segunda-feira, 18 de agosto de 2008

Os Dias do Blog – 2

Segunda crónica sobre blogs da série que fiz mensalmente entre finais de 2003 e meados de 2007. Esta é a crónica de Janeiro de 2004. Início aqui.

Isso de reagir à prisão de Saddam
(Janeiro de 2004)
Domingo, 14 de Dezembro, perto das três e meia da tarde (15.29), um texto intitulado «Primeira reacção à captura de Saddam». O mais procurado dos iraquianos tinha sido preso no sábado à noite e, umas horas passadas, bem antes de Bush, Aznar e, já agora, Barroso aparecerem com as suas próprias reacções (Blair tinha-se antecipado), um dos autores do Blogue de Esquerda (http://bde.weblog.com.pt/, o BdE II), Manuel Deniz Silva, lançava para a rede aquela «primeira reacção», quase com champanhe a acompanhar: «Neste blogue abrimos uma garrafa de champanhe quando o regime de Saddam caiu. Agora abriríamos outra se a tivéssemos no frigorífico.»
Postas as coisas assim, e antes dos «grandes» (e, para muita gente, queridos) líderes falarem, vejamos o que se dizia por outras bandas. Por exemplo, Pacheco Pereira, no seu Abrupto (
http://abrupto.blogspot.com/), com o sorumbático título «Prisão de Saddam»: «Se se confirmar, é um acontecimento importante. A chamada ‘resistência’, nome viciado e programático, é, como com maior rigor a imprensa de referência internacional a descreve, um movimento para-militar ligado às estruturas do partido de Saddam, o Baath. Sendo assim, a queda de estruturas de comando político-militar, que estão por trás dos ataques, é relevante para o seu desmantelamento (...)» Reacção a 14, às 11.46.
Voltemos ao Blogue de Esquerda, não para uma segunda reacção aos acontecimentos, mas para isolar um dos comentários recebidos, assinado por NSL (do blog Off & Sina,
http://www.off-e-sina.blogspot.com/): «(...) Temo que toda esta guerra acabe por criar um mito (...). Será Saddam o próximo ícone da resistência anti-americana. Já houve o facto de terem transformado um odiado líder árabe num venerado resistente da causa islâmica, o que não é pouco. Mas, se gostarem de rir, aconselho o blog Al-Qaeda Portugal (...)»
Seguindo o conselho, entremos então na Al-Qaeda de cá (
http://www.al-qaeda-pt.blogspot.com/). Sexta-feira, 12 de Dezembro, um dia antes da prisão de Saddam, um texto intitulado «Estatísticas?!»... «Não há melhor nome para a arte de contar os mortos. São os nossos olhos olhando os olhos estáticos na esperança de, em dois (olhos), contarmos um (morto). Um pequeno dedo que aponta num caderno pautado rabiscado com caracteres árabes: Kathalú 15 (Mataram 15). Seriam 30 olhos com pouco para ver? (...) uma guerra com poucos mortos. (...) na guerra do Iraque 2.0 morreram desde o início 400 americanos e, segundo as estatísticas parciais da ONU, 3.500 civis (entre 5.000 e 10.000 segundo a Igreja Católica), a isso acrescentamos as baixas militares iraquianas, cerca de 30.000 (de acordo com variadas fontes). Assim teremos uma contagem de cerca de 35.400 mortos. (give or take...) Se contarmos que nos ataques de 9/11 morreram 3.030 pessoas (contagem conjunta das torres gémeas, do Pentágono e do avião solitário), veremos que morreram 11,68 vezes mais pessoas na segunda guerra pós-9/11. Ou melhor, se só contarmos com as inocentes mortes civis de ambos os lados, veremos que só no Iraque (no Afeganistão foram outros tantos) morreram mais inocentes do que nos atentados de 9/11. Quase o dobro, para sermos exactos. Se uns não estavam à espera, os outros não podiam fugir. Podemos a isso acrescentar o uso de bombas de fragmentação (proibidíssimas pelas variadas organizações internacionais), que só no Iraque deixaram uma plantação de 2.000.000 de clusters prontas a rebentar. Deve ser assim que querem construir um país novo: oferecendo próteses a metade da população. Enfim, nada mau para um país que, com duas bombas só, matou 250.000 pessoas em 1945. Ainda por cima se orgulham disso ao ponto de terem o avião que fez o lançamento no seu principal museu como atracção principal. (estes americanos são mórbidos)» Assina U-xana Bino Lada e, neste caso, nem dá vontade de rir; noutros talvez...
De novo Saddam, agora no blog Mata-Mouros (
http://matamouros.blogspot.com/), também uma reacção ainda a quente, dia 14 às 13.22. Antes, um esclarecimento: «Quem são os mouros que queremos ‘matar’? – (...) são os atributos perniciosos que pairam no tempo presente e dominam os que lhes não quiseram resistir. O pensamento único, pleno de heteronomia nas suas origens. As condutas doutrinadas pelas tendências. A tradição que assenta exclusivamente na lei da inércia. A superstição mascarada de religião. Os falsos consensos. O corporativismo transformado em lógica existencial. O Estado como dogma insofismável. A ‘cunha’ convertida em elemento insuperável do modo de ser português. O fado como elogio da desdita. O conformismo. A abúlica mansidão. O estar sempre com o que está.» Mas vamos à reacção, «Um lindo dia para a Liberdade» (surgiria depois a versão II): «O tirano foi capturado. Sintomaticamente enfiado num buraco e assemelhando-se – também no aspecto físico – a um sósia de Fidel Castro, foi preso sem resistência. Uma vez mais, sem honra nem glória. Hoje é um grande dia!»
Só que isto de reacções tem que se lhe diga; quando se começa... De novo o BdE... Ainda a 14, sucedem-se as reacções, a «segunda», a «terceira», a «quarta» e até, antes delas, umas «reacções itálicas» Nas «itálicas», «Espera-se que não seja de plástico como o peru.» (Manuel Deniz Silva); na «segunda», «... um traidor sanguinário da sua pátria e do seu povo, um monstro sádico, um realíssimo filho da puta.» (José Mário Silva); na «terceira», «... não gostei de ver os pulos de alegria e os gritos histéricos dos jornalistas (mesmo se iraquianos) e ainda menos o anúncio fanfarrão de Paul Bremer: ‘We got him!’. A guerra não é um jogo de futebol e um adversário militar não é um troféu de caça.» (JMS); na «quarta», «Seria um erro crasso esquecer, hoje, um facto simples: a justiça que finalmente se abate sobre Saddam não torna mais justa uma guerra injusta.» (JMS).
Fiquemos por aqui de reacções. Abre-se agora espaço para a telenovela de Saddam sob prisão. Argumentistas e actores secundários não hão-de faltar.

Blogs consultados
http://www.blogdeesquerda/ (II), mantido por José Mário Silva e Manuel Deniz Silva;
http://abrupto.blogspot.com/), mantido por José Pacheco Pereira;
http://www.off-e-sina.blogspot.com/, mantido por Gonçalo Soares da Costa, Henrique Bastos e Nuno Seabra Lopes;
http://www.al-qaeda-pt.blogspot.com/, com textos assinados por U-xana Bino Lada e outros;
http://matamouros.blogspot.com/, com textos assinados por CAA.
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