José Sá Fernandes
Em busca da cidade transparente
Em busca da cidade transparente
Há muitos anos que José Sá Fernandes se destaca na vida pública lisboeta por denunciar casos de irregularidades, inclusive da própria câmara municipal. Advogado de profissão, depois de chegar a vereador passou a dedicar às múltiplas actividades que o cargo implica cerca de 10 horas por dia, apesar de não ser remunerado. Procura, acima de tudo, a transparência para a gestão da cidade onde nasceu.
O que significa para si ter um trabalho directamente ligado a Lisboa? Sempre se mostrou preocupado com o rumo da cidade, mas agora tem um cargo que lhe traz maior responsabilidade…
Há uma mudança, de facto. Ser vereador, ainda que sem funções executivas – ou seja, não tenho responsabilidade nenhuma nas asneiras que se andam a fazer em Lisboa –, dá-me oportunidade de ter acesso quer a vários dossiers, quer a uma série de sítios da cidade aos quais não tinha acesso enquanto cidadão. Tenho aprendido imenso ao longo deste ano e meio como vereador. Trabalho cerca de 10 horas por dia para Lisboa, sem ser remunerado, e depois vou para o meu escritório.
Referiu que não é remunerado pelo trabalho que desenvolve na câmara. Como é que lida com isso?
À partida já sabia quais eram as condições, portanto não me posso queixar.
Mas na prática como é que lida com a situação? O tempo de que dispõe para se dedicar à advocacia acaba por ser bem menor do que antes…
É muito simples. Das nove da manhã até ao fim da tarde dedico-me à actividade na câmara, e depois vou para o escritório, porque continuo a ser advogado. Antes de ser advogado dedicava já alguns dias a Lisboa, a questões de defesa do património ou ambientais. Com o cargo de vereador foi preciso acrescentar mais umas horas, e cá estou. Porque eu gosto mesmo de fazer isto.
Acha que essa situação é justa. Se desenvolve um trabalho em benefício da cidade, não devia ser pago por isso?
São estas as condições, e como disse eram conhecidas à partida. Portanto, quem assume o cargo de vereador não se pode limitar a ir às reuniões que se realizam três vezes por mês, sempre à quarta-feira.
Tem uma equipa a trabalhar consigo. Essa é remunerada…
Sim. Isso faz parte das condições para se conseguir exercer o cargo de vereador.
Mas não é muito normal, em Portugal, na maioria dos municípios, existirem tais condições. Como é que isso é possível em Lisboa?
O que a lei diz é que se deve dar condições para que uma pessoa possa exercer o cargo de vereador da oposição. Entendeu-se, desde o tempo do Jorge Sampaio, que essas condições passavam por ter um gabinete, alguns assessores – porque as áreas da câmara são variadíssimas, desde as finanças à acção social, passando pelo património, pela educação, pelo desporto ou pelo urbanismo, e é preciso haver apoio. É impossível uma pessoa sozinha estar habilitada para responder a todas as matérias discutidas numa reunião de câmara. Mas, do conhecimento que tenho, é verdade que o município de Lisboa é o que dá melhores condições à oposição.
Como seria o seu papel se não tivesse esse apoio?
Seria mais limitado.
E como é que iria actuar?
Acho que actuava da mesma maneira. Não tinha era tanta capacidade de intervenção. Assim, conheço os dossiers à lupa. Todos. De outra maneira, continuariam a ser analisados à lupa, porque acho que assim é que tem de ser, mas não podia vê-los todos. Tinha que definir prioridades.
Com a imagem que havia da câmara e da sua posição em relação a ela, não foi quase como pôr o lobo a dormir no galinheiro?
Acho que o que se tem provado é que o lobo continua aí.
Mas se não tivesse esta maior facilidade de movimentação os casos que denunciou teriam vindo a público?
No caso do Parque Mayer, denunciei a situação e coloquei uma acção antes de assumir este cargo. Os casos que tenho levantado, o túnel do Marquês, o Terreiro do Paço, que está em obras há 10 anos, o Convento da Graça, etc, todos esses problemas foram levantados há muito tempo.
