sexta-feira, 18 de junho de 2010

José Saramago (1922-2010)

«No meio da paz nocturna, entre os ramos altos da árvore, uma estrela aparecia-me, e depois, lentamente, escondia-se por trás de uma folha, e, olhando eu noutra direcção, tal como um rio correndo em silêncio pelo céu côncavo, surgia a claridade opalescente da Via Láctea…» Assim falou Saramago dos seus tempos de criança. Foi em estocolmo. Ele terá sempre um lugar entre as estrelas. E talvez agora esteja a observar-nos.
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3 comentários:

a. souto disse...

7 de Fevereiro de 1997, um ano antes de lhe vir a ser atribuído o Nobel, apresentei-lhe em Estrasburgo, na FNAC, o livro L'Aveuglement (Ensaio sobre a Cegueira). Com Álvaro Guerra, apresentámos o livro e o homem. Saramago alinhou no debate, espécie de conversa entre amigos. No final, fomos jantar, uma refeição informal e divertida, com a Pilar e a mulher de Álvaro Guerra em ambiente familiar. Nesse dia descobri um outro Saramago, uma outra pessoa, descobri nesse dia a sua obra quase toda, e será pouca. Desconfio que amanhã ainda nos fará falta... Um abraço, agora que continua.

JacManCdL disse...

Olá,
Quando em 1998 ouvi numa Radio Francesa a atribuição do Prémio Nobel a José Saramago, foi para mim um dia inesquecível. «Levantado do Chão», como alentejano e Montemorense ficou gravado em mim como uma página incontornável da minha existência. A obra do José Saramago, devia de ser para Portugal algo de exceptional. Não foi assim quando ele era vivo, e que as sanguesungas políticas que hoje querem recuperar aquilo que rejeitaram ontem, leiam o Evangelho, segundo Ponce Pilate.

Manuel Ramalhete disse...

António:

Por vezes, acontecem situações destas. Li o seu "post" no próprio dia em que o colocou no "blogue", mas fiquei bloqueado. Senti-me incapaz de comentar fosse o que fosse. Perante a morte deste homem, receava – como ainda receio – que as palavras, qualquer delas e todas elas, fossem irrelevantes e descabidas. Foi o que senti, apesar de ter lido toda a sua obra, mesmo a publicada antes do 25 de Abril. Toda, digo eu, sabendo que tenho ali na estante o "Ensaio sobre a Lucidez" que, na altura, propositadamente deixei para trás, nem eu sei bem porquê. Às tantas, talvez tenha deixado essa obra de reserva, para lhe poder deitar mão, um dia, quando a regularidade das suas publicações sofresse algum descompasso ou intermitência.
Saramago morreu há dias, deixando um vazio que queira Deus não nos venha a fazer falta. A nós como povo e à casa comum da Língua Portuguesa.
Como escritor deixou um estilo próprio e inconfundível o que, só por si, constitui um raro privilégio. A falsa controvérsia à volta da pontuação é risível e define bem a estatura de quem a evoca no sentido de o apoucar. Mas Saramago não era só o estilo, era principalmente o conteúdo e a dimensão. Ele foi dos poucos que tocaram a universalidade das interrogações e que procuraram incessantemente um sentido que desse sentido à caminhada do homem sobre a terra. Poucos terão sido os crentes que procuraram tanto e tão fundo como ele. Mas não se limitou a ser o homem dos livros e da literatura. Foi um homem de causas que correu o Mundo para estar junto daqueles que travavam batalhas decisivas pela dignidade dos seus povos. E no exacto momento em que as travaram.

Um abraço.