quarta-feira, 23 de julho de 2008

A desigualdade-geral da República

Escrevo isto depois de ver na SIC uma longa entrevista com o procurador-geral da República, Fernando Pinto Monteiro. De várias coisas que retive do que fui ouvindo, deixo aqui duas… Primeira, a questão de a justiça ser igual para todos, ou seja, os criminosos, independentemente de serem ricos ou pobres, influentes ou não, mais ou menos conhecidos, devem ter um tratamento igual; sabe-se que as coisas não funcionam exactamente assim por cá, mas saúda-se as boas intenções do procurador. Segunda coisa, o telemóvel. Não a questão das escutas, mas uma confissão que me pareceu absolutamente despropositada (deu-me a ideia de que feita sem perceber o quanto significavam as suas palavras entremeadas com um sorriso disfarçado de quem acha que foi mais esperto do que os outros). Na parte em que foi entrevistado na aldeia natal (Porto de Ovelha), Pinto Monteiro disse que era por causa dele que lá havia rede de telemóvel. Uma gentileza que a TMN teve para com ele, conforme explicou (a entrevistadora, Conceição Lino, achou graça). Deve-lhe dar muito jeito, ao procurador, pois vai a Porto de Ovelha todos aos anos, cinco ou seis dias no Verão e ainda na altura do Natal, havendo também anos em que vai na Páscoa. Imagine-se se a Procuradoria-Geral da nossa República ficasse em Porto de Ovelha, imagine-se aquilo que não haveriam de instalar na aldeia… Eu também gostava que a TMN – o meu operador – tivesse a mesma atenção comigo, e nem é na zona para onde vou uns quantos dias por ano. Não, é mesmo onde moro, o ano todo. Se pudessem trazer até aqui a rede, apesar de eu não ser procurador-geral de nada, eu agradecia. Já que para os crimes somos todos iguais (custa-me a acreditar, mas enfim…), para a rede de telemóvel não faria sentido que também o fôssemos?
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2 comentários:

Anónimo disse...

António:

As pessoas que atingem este tipo de estatuto ou posição, bem como as que detêm fortunas, nem sequer se apercebem dessas contradições. Para elas, é como se tudo isso fosse natural. No fundo, no fundo, não confessam mas pensam como os monarcas absolutistas. Para estes o seu poder vinha directamente de Deus e, portanto, era natural e inquestionável. No caso vertente, não virá de Deus mas sim do estatuto. Todavia, a lógica é a mesma. Os plebeus são outra coisa. Eles até condescendem que somos humanos, mas de outro tipo. Não é só na Índia que existem castas. A única diferença é que na Índia assumem isso.

Um abraço.

Anónimo disse...

Manuel

Este seu comentário é uma síntese perfeita da realidade do nosso país. Provavelmente com o passar do tempo (décadas) perder-se-á este espírito em certo sentido ainda muito feudal. Mas até lá, temos de ir assistindo a estas amostras de subdesenvolvimento, ainda por cima em cargos que deveriam ser de grande importância mas que, por esse mesmo espírito das pessoas que os ocupam, acabam por tornar-se banais e muitas vezes sem qualquer utilidade prática para o comum dos cidadãos.

António