São os seus primeiros casos…
Sim, o do Terreiro do Paço foi o primeiro. E o do túnel do Marquês foi o último, enquanto cidadão. Depois ainda foi o negócio do Parque Mayer… Foi importante vir para vereador porque senão tinha descoberto para aí metade das coisas que se passavam na EPUL. Não me tinha apercebido, por exemplo, do que considero ser um escândalo, que se passou no Vale de Santo António, que é um dos sítios envolvido em grande polémica em Lisboa.
Acha que faz sentido uma cidade como Lisboa ser gerida pelos órgãos de uma instituição como uma câmara municipal e respectivas empresas que vão aparecendo na sua órbita? Não lhe parece que a cidade anda mais depressa do que este tipo de instituições e que precisa de outras respostas?
Acho que pode funcionar muito bem. O problema é haver vontade de mudar este paradigma.
Então o problema passa sobretudo pela falta de vontade, não é uma questão de capacidade…
Agora agravou-se. Mas há uma prática de gestão autárquica que tem sido péssima. E as empresas municipais têm a ver com isso, porque infelizmente têm servido muito para distribuição de cargos pelos partidos políticos.
Como é que se pode mudar isso?
No caso de algumas empresas municipais, nem sequer há razão de existirem. Em Lisboa existe uma empresa municipal com três administradores e quatro funcionários. E há serviços da câmara que podiam facilmente substituía-la.
Não lhe parece que só se nota alguma apetência para fazer mudanças quando a exposição dos casos torna o óbvio vergonhoso aos olhos do cidadão?
Para quem está no poder é de facto vergonhoso que só nessas circunstâncias é que se pense em mudar, como se só então é que se apercebessem da má gestão. Mas infelizmente é assim. E existem tantas situações que era fácil mudar se houvesse vontade política… Por exemplo, é preciso reestruturar os serviços, interligando-os melhor. Mas praticamente nenhum vereador vai aos serviços da câmara. Não conhecem as pessoas.
Isso é um mal dos vereadores a tempo inteiro, dos da oposição ou de todos?
Nesse aspecto, acho que é igual. E algumas pessoas já estão na vereação há bastante tempo.
Por exemplo, o vereador, e vice-presidente, Carlos Fontão de Carvalho, que tem um percurso na câmara já longo, inclusive sendo eleito em listas de vários partidos?
Sim, esse deve conhecer o departamento de finanças e pouco mais.
De qualquer maneira, estes problemas todos que existem em Lisboa acabam por ser como que uma fatalidade. Sabe-se que serão sempre os grandes partidos a gerir a câmara…
Não é uma fatalidade. A oposição, no passado, não era oposição. Era só no papel. A minha entrada aqui pelo menos obriga as pessoas a responder. Digo-o sem modéstias.
Entrou na câmara como vereador e conseguiu isso. Imagine agora que os lisboetas em peso decidiam votar em si e era eleito presidente. O que é que acontecia à câmara?
Acho que era o melhor que podia acontecer a Lisboa. A primeira coisa que fazia era tornar a câmara completamente transparente. Por exemplo, no caso Bragaparques… Com este escândalo, pedi a lista de todos os negócios que a câmara tem com o Bragaparques e ainda não me deram. Não é normal. Nem devia ser preciso pedir.
Como interpreta que um colega do executivo o insulte e insista em não lhe dar a documentação que pediu?
Não tem, de facto, cultura nenhuma de transparência. Prefere insultar, como se pedir coisas destas não fosse normal. Mas já me insultavam antes de ser vereador, porque já pedia muitas coisas. Mas não peço assim tantas coisas como isso. Por exemplo, o vereador Fontão de Carvalho queixa-se de que eu faço muitos requerimentos. Fiz 19. Ele respondeu-me a cinco. Dá uma média de um por mês os requerimentos que fiz.
