Exmº Senhor Presidente
Da Comissão de Ética
Da Assembleia da República
Deputado José Correia
Da Comissão de Ética
Da Assembleia da República
Deputado José Correia
Santarém, 16 de Abril de 2007
N/Ref.
Desculpe-me antecipadamente V. Ex.ª vir incomodá-lo com um problema aparentemente sem importância, uma espécie de barba mal feita, e que sendo um problema formal me dirija a V. Exª com tão pouca formalidade.
Imagine um sapato de verniz com uma pequena esfoliação no calcanhar. É esse o problema que venho expôr. O sapato sou eu, e presidente da câmara de Santarém é sapato gasto, endividado e sem grande margem de manobra para lhes reforçar os contrafortes ou deitar-lhes meias solas. O verniz uma deputada vossa, agora ilustre secretária de Estado e que responde pela graça de D. Idália Moniz.
Aliás, deve dizer em nome da arte de fazer política, que a senhora D. Idália foi excelsa vereadora desta autarquia e contribuiu alegremente para a ruína do meu sapato. Vereadora da cultura, diga-se, cargo que ocupou com grande zelo e discrição até ao dia que um chamamento divino lhe revelou a sua vocação para a Reabilitação e foi reabilitar para o governo.
Até aqui nada a apontar. Sei que são poucos os chamados mas raros os escolhidos. D. Idália respondeu ao chamamento e aceitou o apelo divino e eis que aí está para nosso grande conforto a secretariar o Estado com grande determinação e loquacidade.
Feita a apresentação, devo agora pedir o esclarecimento que, por não saber mais a quem me dirigir, submeto a V. Ex.ª.
A nossa respeitável Secretária de Estado vive no concelho de Santarém e bastas vezes intervém aqui de forma pública. Até é deputada municipal, coisa que diga-se de passagem pouco frequenta. Confesso que me dá algum prazer vê-la por cá pois que até gosto da senhora e pessoalmente acho-a gentil e afectuosa.
Mas é raro encontrar a pessoa de quem gosto. Apresenta-se invariavelmente a Secretária de Estado, austero, divina. Bom, eu disse divina e com alguma base de convicção. É que a senhora passa por cima, julgo eu, das leis da República, e impõe de forma categórica a sua presença qual Diana enviada para caçar em nome de Zeus.
Chegados aqui, chegamos ao sapato e ao verniz. A Lei nº 40/2006 de 25 de Agosto, sobre o Protocolo do Estado, garante no seu artº 31 que no seu concelho, o presidente da câmara tem estatuto de ministro para as cerimónias públicas que aqui ocorrem. Mas a senhora no seu furor de secretariar o Estado, sobretudo em juntas de freguesia da sua cor política, teima que não (até já levei um raspanete por ter ousado dizer que era de outra forma), e que não, e porta-se como rainha a quem todos têm de prestar alvíssaras.
Pessoalmente não sou pessoa para me incomodar esta leitura napoleónica do poder. Quer presidir? Presida. Quer aspergir-nos a todos com a sua sabedoria reabilitada? Baixo a minha humilde careca perante o brilho solar que irradia da sua figura.
Mas também percebi que estas entradas de leão com saídas de deusa trazem água no bico. No meu entendimento violam a lei. Uma lei da República publicada durante o augusto governo a que pertence a augusta personagem. E das duas, uma. Ou a senhora Secretária de Estado não conhece a lei e é coisa grave. Ou conhecendo-a, não lhe liga puto, o que não é menos grave. A verdade é que tudo isto, sob a aparência de servir o Estado tem outras consignações. Reorganizar o seu partido desfeito com a última derrota eleitoral, amesquinhar o presidente da Câmara de Santarém, usar um bom sapato de verniz à custa dos sapatos remendões do desgraçado autarca crivado com as dívidas que a augusta personagem ajudou a construir.
