares da sua até então escassa graça, e aceitou mesmo, uns dias depois, ir levar um bolo de aniversário a Carlão acompanhado por uma equipa de reportagem da SIC. O «miúdo», a caminho da casa do treinador, nem sabia o que haveria de vir a dizer, mas à chegada lá se desenrascou. Carlão ficou de boca aberta, mas depressa se recompôs e começou com as afirmações da praxe. Que o Leandro, «aquele malandro!», era «um bom miúdo». E que tinham de ficar para jantar, e que não era por aquilo que o Leandro ia jogar se não trabalhasse e se não fosse «um miúdo sério». Era a fase de bem receber do popular (?) Carlão.
Depois Carlão entrou na fase de se trocar todo. Empatou em casa com o Braga, a jogar contra nove esgotados minhotos, e ainda teve a lata de dizer que tinha jogado contra a equipa mais defensiva do campeonato. Passados uns dias, essa mesma equipa tão defensiva despachou-o da Taça de Portugal com três a um. Ainda pior do que o modesto Chaves entretanto fizera, depois de Carlão ter dito que esperava que em Trás-os-Montes não viesse a faltar a luz durante o jogo. Era melhor que tivesse mesmo faltado. Carlão já começava a fazer experiências com os mais novos jogadores da equipa, alguns deles do clube-satélite. O Leandro, o «miúdo sério», tinha que ser acompanhado por outros miúdos, senão era capaz de se zangar outra vez. Ele parecia contentar-se cada vez menos só com doze ou treze mil contos por mês. Precisava de um ambiente mais alegre, e além disso apregoava na capa de uma revista que queria uma namorada. Demonstrava que, além de ser «um miúdo sério» e de ser «um malandro» («Oooolhó malandro do Leandro, veio-me trazer um bolo de aniversário!!»), demonstrava, dizia, que não era nada parvo.
E a fase do trocar-se todo instalou-se mesmo. Carlão entregou os cordelinhos da equipa ao pequeno Afonso Martins. E deu-se mal, tanto mais que o talentoso Pedro Barbosa logo para azar entrou num período em que pouco se mexia pelo relvado. Para ajudar à festa, o marroquino Hadji já há muito que desertara para o Coruña, enquanto que o antes tão estranhamente elogiado Didier Lang mostrou definitivamente o artista que era na realidade. Assim como muitos outros confirmaram também aquilo de que quase toda a gente já desconfiava. Tanto que o Sporting caiu até ao quinto lugar. E o futuro, para Carlão, passou a ser não já amanhã, mas sim bem no próprio futuro, talvez para a próxima época. E a equipa deixou de ser «séria», e de «trabalhar», e de «ter atitude», e de «meter o pé». De forma que as responsabilidades de Carlão, na óptica dele, dele Carlão, entenda-se, só lhe podem por isso começar a ser assacadas na próxima época, para a qual já começa a ter grandes planos de cobiça a alguns jogadores do Salgueiros.
Mas Carlão não tem culpa de tudo; o popular (?) Carlão está inocente. Assim como o popular Quim Barreiros estaria inocente se também o tivessem escolhido para treinador do Sporting. Se calhar Carlão nem tem culpa de nada. Afinal, não foi ele quem se pôs lá, nem foi ele quem gastou dois milhões de contos em meia-dúzia de jogadores que pelas provas dadas poderiam facilmente ser substituídos por um grupo de jovens da divisão de honra. Nem foi ele que escolheu para seu antecessor um treinador que se tinha distinguido precisamente a treinar o Famalicão. Assim como não foi ele que contratou o despropositado Vicente Cantatore para fazer a ligação de vinte dias entre os dois. Além disso, não foi ele que negou apoio ao mesmo Cantatore quando este, mesmo despropositado, começou a querer desfazer-se dos indesejáveis do plantel. E também não foi ele quem fez com que Octávio Machado, que tinha a equipa a lutar em todas as frentes, se demitisse para não ter de aturar aqueles que não passam um dia sem disparar contra os próprios pés. Ou melhor, contra as patas do desgraçado do leão.