Ele vem do mundo da auditoria, que apela precisamente à transparência e ao rigor. À partida julgar-se-ia que era o tipo de pessoa indicada para conviver com esse tipo de exigência…
É engraçado dizer isso porque foram feitas auditorias a todas as empresas municipais. Muito bem. Mas não foram mostradas. Estou há um ano e meio à espera. Nem sequer sei quem foram os auditores.
Então para que são feitas as auditorias? Ainda se gastam uns largos milhares de euros a fazê-las…
Isso é que eu não percebo.
O senhor tem estado ligado à política, mas do lado, digamos assim, de fora. Se passasse para o lado de quem está no poder, não acha que acabava por ter de se adaptar às regras do jogo político?
Eu estou adaptado às regras. Mas há duas maneiras de fazer política. Numa delas faz-se um jogo, e nessas coisas eu não entro. As pessoas pensam muito mais nos interesses partidários do que propriamente nos interesses de Lisboa. Com a situação que estamos a atravessar agora, é óbvio que tem de haver uma mudança. Não se pode arrastar esta agonia, para continuar a jogar com os interesses partidários. Tem de haver uma mudança, no interesse da cidade. Não a pensar se tenho ou não candidato, se este é o momento ideal, para deixá-los fritar mais um bocadinho…
Acha que consegue quantificar, em percentagem, quanto é que perde a cidade por causa de ser palco de disputas políticas?
As disputas políticas são boas se se centrarem em Lisboa. Mas como não é isso que acontece, a cidade perde tudo, porque fica paralisada. Em vez de se estar a discutir e a resolver problemas, está-se a utilizar tácticas que têm como objectivo interesses partidários. A actuação da maioria que está na câmara é exemplo disso. Há uma resistência ao poder, no sentido de as pessoas estarem agarrados a ele. Ao longo deste ano e meio não foram cumpridas promessas praticamente nenhumas. Mas nem é só isso. Durante este tempo, houve uma série de casos que vieram a público que demonstram a falta de transparência que existe, a falta de solução para os problemas e muita irresponsabilidade.
Acha que a população de Lisboa tem noção disso? Ou seja, se houvesse eleições rapidamente, acha que alguma coisa iria mudar?
Acho que sim. Quem está à frente da câmara mudava de certeza e só isso era um alívio.
Mas por uma grande hecatombe que houvesse, muito provavelmente o PS e o PSD voltariam a ter uma percentagem muito significativa dos votos, mais ou menos na linha do costume. Os cidadãos votam sempre no mesmo tipo de pessoas…
Acho que a próxima liderança da câmara já não conseguirá ser tão irresponsável como a actual. Acho que este ano e meio serviu para provar que é mesmo preciso mudar. É preciso mudar os partidos, mas, sobretudo, é preciso mudar a política para a cidade. É preciso pensar em prioridades. Há coisas inadmissíveis. Temos bairros em Lisboa completamente degradados, muitos deles ao lado de urbanizações de luxo. As regras urbanísticas exigem que se compense, em benefício da câmara, ou em terrenos ou dinheiro. Normalmente, as compensações que existem são uma piscina ou um equipamento qualquer desse género. Mas em muitos sítios a compensação devia ser a recuperação de um bairro.
Falávamos dos jogos políticos que podem fazer a cidade perder. O que é pior para a cidade, esses jogos partidários, a incompetência ou todos os grupos e interesses que circulam à volta?
As três coisas. Por exemplo, muitos dos vereadores actualmente no executivo são agentes partidários. O que não quer dizer que sejam competentes nem que sejam incompetentes. Mas há visivelmente grande incompetência de alguns vereadores. Depois, há um modo de olhar para a cidade... Eu falo do vereador Fontão de Carvalho, que até percebe de finanças...
