Deixo a seguir um texto que escrevi há poucos dias para uma revista mas que acabou por não ser publicado – tem a ver com o mundo dos blogs e com o novo romance de José Rodrigues dos Santos.
Ao contrário do que esperava, não dei por que fosse grande o falatório sobre o novo romance de José Rodrigues dos Santos no mundo dos blogs. No anterior a coisa teve mais destaque, muito à custa de uma cena que o mesmo protagonista deste romance – um professor de História da Universidade Nova de Lisboa – tinha com uma suposta estudante sueca do Programa Erasmus (cena que metia uma sopa feita com o próprio leite). Desta vez, dei apenas com alguns textos, digamos assim, de divulgação e com uma entrevista simulada (que um tal General Pum Pum assina).
Para exemplo do que encontrei, deixo um excerto do blog «Os Livros»; a certa altura pode ler-se isto: «Uma história de amor, uma intriga de traição, uma perseguição implacável, uma busca espiritual que nos leva à mais espantosa revelação mística de todos os tempos.» E depois continua… «Baseada nas últimas e mais avançadas descobertas científicas nos campos da física, da cosmologia e da matemática, ‘A Fórmula de Deus’ transporta-nos numa surpreendente viagem até às origens do tempo, à essência do universo e o sentido da vida.». No fim, aparece isto: «Sem dúvida uma leitura imperdível para os apreciadores do género e que fará qualquer um repensar a sua vida e o mundo que nos rodeia.»
Eu li o livro e não repensei a minha vida (e até ver também não repensei o «mundo que nos rodeia»). Gostei de ir acompanhando a história, como já tinha acontecido com as duas anteriores – aquela em que o tal professor se meteu a deslindar uma investigação sobre Cristóvão Colombo feita por um velhote, também professor, e a outra que tem como pano de fundo a participação portuguesa na Primeira Guerra Mundial. É um pouco como os livros de Dan Brown, nos quais avancei com uma curiosidade que até me fez desculpar os pontapés na gramática ou coisas mais inesperadas como uma do último título que até cá chegou («Fortaleza Digital», de 1998, ou seja, anterior ao «Código da Vinci»), nem mais nem menos do que um mercenário lisboeta chamado Hulohot, surdo, com uns óculos ligados a um computador alojado no peito, fazendo as pontas dos dedos de teclado, isto além de o homem falar sempre em castelhano.
De «A Fórmula de Deus», portanto, posso dizer que gostei de acompanhar os acontecimentos até ao fim. Claro que teria sido mais cómoda a leitura se em vez de levar apenas uma revisão científica (a de Carlos Fiolhais) o livro tivesse também levado uma revisão a sério do português (um dos muitos exemplos é a proliferação de situações do género «por causa do tipo tal tal tal ter chegado» em vez do que seria correcto, «por causa de o…), o que é preocupante num texto já de si literariamente pobre e com imagens em que tudo parece servir para fazer comparações (veja-se as descrições de Coimbra, a cidade onde vivem os pais do protagonista, bem distintas das que se podem encontrar, por exemplo, no belíssimo capítulo inicial do romance «Os Sinos de S. Bartolomeu», de Nuno de Figueiredo).
Para terminar, uma situação que nunca tinha encontrado. As personagens de «A Fórmula de Deus», quando falam (e algumas falam muito, pois boa parte do livro é feita de diálogos nos quais, na maioria dos casos, são descritas teorias científicas e enumerados dados científicos, além de que havendo nacionalidades tão diferentes normalmente não se sabe que idioma é usado, presumindo-se que seja o inglês), as personagens, dizia, quando falam recorrem com frequência ao uso de um enigmático «uh», na maior parte dos casos quando têm hesitações, ou quando se admiram devido a alguma coisa. Deixo alguns exemplos… Tomás, o protagonista («Uh… sim, claro… conto-vos tudo em função… uh…»); um iraniano que está feito com a CIA («Segurança nacional, uh?»); um físico da Universidade de Coimbra («Uh… bem… sim.»); o pai de Tomás («Bem… uh…); o «adido cultural» (exactamente assim, entre aspas) da embaixada norte-americana em Lisboa («Uh… Ele deve estar a chegar.»); um coronel do exército iraniano («Vai queixar-se a quem? Uh? À sua mãezinha?»).