quarta-feira, 6 de dezembro de 2006

O fim confirmado

Como escrevi ali abaixo, depois da desgraça com o Benfica, aconteceu aquilo que se esperava: a humilhação perante uma equipa dos escalões secundários da Europa do futebol [Sporting – 1 (Bueno), Spartak de Moscovo – 3]. Os equívocos que têm vindo a suceder-se deixavam entender um desfecho assim. Não consigo imaginar o que será por estes tempos o dia-a-dia de toda aquela gente que está envolvida no futebol do Sporting… Atente-se em alguns pormenores… Miguel Veloso estava a revelar-se no início da época como um jogador promissor e mesmo quando jogava abaixo do que tinha mostrado antes nunca desistia de lutar; havia ainda Carlos Paredes, que em melhor ou em pior forma é sempre um jogador de topo – mas a opção recaiu num jogador medíocre como Custódio mal este recuperou de uma lesão. O exemplo que se está a dar é arrasador para qualquer estrutura: a valorização do estatuto (que não consigo perceber onde Custódio arranjou) em detrimento do mérito. Mais um pormenor… Que exemplo se dá aos jovens em quem tanto se aposta, por exemplo jovens defesas centrais dos escalões juniores e juvenis, quando se tem na equipa um jogador como Anderson Polga, que está a anos-luz de ter lugar nem digo na equipa inicial, mas no plantel? Outro pormenor… Que exemplo se dá a Rui Patrício quando se confia a baliza a um guarda-redes como Ricardo? É um pouco como dizia o Nobel espanhol da literatura, de 1989, Camilo José Cela, sobre a sua personagem mais famosa, um tal de Pascual Duarte: «vês o que faz, pois faz exactamente o contrário daquilo que deveria fazer». Paulo Bento, que é um treinador a quem reconheço valor, está a falhar nos exemplos que dá, está a fazer em muitas situações exactamente o contrário daquilo que deveria fazer. Isso espanta-me, porque ainda acho que ele é muito valioso para o Sporting, e tão mais valioso se nos lembrarmos dos exemplos de mediocridade que deixaram os dois treinadores anteriores (José Peseiro e Fernando Santos). Mas não sei se Paulo Bento conseguirá segurar as coisas no ponto em que estão. Quanto aos dirigentes, como habitualmente, não é de esperar que façam grande coisa.

sábado, 2 de dezembro de 2006

O fim

Parece-me que a época terminou ontem à noite para o Sporting. Não é por uma derrota que se compromete um percurso de dez meses, mas ontem à noite foi diferente. Eu tenho vindo a manter a esperança de que apesar de ter alguns jogadores medíocres no plantel (jogadores que com Paulo Bento fazem o papel de figuras nucleares) com os restantes é possível ir vencendo as dificuldades. Mas ontem à noite (Sporting – 0, Benfica – 2) convenci-me de que não. A equipa, mesmo jogando mal, poderia ter marcado um golo ou dois e se calhar até ganharia o jogo sem grandes dificuldades; talvez partisse, se os marcasse, para uma vitória por mais do que um ou dois golos, até porque a equipa do Benfica é fraca e tem um mau treinador (que o Sporting, infelizmente, bem conhece, embora ele nunca tenha chegado aos níveis indigentes de José Peseiro). Mas sofrendo os dois golos que sofreu, nem pensar em vitórias; dois golos que mostram os perigos de ter na equipa jogadores medíocres como Polga (é mesmo difícil arranjar palavras para descrever um jogador tão mau), que deitou tudo a perder ao nem se preocupar com o jogador do Benfica que marcou o primeiro golo, ou como Custódio, que se desviou para Simão passar e fazer o segundo golo. Polga foi campeão mundial com Scolari, mas ser escolhido para uma equipa de Scolari não é garantia de ser um bom jogador, como se sabe, e Custódio é o capitão do Sporting, mas isso eu nunca serei capaz de perceber como poderá ter sido possível. Uma última nota, para uma situação que ocorreu já perto do final, a da expulsão de Polga: agrediu um jogador do Benfica, e foi bem expulso, o mesmo jogador que depois agrediu João Moutinho, sendo igualmente bem expulso; mas Polga não agrediu com um pontapé, um com uma cotovelada, como agora parece ser moda no futebol português, agrediu com um coice – até nas agressões aquele que é inacreditavelmente considerado por muita gente como um esteio (uso esta palavra por ser frequente vê-la nos nossos jornais do pontapé na bola, quase tão frequente como pilar) da defesa do Sporting mostra como de facto não nasceu com vocação para ser futebolista.

Os «uhs» das personagens de Rodrigues dos Santos

Deixo a seguir um texto que escrevi há poucos dias para uma revista mas que acabou por não ser publicado – tem a ver com o mundo dos blogs e com o novo romance de José Rodrigues dos Santos.