Tem, portanto, competências técnicas…
Exactamente. Não é incompetente. Mas, politicamente, o tipo de prioridades que escolhe é contrário aos interesses da cidade, ainda que, provavelmente, ele julgue que não. Ele prefere arranjar receitas para a câmara, para tecnicamente compensar a economia da câmara, através do urbanismo, do que procurar outro tipo de receitas ou trocas. É um bom técnico, mas não para estar como vereador da câmara, porque para isso não chega ser um bom técnico. É preciso ter responsabilidade política.
Mas já foi escolhido por vários partidos…
Pois é. Eu nunca o escolheria. É um bom técnico para estar no departamento a fazer contas. Mas nada que envolva decisão política. Para se ser um bom gestor o mais importante é saber gerir bem as pessoas e as prioridades, e não tanto o dinheiro.
Já entrevistámos Carmona Rodrigues, como presidente da câmara, e em relação às 10 ou 11 mil pessoas da câmara ele disse que era o capitão de equipa. Que comentário é que isto lhe sugere?
Para se ser um capitão de equipa é preciso três coisas. Uma é conhecer as pessoas. Depois, um bom capitão de equipa nunca engana os seus colegas. E consegue unir a sua equipa. Carmona Rodrigues não faz nenhuma destas três coisas.
Então por que é que acha que ele disse aquilo?
Provavelmente foi capitão de uma equipa de rugby e conseguiu fazer isso, mas aqui na câmara é diferente.
Uma ideia muito associada às câmaras é a de corrupção, principalmente pelas ligações ditas perigosas com a construção civil e o futebol. Como vê essa situação?
Com muita preocupação. É preciso haver um combate sério à corrupção, coisa que não tem havido. A actual maioria da câmara de Lisboa também não tem dado passos nenhuns nesse sentido. Um caso que se passou recentemente é paradigmático. Foi constituído arguido um director municipal. Já apareceram nos jornais escutas desse director, que terá dito ao senhor da Bragaparques que me queria esmifrar o dinheiro todo. Esse homem foi o presidente do júri da hasta pública dos terrenos da Feira Popular. Quem é que a câmara depois mandou à assembleia municipal para discutir o problema do Parque Mayer? Esse mesmo director municipal. Quando sabemos que foi constituída arguida uma vereadora que suspendeu o seu mandato. Acredito em presunção da inocência até prova em contrário, mas logo este senhor a ir falar à assembleia…
Como é que uma situação dessas é possível?
Não há responsabilidade nem vontade política para se resolver os assuntos. Como é que se admite que este senhor continue a exercer funções e vá discutir para a assembleia municipal o problema do Parque Mayer, quando ele é um dos protagonistas da polémica?
Confia na justiça para a resolução deste caso, que parece gravíssimo?
Há muitas pressões políticas sobre o sistema judicial, mas eu ainda acredito na justiça. Portanto, tenho esperança de que este caso da Bragaparques, em relação à corrupção que tentou exercer sobre mim, acabe por se resolver. Não tenho dúvidas de que vai a tribunal.
Dizem agora que puseram o seu irmão em tribunal. Já houve uma espécie de contra-ataque?
Sim, mas um contra-ataque sem base nenhuma. É tão fácil dizermos as coisas… Por isso é que a corrupção é muito difícil de combater, e por isso é que este caso é muito importante. A prova está toda de um lado, não é o que se disse e o que não se disse, está lá a prova e foi validada por um juiz. E foi a Polícia Judiciária que fez as gravações das conversas.
É realmente uma situação fora de comum…
Completamente fora de comum, o que também é estranho. É a primeira denúncia de um vereador autárquico, que diz «este senhor tentou corromper-me». E das duas uma, ou nós acreditamos que foi a primeira vez que isto aconteceu em 30 anos de poder autárquico, ou não. Eu não acredito que tenha sido a primeira vez.
Estes casos não se resolvem mais por falta de vontade, ou será uma espécie de fatalidade?
Tem de haver vontade. E resta saber se muitas das coisas não têm a ver com o financiamento de partidos políticos.
O que é que acontecia à sociedade portuguesa se houvesse uma limpeza geral?
