Um texto que escrevi para a edição de Junho da revista «Ler», para a secção «Listas». Optei por uma pequena lista de personagens que me pareceram muito estranhas.
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Algumas personagens que me surpreenderam
Se um dia, por qualquer razão, eu tivesse de fazer uma entrevista a Dan Brown, pelo menos já sabia por onde começar. Antes do que quer que fosse, do novo livro (se ele tivesse um novo livro), antes eu haveria de lhe perguntar por que é que pôs num romance («Fortaleza Digital») um português, natural de Lisboa, chamado Hulohot. Quer dizer, a pergunta não seria sobre a razão de ter optado por um português, mas sim sobre o facto de este se chamar Hulohot. É uma das personagens mais estranhas que encontrei num livro.
Mercenário de profissão, com 42 anos e muito considerado por uma agência governamental norte-americana, Hulohot (não sei se o nome é tipo Joaquim Hulohot ou se é tipo Hulohot da Silva) tem segundo Brown um único senão, é surdo, o que lhe dificulta as comunicações. Talvez para compensar, vê através de uns óculos cujas lentes são, do lado de dentro, o ecrã do computador que usa adaptado ao peito, sendo que nas pontas dos dedos tem o teclado (que funciona tocando com as pontas umas nas outras). Tudo tecnologia de certeza norte-americana, implantada em mão-de-obra portuguesa. E assim anda este Hulohot pelo livro, sem dizer nada, fazendo até com que o leitor desconfie de que além de surdo é também mudo. Mas não, a certa altura ele fala: «Hola, soy Hulohot!»
Sem ofensa, passo directamente para Roberto Bolaño. Não por causa de uma personagem do genial escritor chileno, mas por causa do próprio Bolaño. Bolaño personagem, isso não pôde deixar de me surpreender. Ele aparece num romance de um dos meus escritores favoritos (Javier Cercas), o inesquecível «Soldados de Salamina». O próprio Cercas entrevista-o nesse romance e ele diz-lhe que tinha já lido dois livros seus, um de contos e um pequeno romance («O Inquilino», de que existe uma edição portuguesa, da ASA). Bolaño acaba por insistir para que voltem a encontrar-se e nesse encontro, durante um almoço, quase que se transforma ele próprio no narrador de «Soldados de Salamina». E acaba por ser a chave para o desfecho do romance.
Outra descoberta aconteceu-me com José Rodrigues dos Santos. Ele tem um romance («A Fórmula de Deus») em que, surpreendentemente, as personagens dizem «uh». O protagonista, Tomás, diz «uh», tal como um iraniano que está feito com a CIA, um físico da Universidade de Coimbra, o pai de Tomás, o «adido cultural» (exactamente assim, entre aspas) da embaixada norte-americana em Lisboa e um coronel do exército iraniano. E tal como a mãe de Tomás, um alto responsável da CIA que umas vezes diz «you’re a fucking genius» e outras «você é um fucking génio», o médico do pai de Tomás, uma aluna da Universidade de Coimbra, a iraniana com quem Tomás se envolve, mais um aluno de Coimbra, um iraniano que faz de motorista e por aí adiante. Três exemplos… O coronel iraniano a certa altura pergunta: «Vai queixar-se a quem? Uh? À sua mãezinha?» Quanto ao responsável da CIA, faz uma espécie de comentário: «Hmm… sensível, uh? Já vi que está apaixonado…» A paixão de Tomás é a iraniana, que diz : «Eu… uh… sou um caso especial.»
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Algumas personagens que me surpreenderam
Se um dia, por qualquer razão, eu tivesse de fazer uma entrevista a Dan Brown, pelo menos já sabia por onde começar. Antes do que quer que fosse, do novo livro (se ele tivesse um novo livro), antes eu haveria de lhe perguntar por que é que pôs num romance («Fortaleza Digital») um português, natural de Lisboa, chamado Hulohot. Quer dizer, a pergunta não seria sobre a razão de ter optado por um português, mas sim sobre o facto de este se chamar Hulohot. É uma das personagens mais estranhas que encontrei num livro.
Mercenário de profissão, com 42 anos e muito considerado por uma agência governamental norte-americana, Hulohot (não sei se o nome é tipo Joaquim Hulohot ou se é tipo Hulohot da Silva) tem segundo Brown um único senão, é surdo, o que lhe dificulta as comunicações. Talvez para compensar, vê através de uns óculos cujas lentes são, do lado de dentro, o ecrã do computador que usa adaptado ao peito, sendo que nas pontas dos dedos tem o teclado (que funciona tocando com as pontas umas nas outras). Tudo tecnologia de certeza norte-americana, implantada em mão-de-obra portuguesa. E assim anda este Hulohot pelo livro, sem dizer nada, fazendo até com que o leitor desconfie de que além de surdo é também mudo. Mas não, a certa altura ele fala: «Hola, soy Hulohot!»
Sem ofensa, passo directamente para Roberto Bolaño. Não por causa de uma personagem do genial escritor chileno, mas por causa do próprio Bolaño. Bolaño personagem, isso não pôde deixar de me surpreender. Ele aparece num romance de um dos meus escritores favoritos (Javier Cercas), o inesquecível «Soldados de Salamina». O próprio Cercas entrevista-o nesse romance e ele diz-lhe que tinha já lido dois livros seus, um de contos e um pequeno romance («O Inquilino», de que existe uma edição portuguesa, da ASA). Bolaño acaba por insistir para que voltem a encontrar-se e nesse encontro, durante um almoço, quase que se transforma ele próprio no narrador de «Soldados de Salamina». E acaba por ser a chave para o desfecho do romance.
Outra descoberta aconteceu-me com José Rodrigues dos Santos. Ele tem um romance («A Fórmula de Deus») em que, surpreendentemente, as personagens dizem «uh». O protagonista, Tomás, diz «uh», tal como um iraniano que está feito com a CIA, um físico da Universidade de Coimbra, o pai de Tomás, o «adido cultural» (exactamente assim, entre aspas) da embaixada norte-americana em Lisboa e um coronel do exército iraniano. E tal como a mãe de Tomás, um alto responsável da CIA que umas vezes diz «you’re a fucking genius» e outras «você é um fucking génio», o médico do pai de Tomás, uma aluna da Universidade de Coimbra, a iraniana com quem Tomás se envolve, mais um aluno de Coimbra, um iraniano que faz de motorista e por aí adiante. Três exemplos… O coronel iraniano a certa altura pergunta: «Vai queixar-se a quem? Uh? À sua mãezinha?» Quanto ao responsável da CIA, faz uma espécie de comentário: «Hmm… sensível, uh? Já vi que está apaixonado…» A paixão de Tomás é a iraniana, que diz : «Eu… uh… sou um caso especial.»
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1 comentário:
Ahahahah! Muito bom! Uh!
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