Ao contrário do que esperava, não dei por que fosse grande o falatório sobre o novo romance de José Rodrigues dos Santos no mundo dos blogs. No anterior a coisa teve mais destaque, muito à custa de uma cena que o mesmo protagonista deste romance – um professor de História da Universidade Nova de Lisboa – tinha com uma suposta estudante sueca do Programa Erasmus (cena que metia uma sopa feita com o próprio leite). Desta vez, dei apenas com alguns textos, digamos assim, de divulgação e com uma entrevista simulada (que um tal General Pum Pum assina).
Para exemplo do que encontrei, deixo um excerto do blog «Os Livros»; a certa altura pode ler-se isto: «Uma história de amor, uma intriga de traição, uma perseguição implacável, uma busca espiritual que nos leva à mais espantosa revelação mística de todos os tempos.» E depois continua… «Baseada nas últimas e mais avançadas descobertas científicas nos campos da física, da cosmologia e da matemática, ‘A Fórmula de Deus’ transporta-nos numa surpreendente viagem até às origens do tempo, à essência do universo e o sentido da vida.». No fim, aparece isto: «Sem dúvida uma leitura imperdível para os apreciadores do género e que fará qualquer um repensar a sua vida e o mundo que nos rodeia.»
Eu li o livro e não repensei a minha vida (e até ver também não repensei o «mundo que nos rodeia»). Gostei de ir acompanhando a história, como já tinha acontecido com as duas anteriores – aquela em que o tal professor se meteu a deslindar uma investigação sobre Cristóvão Colombo feita por um velhote, também professor, e a outra que tem como pano de fundo a participação portuguesa na Primeira Guerra Mundial. É um pouco como os livros de Dan Brown, nos quais avancei com uma curiosidade que até me fez desculpar os pontapés na gramática ou coisas mais inesperadas como uma do último título que até cá chegou («Fortaleza Digital», de 1998, ou seja, anterior ao «Código da Vinci»), nem mais nem menos do que um mercenário lisboeta chamado Hulohot, surdo, com uns óculos ligados a um computador alojado no peito, fazendo as pontas dos dedos de teclado, isto além de o homem falar sempre em castelhano.
De «A Fórmula de Deus», portanto, posso dizer que gostei de acompanhar os acontecimentos até ao fim. Claro que teria sido mais cómoda a leitura se em vez de levar apenas uma revisão científica (a de Carlos Fiolhais) o livro tivesse também levado uma revisão a sério do português (um dos muitos exemplos é a proliferação de situações do género «por causa do tipo tal tal tal ter chegado» em vez do que seria correcto, «por causa de o…), o que é preocupante num texto já de si literariamente pobre e com imagens em que tudo parece servir para fazer comparações (veja-se as descrições de Coimbra, a cidade onde vivem os pais do protagonista, bem distintas das que se podem encontrar, por exemplo, no belíssimo capítulo inicial do romance «Os Sinos de S. Bartolomeu», de Nuno de Figueiredo).
Para terminar, uma situação que nunca tinha encontrado. As personagens de «A Fórmula de Deus», quando falam (e algumas falam muito, pois boa parte do livro é feita de diálogos nos quais, na maioria dos casos, são descritas teorias científicas e enumerados dados científicos, além de que havendo nacionalidades tão diferentes normalmente não se sabe que idioma é usado, presumindo-se que seja o inglês), as personagens, dizia, quando falam recorrem com frequência ao uso de um enigmático «uh», na maior parte dos casos quando têm hesitações, ou quando se admiram devido a alguma coisa. Deixo alguns exemplos… Tomás, o protagonista («Uh… sim, claro… conto-vos tudo em função… uh…»); um iraniano que está feito com a CIA («Segurança nacional, uh?»); um físico da Universidade de Coimbra («Uh… bem… sim.»); o pai de Tomás («Bem… uh…); o «adido cultural» (exactamente assim, entre aspas) da embaixada norte-americana em Lisboa («Uh… Ele deve estar a chegar.»); um coronel do exército iraniano («Vai queixar-se a quem? Uh? À sua mãezinha?»).
Soa a repetitivo, obviamente. Mas há mais… A mãe de Tomás («Não há hipóteses de tu e a Constança… uh… vocês…»); um alto responsável da CIA que umas vezes diz «You’re a fucking genius.» e outras «Você é um fucking génio.» («Hmm… sensível, uh? Já vi que está apaixonado…»); o médico do pai de Tomás («Bem… uh… isso depende dos casos, não é?); uma aluna da Universidade de Coimbra («Bem, professor… uh… eu não sei… não sei.»); a iraniana com quem Tomás se envolve («Eu… uh… sou um caso especial.»); um aluno da mesma universidade («Bem… uh… acho que… acho que é a primeira letra do alfabeto grego.»); um iraniano que faz de motorista («Uh?»); e por aí adiante.
Mas no livro nem toda a gente aparece com esta estranha insistência no «uh»? Entre outras personagens, há dois monges tibetanos em relação aos quais não dei por nada, embora um tenha a certa altura ameaçado com um agá seguido por dois émes a denotar, pareceu-me, que qualquer coisa estava a intrigá-lo; quem sabe, não percebia a razão pela qual Rodrigues dos Santos não lhe tinha arranjado nem um único «uh» enigmático.

Blogs que consultei:
- http://oslivros.blogs.sapo.pt/ («Os livros»), com textos assinados por «O Crítico»;
- http://textosparatudo.blogspot.com/ («Textos para tudo»), com textos assinados por «V. F.»;
- http://memoriavirtual.wordpress.com/ («Memória virtual), mantido por Leonel Vicente;
- http://mardeross.wodprss.com/ («A vida é um mar de rosas»), com textos assinados por «arlequim».