Nunca pensei que as coisas chegassem a este ponto em Portugal. Claro que sei que a política se tornou abrigo da incompetência e, pior do que isso, da pura maldade, mas mesmo assim eu tinha a sensação de que existiam limites. Acho que me enganei. Em dois dias morreram dois bebés sem que houvesse condições para lhes prestar com dignidade a assistência que em 2008 seria previsível que se prestasse num país da União Europeia. Perto da hora do almoço, vi o ministro da Saúde – uma pessoa absolutamente detestável – a furtar-se a prestar declarações sobre as tropelias das suas decisões no sistema português de saúde. Dizia que era com a ARS, presumo que as administrações regionais de saúde de cada um dos sítios onde morreram os bebés, um na rampa de acesso a um hospital e outro numa ambulância creio que apenas com a mãe e o motorista. António Correia de Campos, o ministro, falava da ARS, e ria-se, como se a morte de dois bebés nestas circunstâncias (fosse em que circunstâncias fosse) pudesse despertar num ser humano, imagine-se, o riso. Os jornalistas devem ter ficado em parvos. O ministro ria. E depois, do estúdio, meteram o presidente de uma ARS – sem rir – a dizer que agora o que era preciso era fazer uma auditoria.
Pensei nisto esta tarde. Lembro-me de ir no carro e de pensar que não podia ser, que isto não estava a acontecer no meu país. Mas não, infelizmente era verdade. E à noite, num dos noticiários, lá repetiram o ministro, a rir, sempre a rir, discretamente, que talvez pensasse que mais do que isso podia parecer, sei lá, podia parecer demais. Mas depois ainda mostraram outra coisa, que eu não tinha visto antes. Correia de Campos parecia ter um bornal inesgotável para a indecência. Disse a um jornalista algo como isto: «senhor jornalista, se as suas avozinhas… ou antes, se as suas bisavozinhas não tivessem morrido ainda estariam vivas». Depois de dizer «avozinhas» hesitou, deve ter feito contas rapidamente, deve ter pensado qualquer coisa como «espera aí, este tipo, pela idade, ainda deve ter as avós vivas, é melhor dizer bisavós que essas já devem ter mesmo morrido». E então completou a piada de mau gosto metendo «bisavozinhas» em vez de «avozinhas». Depois disto, de tudo isto, talvez seja de acreditar em tudo no que diz respeito ao ministro. Sobretudo que não há mesmo limites para a indecência.
Pensei nisto esta tarde. Lembro-me de ir no carro e de pensar que não podia ser, que isto não estava a acontecer no meu país. Mas não, infelizmente era verdade. E à noite, num dos noticiários, lá repetiram o ministro, a rir, sempre a rir, discretamente, que talvez pensasse que mais do que isso podia parecer, sei lá, podia parecer demais. Mas depois ainda mostraram outra coisa, que eu não tinha visto antes. Correia de Campos parecia ter um bornal inesgotável para a indecência. Disse a um jornalista algo como isto: «senhor jornalista, se as suas avozinhas… ou antes, se as suas bisavozinhas não tivessem morrido ainda estariam vivas». Depois de dizer «avozinhas» hesitou, deve ter feito contas rapidamente, deve ter pensado qualquer coisa como «espera aí, este tipo, pela idade, ainda deve ter as avós vivas, é melhor dizer bisavós que essas já devem ter mesmo morrido». E então completou a piada de mau gosto metendo «bisavozinhas» em vez de «avozinhas». Depois disto, de tudo isto, talvez seja de acreditar em tudo no que diz respeito ao ministro. Sobretudo que não há mesmo limites para a indecência.
1 comentário:
Sr. AMV:
O Sr. disse tudo!
A palavra indecência ainda é curta. O PS não reage, está amordaçado. Espero que essa situação não transborde para o País!
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