Ainda mais um bocadinho do meu livro de histórias «Políticos, Esses Animais».
(…)
Num certo dia europeu sem carros, um responsável público bem colocado – colocado mesmo no sentido de ter sido colocado, entenda-se –, nesse dia, o tal responsável fez o habitual percurso entre a residência e a instituição que superiormente dirigia a pé. Quer dizer, pela opção de não carregar ainda mais nas vírgulas na frase anterior, importa clarificar as coisas, o senhor não dirigia a instituição a pé, embora também não a dirigisse exactamente de pé, pois geralmente até se apresentava um pouco curvado; ainda que, considerando que as grandes decisões vêm sempre de patamares mais arejados do que o seu (seu dele, responsável), não fosse difícil justificar tal deficiência, mesmo sem recorrer a um médico conhecido ou até assíduo frequentador da casa. O que o senhor fez a pé, ou melhor, fez a pé naquele dia europeu sem carros, foi o percurso da residência até ao gabinete. Colaborou, ou melhor, aderiu, sem que isso signifique que foi preciso desdobrar-se (o mais correcto, no caso dele, até seria dizer dobrar-se, coisa que implica menores esforços) em planeamentos, mobilizações e comunicados justificativos.
Bom, o que é certo é que o senhor aderiu ao dia sem carros por essas europas – e por estas do oeste, já agora – e lá se pôs a andar a pé. Aliás, por morar e «trabalhar» em zona interdita a automóveis (não dos oficiais, como o seu, mas usá-lo no referido dia seria provocação a mais para o povo), por causa disso teve mesmo que ser. De nada serviu a vantagem de não morar nos arrabaldes, onde, com dia sem trânsito ou não no centro da cidade, circular seria um teste complicado para o sistema nervoso, e também para o sistema de embraiagem da nova viatura – ainda que com a pertença ao Estado o arranjo só aos respectivos serviços interessasse, e mesmo isso com tendência para desaparecer, com as novas modas de agilização e, sobretudo, «desburrocatrização». E então o senhor bem colocado na hierarquia lá se meteu a fazer o percurso a pé, a palmilhar ruas e avenidas, para cima e para baixo, dado que logo por azar a cidade capital assenta em sete colinas. Às onze da manhã, quase uma hora depois de sair da residência, já transpirava por tudo quanto era poro. Poderia ter usado os transportes públicos – o metropolitano, os autocarros ou algum eléctrico dos dos turistas –, mas e depois, o que é que diriam de um quadro dirigente tão superior, ainda por cima da administração pública, a fazer aquelas figuras? Se fosse um ministro, vá que não vá, o sacrifício seria compensado com as câmaras das televisões a segui-lo por entre apertos, encontrões e amparos de assessores, e com as secretárias sempre atentas para as maquilhações (que não maquinações, que isso é coisa mais para as oposições). Agora ele, apenas dirigente, ou responsável, mesmo que superior, rodeado de povo por todos os lados, e sem ser em época de eleições, aquela em que o apoio a quem o nomeou fica sempre bem e até se recomenda… Fora disso, o mínimo que poderiam dizer era que se tratava de um sacrilégio.
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Num certo dia europeu sem carros, um responsável público bem colocado – colocado mesmo no sentido de ter sido colocado, entenda-se –, nesse dia, o tal responsável fez o habitual percurso entre a residência e a instituição que superiormente dirigia a pé. Quer dizer, pela opção de não carregar ainda mais nas vírgulas na frase anterior, importa clarificar as coisas, o senhor não dirigia a instituição a pé, embora também não a dirigisse exactamente de pé, pois geralmente até se apresentava um pouco curvado; ainda que, considerando que as grandes decisões vêm sempre de patamares mais arejados do que o seu (seu dele, responsável), não fosse difícil justificar tal deficiência, mesmo sem recorrer a um médico conhecido ou até assíduo frequentador da casa. O que o senhor fez a pé, ou melhor, fez a pé naquele dia europeu sem carros, foi o percurso da residência até ao gabinete. Colaborou, ou melhor, aderiu, sem que isso signifique que foi preciso desdobrar-se (o mais correcto, no caso dele, até seria dizer dobrar-se, coisa que implica menores esforços) em planeamentos, mobilizações e comunicados justificativos.
Bom, o que é certo é que o senhor aderiu ao dia sem carros por essas europas – e por estas do oeste, já agora – e lá se pôs a andar a pé. Aliás, por morar e «trabalhar» em zona interdita a automóveis (não dos oficiais, como o seu, mas usá-lo no referido dia seria provocação a mais para o povo), por causa disso teve mesmo que ser. De nada serviu a vantagem de não morar nos arrabaldes, onde, com dia sem trânsito ou não no centro da cidade, circular seria um teste complicado para o sistema nervoso, e também para o sistema de embraiagem da nova viatura – ainda que com a pertença ao Estado o arranjo só aos respectivos serviços interessasse, e mesmo isso com tendência para desaparecer, com as novas modas de agilização e, sobretudo, «desburrocatrização». E então o senhor bem colocado na hierarquia lá se meteu a fazer o percurso a pé, a palmilhar ruas e avenidas, para cima e para baixo, dado que logo por azar a cidade capital assenta em sete colinas. Às onze da manhã, quase uma hora depois de sair da residência, já transpirava por tudo quanto era poro. Poderia ter usado os transportes públicos – o metropolitano, os autocarros ou algum eléctrico dos dos turistas –, mas e depois, o que é que diriam de um quadro dirigente tão superior, ainda por cima da administração pública, a fazer aquelas figuras? Se fosse um ministro, vá que não vá, o sacrifício seria compensado com as câmaras das televisões a segui-lo por entre apertos, encontrões e amparos de assessores, e com as secretárias sempre atentas para as maquilhações (que não maquinações, que isso é coisa mais para as oposições). Agora ele, apenas dirigente, ou responsável, mesmo que superior, rodeado de povo por todos os lados, e sem ser em época de eleições, aquela em que o apoio a quem o nomeou fica sempre bem e até se recomenda… Fora disso, o mínimo que poderiam dizer era que se tratava de um sacrilégio.
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