Mais dois capítulos (XI e XII) de «Brites e as Gaivotas» (início aqui).
Brites e as Gaivotas
Uma história da Padeira de Aljubarrota
»»» Cap. XI
Assim Brites chegou a Portugal, depois de dois dias e duas noites no mar, sem sequer reparar nas gaivotas que a seguiam de perto.
- A puta nem nos liga!
Mas não foi no Algarve que deu à costa. Os ventos de sul impeliram-na bem mais para cima, além de onde se avistava os montes de Sintra, e levaram-na até uma pequena praia deserta. E como era uma mulher decidida, sempre pronta para as lutas da vida, nem perdeu tempo a respirar de alívio por assentar os pés em terra firme. Abandonou o barco do mouro enganado e afogado e fez-se ao caminho à cata de um rumo para a sua existência. As gaivotas, mesmo contra a natureza que tinham, decidiram segui-la.
- Eu, por mim, não ia.
- Não, temos que ver no que isto dá.
E depois de muitas terras e terriolas, pedindo esmola nuns lados e fazendo biscates noutros, e dormindo nalgum palheiro mais acolhedor, chegou ao ponto do mundo que, sem ela saber, o destino lhe tinha marcado.
- Isto chama-se como, senhor?
- Aljubarrota, meu rapaz!
»»» Cap. XII
Nessa altura, Brites andava vestida com trajes masculinos, ainda com medo de que a lei se lembrasse dela.
- Brites é boa na arte do disfarce.
Mas o tempo tinha passado, e as guerras com Castela tudo faziam a lei esquecer. Era por isso altura de arranjar uma vida fixa. Tanto que, como até gostou do nome da terra, não esteve com meias medidas, despiu as calças.
- Não vale a pena aproximarmo-nos, que ela fê-lo atrás daquela moita.
- Eu tenho é saudades do mar.
- Um dia voltamos, é só vermos a sorte de Brites.
De trás da moita saiu novamente uma mulher, feia e grande, mas uma mulher. Brites voltava a usar saia. Depois meteu-se à procura de trabalho, coisa que conseguiu na padaria de uma velhota da terra. Logo se mostrou tão esforçada que a pouco e pouco a patroa lhe foi entregando a direcção do negócio. E acabou por deixar-lho, a troco de bons cuidados, assim que viu aproximar-se a morte. Herdeiros, pelos vistos, não havia, ou então nenhum se atreveu a aparecer. E Brites foi tão atenciosa com a infeliz velhota que ainda lhe conseguiu amenizar o sofrimento dos últimos dias.
- Brites, afinal, tem coração.
Brites e as Gaivotas
Uma história da Padeira de Aljubarrota
»»» Cap. XI
Assim Brites chegou a Portugal, depois de dois dias e duas noites no mar, sem sequer reparar nas gaivotas que a seguiam de perto.
- A puta nem nos liga!
Mas não foi no Algarve que deu à costa. Os ventos de sul impeliram-na bem mais para cima, além de onde se avistava os montes de Sintra, e levaram-na até uma pequena praia deserta. E como era uma mulher decidida, sempre pronta para as lutas da vida, nem perdeu tempo a respirar de alívio por assentar os pés em terra firme. Abandonou o barco do mouro enganado e afogado e fez-se ao caminho à cata de um rumo para a sua existência. As gaivotas, mesmo contra a natureza que tinham, decidiram segui-la.
- Eu, por mim, não ia.
- Não, temos que ver no que isto dá.
E depois de muitas terras e terriolas, pedindo esmola nuns lados e fazendo biscates noutros, e dormindo nalgum palheiro mais acolhedor, chegou ao ponto do mundo que, sem ela saber, o destino lhe tinha marcado.
- Isto chama-se como, senhor?
- Aljubarrota, meu rapaz!
»»» Cap. XII
Nessa altura, Brites andava vestida com trajes masculinos, ainda com medo de que a lei se lembrasse dela.
- Brites é boa na arte do disfarce.
Mas o tempo tinha passado, e as guerras com Castela tudo faziam a lei esquecer. Era por isso altura de arranjar uma vida fixa. Tanto que, como até gostou do nome da terra, não esteve com meias medidas, despiu as calças.
- Não vale a pena aproximarmo-nos, que ela fê-lo atrás daquela moita.
- Eu tenho é saudades do mar.
- Um dia voltamos, é só vermos a sorte de Brites.
De trás da moita saiu novamente uma mulher, feia e grande, mas uma mulher. Brites voltava a usar saia. Depois meteu-se à procura de trabalho, coisa que conseguiu na padaria de uma velhota da terra. Logo se mostrou tão esforçada que a pouco e pouco a patroa lhe foi entregando a direcção do negócio. E acabou por deixar-lho, a troco de bons cuidados, assim que viu aproximar-se a morte. Herdeiros, pelos vistos, não havia, ou então nenhum se atreveu a aparecer. E Brites foi tão atenciosa com a infeliz velhota que ainda lhe conseguiu amenizar o sofrimento dos últimos dias.
- Brites, afinal, tem coração.
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