Já percebeu V. Exª que esta carta não serve para repor honras espezinhadas porque a pessoa do presidente da Câmara, cuja vida é ser escritor, até se diverte e vai registando para memória futura estas atitudes que Eça de Queirós gostaria de ter conhecido. Mas o presidente da Câmara de Santarém não acha graça a que se violem leis da República, até porque é um dos seus garantes, e também não consegue aplaudir, como a pessoa do presidente aplaude, estas manifestações corriqueiras, narcísicas e petulantes de exercer o poder. Secretariar o Estado, na minha modesta opinião, não passa por este folclore de vaidades onde se esgotam personagens para melhores palcos.
Em Dezembro escrevi à senhora Secretária de Estado explicando-lha a lei que a sua maioria aprovou. Não ligou e acho que fez bem. Como pode senhora tão sobrecarregada com a arte de reabilitar preocupar-se com o afã de um presidente de câmara zeloso por fazer cumprir uma lei da República? Voltou à carga. E assim, aqui estou a pedir esclarecimentos a V. Ex.ª.
1. O Artº 31º da Lei 40/2008 está revogado?
2. O Artº 31º não se aplica a Secretários de Estado que vivem no concelho?
3. O artº 31º é só para fazer de conta?
Esta pergunta é apenas para confirmar porque, quando aqui esteve Sua Excelência o Senhor Presidente da República, percebi que o Protocolo de Estado se cumpre.
4. Existe alguma legislação especial para o caso da Secretária de Estado da Reabilitação?
5. Estou enganado na interpretação da lei?
Ajude-me V. Ex.ª Sei que tenho os sapatos sujos e rotos, sem dinheiro para os mandar consertar e é sempre com alegria que vejo os sapatos de verniz da nossa augusta governante. Mas não sei se devo aceitar que me espezinhe. Se for em nome da República e como ajuda a resolver o défice, eu próprio me oferecerei para servir de passadeira, deixando que os brilhantes saltos se cravem nas minhas costas. Se é um mero exercício de vaidade pessoal, pesporrência política e orgulho narcísico, tenho mais que fazer do que aturar esta procissão de vaidades.
Ajude-me a esclarecer esta dúvida existencial. Se para mim a República é um bem absoluto, também é verdade que reconheço que perante esta enviada dos deuses haja bens terrenos que têm se ser sacrificados e disponho-me já a ser mártir da República para servir o verniz da senhora Secretária de Estado.
Imagine um sapato de verniz com uma pequena esfoliação no calcanhar. É esse o problema que venho expôr. O sapato sou eu, e presidente da câmara de Santarém é sapato gasto, endividado e sem grande margem de manobra para lhes reforçar os contrafortes ou deitar-lhes meias solas. O verniz uma deputada vossa, agora ilustre secretária de Estado e que responde pela graça de D. Idália Moniz.
Aliás, deve dizer em nome da arte de fazer política, que a senhora D. Idália foi excelsa vereadora desta autarquia e contribuiu alegremente para a ruína do meu sapato. Vereadora da cultura, diga-se, cargo que ocupou com grande zelo e discrição até ao dia que um chamamento divino lhe revelou a sua vocação para a Reabilitação e foi reabilitar para o governo.
Até aqui nada a apontar. Sei que são poucos os chamados mas raros os escolhidos. D. Idália respondeu ao chamamento e aceitou o apelo divino e eis que aí está para nosso grande conforto a secretariar o Estado com grande determinação e loquacidade.
Feita a apresentação, devo agora pedir o esclarecimento que, por não saber mais a quem me dirigir, submeto a V. Ex.ª.
A nossa respeitável Secretária de Estado vive no concelho de Santarém e bastas vezes intervém aqui de forma pública. Até é deputada municipal, coisa que diga-se de passagem pouco frequenta. Confesso que me dá algum prazer vê-la por cá pois que até gosto da senhora e pessoalmente acho-a gentil e afectuosa.
Mas é raro encontrar a pessoa de quem gosto. Apresenta-se invariavelmente a Secretária de Estado, austero, divina. Bom, eu disse divina e com alguma base de convicção. É que a senhora passa por cima, julgo eu, das leis da República, e impõe de forma categórica a sua presença qual Diana enviada para caçar em nome de Zeus.