Era muito melhor, era tudo mais transparente.
E depois conseguia arranjar pessoas para todos os lugares? Presidentes, vereadores, directores...
Há tanta gente… A maior parte das pessoas é honesta.
Mas fica a ideia de que as pessoas que realmente são honestas e que têm capacidade para fazer as coisas como deve ser não se querem meter na política, porque já sabem como funciona…
A política tem este problema de as pessoas serem bem ou mal remuneradas. Esse é que é o problema…
Acha que passa por aí?
Passa essencialmente por aí. E depois é um problema de convicções. Há aparelhos partidários que estão de facto muito viciados. E isso tem de acabar. Não estou a falar das pessoas individualmente, mas há aqui um vício… Acho que é fácil combater a corrupção, tem é de haver vontade politica para isso. E a primeira coisa é ser transparente. Não haver dossiers fechados, na gaveta. Tem de haver sempre informação disponível em tempo útil para as pessoas. Há cidades na Alemanha, e noutros países, onde os cidadãos é que decidem onde se põe o caixote do lixo, se é bom ou não é bom para o seu quarteirão ou bairro, se o posto de correios deve ser ali ou acolá.
Como é que consegue vender uma coisa assim em Portugal?
Então não consigo?! Por isso é que eu digo que tem de ser a administração. Ela é que tem de incentivar. A primeira regra para combater a corrupção é a transparência, depois é ter regras muito simples. Nós temos sempre a mania de dizer mal dos construtores civis. Há construtores civis óptimos. Aquilo que os construtores civis querem é que as regras sejam claras, e o problema é que as regras nunca são claras, há sempre uma fuga, há sempre um amigo ali e não sei o quê. Se as regras forem claras, é bom para os construtores civis.
Com essa visão das coisas, não acha que é um pouco uma ave rara na política portuguesa?
Acho que não. Há imensa gente assim.
As pessoas estão a ir embora de Lisboa, é pelo menos o que passa para a comunicação social…
Mas é verdade. Sabem que a previsão é de que saiam mais 10.000 pessoas nos próximos dois anos?
Pois, mas há outra coisa menos falada… As empresas também estão a ir embora. Vão para Oeiras, por exemplo. Isso preocupa-o?
A política urbanística dos sucessivos executivos municipais de Lisboa não tem sido eficaz para inverter a situação. Nós temos em discussão uma proposta relacionada com os fogos devolutos, que são 70.000 e que estão à espera da especulação imobiliária. Se começarem a ser taxados de uma maneira superior àqueles que estão ocupados, podem entrar no mercado. Porque o problema tem a ver com o preço. As pessoas saem de Lisboa porque é mais barato viver em Sacavém, na Amadora ou em Almada.
E as empresas? Acaba por ser o mesmo, mas a outro nível…
Exactamente. Lisboa sempre foi uma cidade cosmopolita onde viveram todos os tipos de classes nos mesmos sítios Talvez o último sítio onde isso se sente seja a Avenida de Roma. Aí vive a burguesia, mas há habitação social ao lado, na Avenida da Igreja. Mas foi o último bairro, feito nos anos 50 do século passado. Desde essa altura, Lisboa tem perdido população, porque não tem havido políticas para ter uma cidade integrada. Fizeram-se os guetos para as pessoas que saíram das barracas… Acabar com as barracas, bem feito; mas o tipo de bairros que se fizeram foi uma coisa péssima socialmente, algo que provavelmente, se não houver uma intervenção da câmara ou até da administração central, levará a graves problemas sociais. Outro exemplo, fiz uma proposta para que em todos os loteamentos fosse obrigatório que uma parte substancial se fizesse a custos controlados. É algo que já acontece em cidades francesas, ou em Nova Iorque. Nova Iorque, nesse aspecto, é uma cidade com muito mais preocupações sociais do que Lisboa.