Soa a repetitivo, obviamente. Mas há mais… A mãe de Tomás («Não há hipóteses de tu e a Constança… uh… vocês…»); um alto responsável da CIA que umas vezes diz «You’re a fucking genius.» e outras «Você é um fucking génio.» («Hmm… sensível, uh? Já vi que está apaixonado…»); o médico do pai de Tomás («Bem… uh… isso depende dos casos, não é?); uma aluna da Universidade de Coimbra («Bem, professor… uh… eu não sei… não sei.»); a iraniana com quem Tomás se envolve («Eu… uh… sou um caso especial.»); um aluno da mesma universidade («Bem… uh… acho que… acho que é a primeira letra do alfabeto grego.»); um iraniano que faz de motorista («Uh?»); e por aí adiante.
Mas no livro nem toda a gente aparece com esta estranha insistência no «uh»? Entre outras personagens, há dois monges tibetanos em relação aos quais não dei por nada, embora um tenha a certa altura ameaçado com um agá seguido por dois émes a denotar, pareceu-me, que qualquer coisa estava a intrigá-lo; quem sabe, não percebia a razão pela qual Rodrigues dos Santos não lhe tinha arranjado nem um único «uh» enigmático.
Blogs que consultei:
- http://oslivros.blogs.sapo.pt/ («Os livros»), com textos assinados por «O Crítico»;
- http://textosparatudo.blogspot.com/ («Textos para tudo»), com textos assinados por «V. F.»;
- http://memoriavirtual.wordpress.com/ («Memória virtual), mantido por Leonel Vicente;
- http://mardeross.wodprss.com/ («A vida é um mar de rosas»), com textos assinados por «arlequim».
Ao contrário do que esperava, não dei por que fosse grande o falatório sobre o novo romance de José Rodrigues dos Santos no mundo dos blogs. No anterior a coisa teve mais destaque, muito à custa de uma cena que o mesmo protagonista deste romance – um professor de História da Universidade Nova de Lisboa – tinha com uma suposta estudante sueca do Programa Erasmus (cena que metia uma sopa feita com o próprio leite). Desta vez, dei apenas com alguns textos, digamos assim, de divulgação e com uma entrevista simulada (que um tal General Pum Pum assina).
Para exemplo do que encontrei, deixo um excerto do blog «Os Livros»; a certa altura pode ler-se isto: «Uma história de amor, uma intriga de traição, uma perseguição implacável, uma busca espiritual que nos leva à mais espantosa revelação mística de todos os tempos.» E depois continua… «Baseada nas últimas e mais avançadas descobertas científicas nos campos da física, da cosmologia e da matemática, ‘A Fórmula de Deus’ transporta-nos numa surpreendente viagem até às origens do tempo, à essência do universo e o sentido da vida.». No fim, aparece isto: «Sem dúvida uma leitura imperdível para os apreciadores do género e que fará qualquer um repensar a sua vida e o mundo que nos rodeia.»
Eu li o livro e não repensei a minha vida (e até ver também não repensei o «mundo que nos rodeia»). Gostei de ir acompanhando a história, como já tinha acontecido com as duas anteriores – aquela em que o tal professor se meteu a deslindar uma investigação sobre Cristóvão Colombo feita por um velhote, também professor, e a outra que tem como pano de fundo a participação portuguesa na Primeira Guerra Mundial. É um pouco como os livros de Dan Brown, nos quais avancei com uma curiosidade que até me fez desculpar os pontapés na gramática ou coisas mais inesperadas como uma do último título que até cá chegou («Fortaleza Digital», de 1998, ou seja, anterior ao «Código da Vinci»), nem mais nem menos do que um mercenário lisboeta chamado Hulohot, surdo, com uns óculos ligados a um computador alojado no peito, fazendo as pontas dos dedos de teclado, isto além de o homem falar sempre em castelhano.
