sábado, 6 de novembro de 2010

Submarinos

Tive a primeira cadeira de economia no liceu, quando andava no nono ano. Depois foram aparecendo mais, até à universidade, e mesmo quando a seguir voltei a estudar, inclusive fora de Portugal. Apanhei excelentes professores, como Ferro Rodrigues (que ainda era pouco conhecido, ia para as aulas num pequeno carro branco e por vezes levava o jornal «A Bola» debaixo do braço), tive outros mais ou menos, tive um a quem chamavam «o camionista» e outro que era louco. Obrigaram-me a comprar um livro do primeiro-ministro da altura, cujo filho eu haveria depois de ver no dia da inspecção militar a despachar-se em menos de uma hora (com um sargento, ou lá o que era, a ameaçar quem protestava com a possibilidade de detenção). Foram muitas cadeiras, é verdade, mas só agora, passados todos estes anos, é que descobri que a dívida pública dos países se pode medir em submarinos. Na última semana perdi a conta ao número de pessoas que ouvi a falarem disso: comentadores, deputados e por aí adiante. Ainda ontem à noite, na televisão, o deputado europeu Nuno Melo se queixava de que nos anos de José Sócrates como primeiro-ministro Portugal se tinha endividado o equivalente a dois submarinos por mês.
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2 comentários:

Manuel Nunes disse...

António,
Sou economista de formação, embora depois tenha seguido por outras vias, e cada vez mais me convenço que a Economia é uma disciplina do domínio das ciências ocultas. Basta vermos o que se tem passado, à escala mundial, de há dois anos para cá. Esta história dos submarinos tem piada. O Paulo Portas é um grande contador de anedotas, o Nuno Melo não lhe fica atrás.
É interessante que tenha falado de um grande professor, o Ferro Rodrigues, um lutador antifascista que foi presidente da minha associação de estudantes e que recentemente foi envolvido como
pedófilo por essa corja que agora enche a boca de submarinos. Corja é a palavra certa, já Camilo a usara com toda a propriedade. Cavaco escreveu um livro e é tratado por senhor professor doutor; Louçã escreveu vários livros e continua a ser o Chico.
O mal deste país é ser um país de submarinos, de políticos que estão muito abaixo da linha de água. Sabe, fala-se muito de corrupção e há uma tendência na blogosfera para enfatizar esse desvio criminal. A maior corrupção, porém, é a das mentalidades. Aceito que é importante distribuir computadores às criancinhas, mas também lhes devíamos ensinar os Lusíadas, o Eça e o Saramago. O senhor professor doutor Cavaco Silva, presidente da república em vias de ser reeleito, não sabia, quando em tempos lho perguntaram, de quantos cantos se compõem Os Lusíadas. Pode perceber de finanças pública, do que já vou duvidando, mas não percebe nada da alma do país. Com políticos destes não vamos longe.

Manuel Ramalhete disse...

António:

Infelizmente, para além dos submarinos, temos outras medidas apropriadas para comparar grandes números, nomeadamente os BPNs e os BPPs. Acontece é que nenhuma delas está aferida, isto é, ainda desconhecemos a sua verdadeira capacidade. A nós, o que nos dizem é que somos obrigados a pagar. Porque sim!
O mesmo parece não acontecer a quem vai receber os dividendos antecipados da PT. Porque sim. Porque podem!
Um abraço