Chegados aqui, chegamos ao sapato e ao verniz. A Lei nº 40/2006 de 25 de Agosto, sobre o Protocolo do Estado, garante no seu artº 31 que no seu concelho, o presidente da câmara tem estatuto de ministro para as cerimónias públicas que aqui ocorrem. Mas a senhora no seu furor de secretariar o Estado, sobretudo em juntas de freguesia da sua cor política, teima que não (até já levei um raspanete por ter ousado dizer que era de outra forma), e que não, e porta-se como rainha a quem todos têm de prestar alvíssaras.
Pessoalmente não sou pessoa para me incomodar esta leitura napoleónica do poder. Quer presidir? Presida. Quer aspergir-nos a todos com a sua sabedoria reabilitada? Baixo a minha humilde careca perante o brilho solar que irradia da sua figura.
Mas também percebi que estas entradas de leão com saídas de deusa trazem água no bico. No meu entendimento violam a lei. Uma lei da República publicada durante o augusto governo a que pertence a augusta personagem. E das duas, uma. Ou a senhora Secretária de Estado não conhece a lei e é coisa grave. Ou conhecendo-a, não lhe liga puto, o que não é menos grave. A verdade é que tudo isto, sob a aparência de servir o Estado tem outras consignações. Reorganizar o seu partido desfeito com a última derrota eleitoral, amesquinhar o presidente da Câmara de Santarém, usar um bom sapato de verniz à custa dos sapatos remendões do desgraçado autarca crivado com as dívidas que a augusta personagem ajudou a construir.
Já percebeu V. Exª que esta carta não serve para repor honras espezinhadas porque a pessoa do presidente da Câmara, cuja vida é ser escritor, até se diverte e vai registando para memória futura estas atitudes que Eça de Queirós gostaria de ter conhecido. Mas o presidente da Câmara de Santarém não acha graça a que se violem leis da República, até porque é um dos seus garantes, e também não consegue aplaudir, como a pessoa do presidente aplaude, estas manifestações corriqueiras, narcísicas e petulantes de exercer o poder. Secretariar o Estado, na minha modesta opinião, não passa por este folclore de vaidades onde se esgotam personagens para melhores palcos.
Em Dezembro escrevi à senhora Secretária de Estado explicando-lha a lei que a sua maioria aprovou. Não ligou e acho que fez bem. Como pode senhora tão sobrecarregada com a arte de reabilitar preocupar-se com o afã de um presidente de câmara zeloso por fazer cumprir uma lei da República? Voltou à carga. E assim, aqui estou a pedir esclarecimentos a V. Ex.ª.
1. O Artº 31º da Lei 40/2008 está revogado?
2. O Artº 31º não se aplica a Secretários de Estado que vivem no concelho?
3. O artº 31º é só para fazer de conta?
Esta pergunta é apenas para confirmar porque, quando aqui esteve Sua Excelência o Senhor Presidente da República, percebi que o Protocolo de Estado se cumpre.
4. Existe alguma legislação especial para o caso da Secretária de Estado da Reabilitação?
5. Estou enganado na interpretação da lei?
Ajude-me V. Ex.ª Sei que tenho os sapatos sujos e rotos, sem dinheiro para os mandar consertar e é sempre com alegria que vejo os sapatos de verniz da nossa augusta governante. Mas não sei se devo aceitar que me espezinhe. Se for em nome da República e como ajuda a resolver o défice, eu próprio me oferecerei para servir de passadeira, deixando que os brilhantes saltos se cravem nas minhas costas. Se é um mero exercício de vaidade pessoal, pesporrência política e orgulho narcísico, tenho mais que fazer do que aturar esta procissão de vaidades.
Ajude-me a esclarecer esta dúvida existencial. Se para mim a República é um bem absoluto, também é verdade que reconheço que perante esta enviada dos deuses haja bens terrenos que têm se ser sacrificados e disponho-me já a ser mártir da República para servir o verniz da senhora Secretária de Estado.
Creia-me com consideração
(Francisco Moita Flores)
PS: Como este conflito de vãs vaidades é suculento e é revelador de uma moral política extraordinária, informo V. Ex.ª que darei voz pública à carta que vos envio, assim como à carta que em Dezembro enviei à senhora Secretária de Estado.
1 comentário:
Os Vossa Excelência é que me partem todo...
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