Alimenta-se do capitalismo…
Mas obriga a que qualquer loteamento tenha uma percentagem feita a custos controlados, exactamente para viverem na mesma zona os pobres, os remediados e os ricos. E é uma cidade pujante. Mas Lisboa não pode imitar nenhuma cidade, pode é aprender com outras cidades em termos da maneira como resolveram alguns problemas sociais e urbanísticos, no sentido de juntar pessoas. Eu não quero nenhuma Nova Iorque em Lisboa, mas quero aproveitar uma lei que é boa, e que aliás Barcelona também tem. Apresentei a proposta na câmara e ficou tudo em alvoroço. Acham bem, mas como fui eu que apresentei...
Nas reuniões de câmara, como é que o tratam?
Enfim, há este lado partidário completamente cretino. Como fui eu que apresentei… Em campanha eleitoral toda a gente disse que o plano verde de Gonçalo Ribeiro Teles era uma maravilha. Mas depois foi chumbado. Disseram que não era o momento oportuno. A política, nesse aspecto, não é serena, nem honesta, nem leal.
Por isso é que lhe falámos em fatalidade.
Mas não é uma fatalidade. Não pode ser. Por exemplo, as pessoas têm a mania de que eu estou sempre contra tudo. Mas eu aprovei a maior parte das propostas feitas na câmara. Por exemplo, as salas de injecção assistida, que é um problema social grave... Rejeitaram duas propostas minhas e depois apresentaram eles uma, eles a maioria. Mas eu não me importei e aprovei-a. Para mim não importa ser o A ou o B a apresentar, o que me interessa é se a proposta é boa ou não. Não aprovo é outras coisas, como os exemplos destes últimos tempos. Isso eu não aprovo, porque são as coisas mais estruturantes em termos de dar cabo disto tudo.
Acha que a oposição fica incomodada pelo facto de o senhor apresentar tantas propostas?
Isso é o lado positivo. Antes a aposição não apresentava propostas. Depois de eu aparecer perceberam que isso também é uma maneira de fazer política. E as minhas propostas, ou melhor, as propostas da minha equipa, são apresentadas de uma maneira profissional, não é mandar umas bocas. Por exemplo, estudámos as bibliotecas de Lisboa à lupa, falando com as pessoas de todas elas. Curiosamente, o vereador da cultura não conhecia praticamente nenhuma biblioteca, o que é estranho. Mas eu até simpatizo com o vereador da cultura, e já lhe disse estas coisas.
Acha que se pudesse dedicar-se à câmara a tempo inteiro, em vez das tais 10 horas diárias antes de ir para o seu escritório, poderia fazer mais por Lisboa? Se chegasse ao poder…
Eu não tenho pretensões de chegar ao poder.
Não falamos do poder pelo poder, mas sim no sentido de ser uma ferramenta para fazer com que as coisas aconteçam?
Eu não vou desistir da ideia de que isto pode mudar, seja no poder, seja fora do poder. Não vou desistir.
Mas se se dedicasse a tempo inteiro…
Sim, quanto mais horas melhor.
José Sá Fernandes (n. Lisboa, 1958), licenciado em Direito e advogado desde 1988, é vereador da oposição na Câmara Municipal de Lisboa (eleito como independente nas listas do Bloco de Esquerda nas eleições de nove de Outubro de 2005). Já antes se destacava pela actividade cívica. Entre as suas intervenções individuais no concelho de Lisboa, encontram-se, por exemplo, o Projecto da Administração do Porto de Lisboa para aquilo que denomina como «a construção da absurda oitava colina», o Projecto Alcântara XXI, o Terreiro do Paço (estacionamento, piso, arcadas e metropolitano), o Teatro D. Maria II, o túnel do Marquês e o Parque Mayer. Mas a sua intervenção não se tem limitado à capital. O Algarve, Almada, a Costa Vicentina, Grândola, Monsaraz, Sesimbra e Setúbal, entre outras zonas, têm suscitado também o seu interesse. Também tem apoiado grupos de moradores, movimentos e associações.
