O antigo campeão mundial de xadrez Garry Kasparov esteve em Portugal há não muito tempo. Uns meses, três ou quatro. Ouvi-o falar numa conferência para gestores. Estratégia, tomada de decisão, inovação, empreendedorismo, por coisas como estas andou o discurso de Kasparov. A certa altura, surpreendeu-me ao falar de José Saramago; a propósito de inovação. Não o fez pela opção única do Nobel português de escrever com uma pontuação bem peculiar, marcada sobretudo pela frugalidade, que permite uma leitura ao ritmo da própria respiração. Não, foi por algo que também será propício à inovação, à capacidade de inovar: as dificuldades da vida, principalmente aquelas que são experimentadas em criança. Para isso, recorreu a uma frase de Saramago… «As crianças crescem melhor à sombra do que ao sol.» Kasparov não referiu, no entanto, uma sombra absolutamente fantástica do criador de «Memorial do Convento», a de uma figueira junto da qual, nas tardes de Verão, o rapazito Saramago se deitava muitas vezes, para se proteger do calor. A mesma figueira que depois, a cada noite, o voltava a acolher; a ele, Saramago, que embalado pelas histórias do avô via as estrelas por entre os ramos. Como escreve no discurso de Estocolmo… «No meio da paz nocturna, entre os ramos altos da árvore, uma estrela aparecia-me, e depois, lentamente, escondia-se por trás de uma folha, e, olhando eu noutra direcção, tal como um rio correndo em silêncio pelo céu côncavo, surgia a claridade opalescente da Via Láctea…»
1 comentário:
Fiz a cobertura de uma vinda do Kasparov a Portugal, para o jornal O JOGO.
Homem interessantíssimo. Mas que na sua simultânea não deu mesmo hipóteses. Foi tudo à frente. Não houve os chamados "empates de salão".
Não resisti e acabei por lhe cravar um autógrafo, num livro rosa que também tem autógrafos de poetas portugueses e finlandeses.
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