segunda-feira, 21 de janeiro de 2008

Os meus diálogos - 7

(do romance «Os Sonhos e Outra Perigosas Embirrações», 2000)

(…)
O Perdido da Arrojela é um fantasma bem nutrido, ou melhor, dizem que é um fantasma. Nunca ninguém o pesou, mas deve ter para cima de oito ou nove arrobas, ou talvez umas dez.
- Há porcos com dez arrobas e até com mais, porcos grandes e gordos como um monte. Há porcos que até partem as pernas com a gordura que têm em cima. Quem faz tenções de engordar um porquinho, vai-lhe dando ração abundante e um dia por outro faz-lhe umas festinhas nas fuças. Tudo para ver se o põe a jeito de dar alimentação para um ano inteiro.
- Foi vossemecê que estudou para engenheiro de porcos, não foi?!
- Fui sim, senhor. Sou o engenheiro de porcos cá do concelho.
- E estudou onde, em Inglaterra?!
- Não, tirei o curso na Rússia, porque o meu pai era filiado no partido.
- Comunista?!
- Exactamente.
- E como é que se diz porco em russo?
- Disso já não me lembro. Mas também o que é que o amigo ia fazer só com uma palavra, ainda por cima tratando-se de um animal...
- Vossemecê está a chamar-me animal?!
- Não, de forma nenhuma! Eu estava a dizer que se trata, o porco, entenda-me o senhor, que se trata de um animal de fracas conotações em certos círculos de importância não desdenhável.
- Ah, sim. Mas eu depois havia de aprender outras palavras, com o tempo.
Quem também conta histórias de porcos, como não podia deixar de ser, é o Raposo do Besteiro.
- Certa vez, contou ele já há muito tempo, possuiu uma porca ...
- Possuiu uma porca?! Olha o grande tarado!!
- Certa vez, teve uma porca ...
- Teve uma porca?!
- Bem, ele era dono da porca, e então ...
- Ah, assim estava no seu pleno direito.
- Cala-se e ouça, amigo!
O Raposo do Besteiro era dono da porca. Tinha-a comprado no mercado de Monchique, e ela criou dezoito porquinhos, todos do mesmo tamanho, mas uns mais vivaços do que outros.
- Pois, isso é sempre assim.
- Escute lá, vossemecê estudou na Rússia?
- Eu não, fiz a quarta classe aqui em Foz de Zimbrais, depois o ciclo em Monchique e o liceu em Portimão. Só que a seguir não consegui entrar na faculdade.
- Então, se não estudou na Rússia, não dê palpites sobre este assunto! Limite-se a ouvir! Uma águia, um dia, quis-lhe roubar um porquinho ...
- A mim?!
- Porra! A águia quis roubar um porquinho à porca do Raposo do Besteiro.
- Ao porco do raposo do Besteiro, quer vossemecê dizer?! Àquele grande porco?!
- Isto é preciso uma paciência! O senhor não me diga que também é contabilista, ou deputado?!
- Olhe, por acaso, até já fui, na constituinte.
- Pois, tinha de ser.
- Fui deputado...
- Obviamente!
- Mas também fazia certas contabilidades.
(…)

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