Mas obriga a que qualquer loteamento tenha uma percentagem feita a custos controlados, exactamente para viverem na mesma zona os pobres, os remediados e os ricos. E é uma cidade pujante. Mas Lisboa não pode imitar nenhuma cidade, pode é aprender com outras cidades em termos da maneira como resolveram alguns problemas sociais e urbanísticos, no sentido de juntar pessoas. Eu não quero nenhuma Nova Iorque em Lisboa, mas quero aproveitar uma lei que é boa, e que aliás Barcelona também tem. Apresentei a proposta na câmara e ficou tudo em alvoroço. Acham bem, mas como fui eu que apresentei...
Nas reuniões de câmara, como é que o tratam?
Enfim, há este lado partidário completamente cretino. Como fui eu que apresentei… Em campanha eleitoral toda a gente disse que o plano verde de Gonçalo Ribeiro Teles era uma maravilha. Mas depois foi chumbado. Disseram que não era o momento oportuno. A política, nesse aspecto, não é serena, nem honesta, nem leal.
Por isso é que lhe falámos em fatalidade.
Mas não é uma fatalidade. Não pode ser. Por exemplo, as pessoas têm a mania de que eu estou sempre contra tudo. Mas eu aprovei a maior parte das propostas feitas na câmara. Por exemplo, as salas de injecção assistida, que é um problema social grave... Rejeitaram duas propostas minhas e depois apresentaram eles uma, eles a maioria. Mas eu não me importei e aprovei-a. Para mim não importa ser o A ou o B a apresentar, o que me interessa é se a proposta é boa ou não. Não aprovo é outras coisas, como os exemplos destes últimos tempos. Isso eu não aprovo, porque são as coisas mais estruturantes em termos de dar cabo disto tudo.
Acha que a oposição fica incomodada pelo facto de o senhor apresentar tantas propostas?
Isso é o lado positivo. Antes a aposição não apresentava propostas. Depois de eu aparecer perceberam que isso também é uma maneira de fazer política. E as minhas propostas, ou melhor, as propostas da minha equipa, são apresentadas de uma maneira profissional, não é mandar umas bocas. Por exemplo, estudámos as bibliotecas de Lisboa à lupa, falando com as pessoas de todas elas. Curiosamente, o vereador da cultura não conhecia praticamente nenhuma biblioteca, o que é estranho. Mas eu até simpatizo com o vereador da cultura, e já lhe disse estas coisas.
Acha que se pudesse dedicar-se à câmara a tempo inteiro, em vez das tais 10 horas diárias antes de ir para o seu escritório, poderia fazer mais por Lisboa? Se chegasse ao poder…
Eu não tenho pretensões de chegar ao poder.
Não falamos do poder pelo poder, mas sim no sentido de ser uma ferramenta para fazer com que as coisas aconteçam?
Eu não vou desistir da ideia de que isto pode mudar, seja no poder, seja fora do poder. Não vou desistir.
Mas se se dedicasse a tempo inteiro…
Sim, quanto mais horas melhor.
José Sá Fernandes (n. Lisboa, 1958), licenciado em Direito e advogado desde 1988, é vereador da oposição na Câmara Municipal de Lisboa (eleito como independente nas listas do Bloco de Esquerda nas eleições de nove de Outubro de 2005). Já antes se destacava pela actividade cívica. Entre as suas intervenções individuais no concelho de Lisboa, encontram-se, por exemplo, o Projecto da Administração do Porto de Lisboa para aquilo que denomina como «a construção da absurda oitava colina», o Projecto Alcântara XXI, o Terreiro do Paço (estacionamento, piso, arcadas e metropolitano), o Teatro D. Maria II, o túnel do Marquês e o Parque Mayer. Mas a sua intervenção não se tem limitado à capital. O Algarve, Almada, a Costa Vicentina, Grândola, Monsaraz, Sesimbra e Setúbal, entre outras zonas, têm suscitado também o seu interesse. Também tem apoiado grupos de moradores, movimentos e associações.
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