De «A Fórmula de Deus», portanto, posso dizer que gostei de acompanhar os acontecimentos até ao fim. Claro que teria sido mais cómoda a leitura se em vez de levar apenas uma revisão científica (a de Carlos Fiolhais) o livro tivesse também levado uma revisão a sério do português (um dos muitos exemplos é a proliferação de situações do género «por causa do tipo tal tal tal ter chegado» em vez do que seria correcto, «por causa de o…), o que é preocupante num texto já de si literariamente pobre e com imagens em que tudo parece servir para fazer comparações (veja-se as descrições de Coimbra, a cidade onde vivem os pais do protagonista, bem distintas das que se podem encontrar, por exemplo, no belíssimo capítulo inicial do romance «Os Sinos de S. Bartolomeu», de Nuno de Figueiredo).
Para terminar, uma situação que nunca tinha encontrado. As personagens de «A Fórmula de Deus», quando falam (e algumas falam muito, pois boa parte do livro é feita de diálogos nos quais, na maioria dos casos, são descritas teorias científicas e enumerados dados científicos, além de que havendo nacionalidades tão diferentes normalmente não se sabe que idioma é usado, presumindo-se que seja o inglês), as personagens, dizia, quando falam recorrem com frequência ao uso de um enigmático «uh», na maior parte dos casos quando têm hesitações, ou quando se admiram devido a alguma coisa. Deixo alguns exemplos… Tomás, o protagonista («Uh… sim, claro… conto-vos tudo em função… uh…»); um iraniano que está feito com a CIA («Segurança nacional, uh?»); um físico da Universidade de Coimbra («Uh… bem… sim.»); o pai de Tomás («Bem… uh…); o «adido cultural» (exactamente assim, entre aspas) da embaixada norte-americana em Lisboa («Uh… Ele deve estar a chegar.»); um coronel do exército iraniano («Vai queixar-se a quem? Uh? À sua mãezinha?»).
Soa a repetitivo, obviamente. Mas há mais… A mãe de Tomás («Não há hipóteses de tu e a Constança… uh… vocês…»); um alto responsável da CIA que umas vezes diz «You’re a fucking genius.» e outras «Você é um fucking génio.» («Hmm… sensível, uh? Já vi que está apaixonado…»); o médico do pai de Tomás («Bem… uh… isso depende dos casos, não é?); uma aluna da Universidade de Coimbra («Bem, professor… uh… eu não sei… não sei.»); a iraniana com quem Tomás se envolve («Eu… uh… sou um caso especial.»); um aluno da mesma universidade («Bem… uh… acho que… acho que é a primeira letra do alfabeto grego.»); um iraniano que faz de motorista («Uh?»); e por aí adiante.
Mas no livro nem toda a gente aparece com esta estranha insistência no «uh»? Entre outras personagens, há dois monges tibetanos em relação aos quais não dei por nada, embora um tenha a certa altura ameaçado com um agá seguido por dois émes a denotar, pareceu-me, que qualquer coisa estava a intrigá-lo; quem sabe, não percebia a razão pela qual Rodrigues dos Santos não lhe tinha arranjado nem um único «uh» enigmático.
Blogs que consultei:
- http://oslivros.blogs.sapo.pt/ («Os livros»), com textos assinados por «O Crítico»;
- http://textosparatudo.blogspot.com/ («Textos para tudo»), com textos assinados por «V. F.»;
- http://memoriavirtual.wordpress.com/ («Memória virtual), mantido por Leonel Vicente;
- http://mardeross.wodprss.com/ («A vida é um mar de rosas»), com textos assinados por «arlequim».
1 comentário:
Em entrevista ao semanário "O Sol", J.R.S. justifica o emprego de "estrangeirismos", pois utilizando esses "recursos" as expressões ficam mais suaves!
Eu pessoalmente não gosto, apesar de perceber que o autor quis utilizar um estilo de linguagem corrente, utilizando o calão dos ingleses e americanos, que são parte das personagens.
Mas, queria eu dizer em primeiro, que achei o seu texto interessante.
Saudações.
Victor Figueiredo.
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